Jatinhos ou helicópteros? Esquenta disputa do transporte aéreo na Faria Lima

Mercado em São Paulo com voos para destinos como o Fazenda Boa Vista ou o aeroporto de Guarulhos ganha novo player com o grupo português Revo em modelo de cobrança por assento

Região da Faria Lima tem cerca de 20 helipontos, segundo a Revo, que usa o topo do edifício Internacional Plaza II, na esquina da Faria Lima com Juscelino Kubistchek, como um de seus hubs
05 de Agosto, 2023 | 05:41 PM

Bloomberg Línea — O mercado de transporte aéreo em São Paulo terá o aumento da competição no segmento de fretamento de helicópteros ou jatinhos para rotas de curta distância, como o aeroporto internacional de Guarulhos e a Fazenda Boa Vista, no interior paulista, reduto do público de alta renda do país.

Nesta semana que passou, a Revo, plataforma do grupo português OHI, começou a operar na capital com voos regulares para esses dois destinos, com dois helicópteros bimotores da Airbus.

O modelo de negócios é conhecido no mercado como “Uber dos helicópteros”, em alusão aos serviços de táxi aéreo que operam de forma similar ao aplicativo de mobilidade urbana terrestre. Outros players já testaram modelo semelhante e há ainda a competição com jatinhos fretados (veja mais abaixo).

Essas empresas permitem que os usuários solicitem viagens também via aplicativo e operam em um modelo de compartilhamento de custos, o que significa que os usuários podem compartilhar um voo com outras pessoas para reduzir o valor individual que precisam pagar.

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Dois helipontos serão usados na operação da Revo: o do edifício International Plaza II, na esquina das avenidas Juscelino Kubitschek com Faria Lima, na Vila Olímpia, e o do complexo Cidade Jardim Corporate Center.

O grupo OHI atua no Brasil no mercado de transporte aéreo offshore por meio da Omni Táxi Aéreo, que presta serviços para companhias como a Petrobras (PETR3, PETR4).

A decisão de lançar a plataforma digital de mobilidade urbana Revo veio após estudos para diversificar os negócios no país, disse o CEO da Revo, João Welsh.

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Concorrência

A chegada da novata Revo vai enfrentar concorrentes já estabelecidos no mercado. Um exemplo é a Flapper, cujo CEO Paul Malicki disse que o modelo de negócio da plataforma portuguesa é “questionável”.

“Por que usar helicópteros biturbinados como EC 155 e EC 135, que são excepcionalmente caros e barulhentos? Mobilidade urbana aérea, para ser acessível, precisa ser baseada no helicóptero monomotor, como AS 350 ou Jet Ranger, como outros players fazem ou fizeram no passado. Foi o caso da Blade e da Voom”, disse Malicki à Bloomberg Línea.

O CEO da Revo, por sua vez, afirmou que os helicópteros inicialmente usados em seu lançamento fazem parte da frota da Omni. O modelo H135 transporta até cinco passageiros; o H155, até oito. Todos os voos contam com dupla tripulação, segundo ele.

“O plano de expansão prevê 12 aeronaves em cinco anos, em princípio da Airbus. Nesse prazo, queremos que a Revo represente entre 20% e 25% da receita do grupo. Em 2022, a OHI faturou 300 milhões de euros”, afirmou Welsh.

Helicóptero da Revo no heliponto da Fazenda Boa Vista, localizado no município de Porto Seguro, no interior paulistadfd

Essa estimativa não considera a previsão de recebimento de eVTOLs (electric vertical take-off and landing, aeronave de decolagem e aterrissagem vertical elétrica), em que a Eve, que é controlada pela Embraer (EMBR3), é uma das principais fabricantes.

“Temos um pedido não firme de eVTOLs com a Eve para 50 aeronaves. Nossa expectativa é receber em 2026″, revelou o CEO da Revo, em referência justamente ao ano previsto para o começo das entregas da fabricante brasileira dos chamados “carros voadores”.

A primeira fábrica dos eVTOLs da Eve em território nacional será em Taubaté, no interior paulista. Ainda não há preço de cada unidade, pois o protótipo não foi ainda nem certificado, explicou Welsh.

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“Os eVTOLs são o futuro da mobilidade. Eles tornarão os voos mais verdes, acessíveis e sustentáveis, mas quem vai operar esses veículos? Onde estão os passageiros? Há muito a ser feito ainda em termos da infraestrutura para que os carros voadores se tornem uma realidade em alguns anos”, disse.

Preços por assento: R$ 3.500

A estreia da Revo traz uma nova política comercial: a venda avulsa de assentos individuais nos helicópteros. Em janeiro, a Anac (Agência Nacional de Aviação Civil) aprovou, em caráter definitivo, a comercialização de assentos de forma avulsa, como alternativa ao fretamento (contratação de toda a aeronave).

A venda avulsa dos assentos individuais por empresas de táxi aéreo começou em 2020, como uma necessidade de flexibilização das regras do setor aéreo durante a pandemia da covid-19.

A medida, que possibilitou o transporte de pessoas e cargas especialmente em rotas com menor oferta de voos, acabou por se tornar uma opção permanente com a Resolução 700, de 24 de janeiro deste ano.

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Além de fomentar a aviação regional, a regra ampliou as opções de voos em aeronaves utilizadas em operações não agendadas com até 19 assentos. Com a regulamentação, empresas de táxi aéreo certificadas poderão ofertar bilhetes aéreos para até 15 voos por semana.

“Vamos iniciar a Revo com 40 voos semanais, sendo 30 para Guarulhos, de segunda a sexta, 15 de ida e 15 de volta. Outros 10 serão para a Fazenda Boa Vista, 5 de sexta a sábado, 5 de domingo a segunda˜, disse Welsh.

O executivo da Revo explicou que a plataforma vai usar ferramentas de IA (Inteligência Artificial) para obter respostas sobre os destinos e horários mais demandados pelos usuários para realizar os ajustes da malha aérea, traçando rotas também terrestres.

“As funções básicas - reservar um voo nas rotas específicas e pagar - não precisam nem de análise preditiva nem de machine learning. É um grande exagero. Atualmente não tem nenhuma plataforma no nosso setor que amplamente usa machine learning ou AI porque não precisa”, avaliou Malicki.

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Heliponto na região da Faria Lima, em São Paulodfd

O trajeto de helicóptero entre a Faria Lima e Guarulhos custa R$ 3.500 por assento. No caso das rotas entre São Paulo e a Fazenda Boa Vista, o valor é de R$ 5.000.

“Hoje, para fazer esses mesmos percursos, o passageiro precisa fretar uma aeronave, com custo médio de R$ 20 mil para o aeroporto e R$ 35 mil para a Fazenda Boa Vista, sem o que entendemos que são os diferenciais da Revo, como hosts treinados, lounge premium nos pontos de embarque e desembarque e transporte do cliente porta a porta”, afirmou o CEO da Revo.

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Já o CEO da Flapper forneceu preços menores do que o valor médio citado pela Revo para o trecho entre a Faria Lima e Boa Vista.

“A partir de R$ 13.800, dá para sair da Faria Lima pela Flapper para a Boa Vista no helicóptero Airbus B4. Já o biturbina é a partir de R$ 21.560″, informou Malicki.

Projetos anteriores

O CEO da Flapper também evitou considerar a Revo como uma plataforma pioneira, ao lembrar de outras tentativas - hoje descontinuadas - de players com a proposta de ser o “Uber dos helicópteros”.

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“O que aconteceu com empresas como a Voom, braço da Airbus, que investiu mais de US$ 30 milhões no desenvolvimento desse conceito no Brasil? Houve diversos players tentando competir no setor de mobilidade aérea no Brasil, entre eles Helo (pioneira), FlyEdge, Aerobid, CloudTaxi, VoudeJato e, mais recentemente, FlyAdam. Infelizmente todos fecharam a porta ao longo dos anos”, disse Malicki.

O CEO da Revo disse que a plataforma foi idealizada no fim de 2020, período em que realizou um estudo de mercado para propor um serviço e um modelo de negócio.

O Grupo OHI é dono de 100% da Revo. O OHI, por sua vez, é apoiado pelo seu principal acionista, a Stirling Square Capital Partners, uma empresa de private equity com sede no Reino Unido que atualmente administra um portfólio de mais de 3 bilhões de euros, segundo o CEO da Revo.

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Todos os voos da Revo serão operados pela Omni Táxi Aéreo. Também controlada pelo grupo OHI, a Omni opera no Brasil há cerca de 20 anos e se define como o maior operador de helicópteros na América Latina. Segundo a Revo, a frota do grupo é de 90 helicópteros, que realizam 1.500 voos semanais, e está avaliada em US$ 1 bilhão.

Com sede no Rio de Janeiro, a Omni Táxi Aéreo oferece serviços de transporte de pessoal e de equipamentos de bases em terra para plataformas marítimas e outras instalações, incluindo emergência médica, para clientes como Petrobras, Total, Exxon e Shell.

Mercado de helicópteros

A disputa pela preferência de executivos da Faria Lima na hora de fretar um assento em helicóptero se deve ao tamanho desse mercado. O Brasil conta com uma frota de 2.000 helicópteros, segundo a Avantto, empresa do segmento de compartilhamento de aeronaves executivas, citando dados da Anac em julho.

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Só a capital paulista tem mais de 410 aeronaves, que realizam cerca de 2.200 pousos e decolagens diariamente.

“São Paulo tem a maior frota de helicópteros do mundo, seguido de Nova York, Tóquio, Rio de Janeiro, Londres, Belo Horizonte, Santiago, Cidade do México, Bogotá e Pequim”, estimou a Avantto, que diz ter 450 usuários ativos no portfólio com quatro tipos de aparelho de asa rotativa no pool de compartilhamento.

A Abraphe (Associação Brasileira de Pilotos de Helicópteros) também estimou a liderança da cidade de São Paulo em número de aeronaves no mundo.

Público da Fazenda Boa Vista

Ao escolher a Fazenda Boa Vista como uma das rotas, a Revo justificou que seu foco é o público de alta renda.

Segundo a JHSF (JHSF3), o condomínio de luxo possui um total de 885 propriedades, das quais 600 estão habitadas. A incorporadora não quis fornecer dados sobre a movimentação de helicópteros em seu heliponto.

“Atualmente, a parceria se dá pela integração da Revo na plataforma JHSF ID como um dos prestadores de serviço com condições preferenciais aos membros. Basicamente, os integrantes têm descontos em voos e podem trocar os pontos acumulados por voos da Revo”, informou a Revo à Bloomberg Línea.

Além desse empreendimento em Porto Feliz, a 100 km da capital, a empresa planeja lançar duas novas rotas regulares a partir de São Paulo no último trimestre. Os clientes também podem reservar voos privados realizados sob demanda entre São Paulo e regiões próximas, como campo, praia e cidades vizinhas.

O CEO da Revo disse que a JHSF é uma parceira importante para a captação de clientes pela plataforma. “Eles podem servir assentos de helicóptero para seu grupo fechado de clientes”.

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Sérgio Ripardo

Jornalista brasileiro com mais de 25 anos de experiência, com passagem por sites de alcance nacional como Folha e R7, cobrindo indicadores econômicos, mercado financeiro e companhias abertas.