Como o Macallan se tornou um uísque tão caro e desejado; e os planos para o Brasil

Estratégia da marca escocesa aposta em experiências imersivas e no storytelling para engajar consumidores brasileiros, explicou Jeremy Speirs, diretor regional da Macallan para as Américas, em entrevista à Bloomberg Línea

O que faz do Macallan um uísque tão caro e desejado; e como ele quer crescer no Brasil
Por Daniel Buarque
19 de Setembro, 2025 | 05:05 AM

Bloomberg Línea — Um dos uísques single malt de maior prestígio no mundo, The Macallan inaugurou em setembro uma loja pop-up em São Paulo, no Shopping JK Iguatemi. É a terceira vez que a marca escocesa trabalha com espaços temporários em uma estratégia de divulgar sua história, seus valores e conquistar um público brasileiro de altíssima renda.

Nas prateleiras, o consumidor menos informado pode ficar confuso. Por que o rótulo mais acessível da marca custa R$ 890, enquanto no supermercado é possível comprar outros uísques escoceses de um único malte de cevada por cerca de R$ 200?

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Na visão da Macallan, a justificativa está no trabalho de storytelling em torno da tradição e da qualidade da bebida, bem como seu perfil exclusivo.

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“O preço se torna quase irrelevante quando o consumidor entende a história, a qualidade e o processo que estão por trás da marca”, afirmou Jeremy Speirs, diretor regional de The Macallan para as Américas, em entrevista à Bloomberg Línea durante a inauguração da loja, que vai funcionar até dezembro.

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É uma questão aspiracional, de identificação com uma marca que simboliza status e prestígio não só da bebida, mas de quem consome. É como se Macallan fosse a versão da Apple no mundo do single malt, como comparou o influencer de uísques Rodrigo Marinho em um review no YouTube: quem compra realmente se importa menos com o preço do que com sua relação com aquela marca.

Para Speirs, a analogia precisa ser usada com cautela, mas há uma proximidade entre os conceitos.

“The Macallan é uma marca aspiracional como a Apple. As duas servem a um propósito: as pessoas querem ter aquela experiência. Para nós, não é apenas um produto mas algo ligado ao artesanato, à qualidade e ao nosso legado”, disse.

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O produto carrega um valor simbólico que o coloca em uma categoria distinta, segundo o executivo. “Queremos que o consumidor veja The Macallan como uma experiência. É muito mais do que apenas um produto”, disse Speirs.

O diretor regional alegou que o custo elevado faz parte da essência da marca e não representa um entrave ao crescimento global.

“Sempre nos posicionamos como o single malt premium, e isso tem nos servido muito bem. Não vamos adotar uma estratégia diferente aqui. Enfrentamos desafios semelhantes em mercados como China e Índia, onde a tributação também é alta, e sempre encontramos uma forma de superá-los.”

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Do blended scotch ao single malt

O rótulo escocês completou dois séculos de história no ano passado e agora busca ampliar sua presença no Brasil, um mercado onde o consumo de uísque ainda é dominado pelos blends, mas que começa a abrir espaço para rótulos premium.

“Historicamente, este sempre foi um mercado de blended scotch, mas sentimos que essa maré está mudando”, disse.

O que faz do Macallan um uísque tão caro e desejado; e como ele quer crescer no Brasil

“Atualmente, o single malt representa menos de 2% do consumo de uísque no Brasil, o que mostra a dimensão da oportunidade. Estamos comprometidos com o longo prazo no país e dobramos a aposta e o investimento aqui”, disse, sem revelar valores.

Parte da estratégia da empresa no Brasil é criar pontos de contato que apresentem a bebida em experiências imersivas.

Além das lojas temporárias em São Paulo, ela mantém presença no aeroporto de Guarulhos, onde se consolida como espaço para divulgação no país.

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“Este é o nosso terceiro pop-up no Brasil. É uma demonstração clara de intenção. Queremos que os consumidores experimentem a marca de perto, entendam nossa história e provem o produto”, explicou Speirs.

Para ele, a degustação é uma porta de entrada decisiva.

“Sempre dizemos: abra a garrafa. Queremos que os consumidores provem o nosso produto. Não é uma bebida para ficar guardada em um armário. É para ser aberta, compartilhada e saboreada com amigos.”

Essa lógica se reflete também na oferta de diferentes linhas e preços, que permitem ao consumidor brasileiro acessar a marca em ocasiões variadas.

“Temos produtos para diferentes momentos, desde edições exclusivas até rótulos para ocasiões especiais. O importante é dar ao consumidor a oportunidade de experimentar ao menos uma vez”, disse Speirs.

Se a garrafa do Macallan de 12 anos parece cara por R$ 890, na loja recém-aberta em São Paulo também é possível encontrar a versão de 18 anos por R$ 3.500, o de 25 anos por R$ 20.500, o de 30 anos por R$ 37.500, e mesmo uma edição especial M por R$ 69.000.

Parece muito, mas um executivo da empresa disse à Bloomberg Línea que as alocações dos mais caros que chegam ao Brasil se esgotam em poucos dias.

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A expansão no Brasil faz parte de uma estratégia mais ampla de crescimento em mercados em que a categoria ainda tem espaço para se consolidar.

Speirs disse que a América do Sul, com foco no Brasil, é um dos pilares desse plano. “Há muito espaço para crescer aqui. Nossa meta é ser líder do mercado, mas não em volume. O que buscamos é escala, valor e, sobretudo, engajamento com o consumidor brasileiro.”

Exclusividade

O que sustenta o caráter exclusivo da Macallan, segundo Speirs, é o processo de produção que descreveu como meticuloso, que vai muito além do que parece em um simples número indicativo da idade no rótulo.

“Um Macallan de 12 anos é, na verdade, resultado de 118 anos de trabalho. Primeiro, é preciso esperar cerca de 100 anos pelo crescimento da árvore de carvalho. Depois, há seis anos de secagem da madeira, dois anos de tempero com vinho jerez e, só então, a maturação do uísque. Esse processo de longo prazo é a essência da marca.”

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A parceria com produtores de jerez, na Espanha, para garantir barris especiais para maturação do uísque, é um diferencial estratégico, segundo ele.

A Macallan investiu em fornecedores locais para garantir exclusividade no fornecimento dos barris de carvalho temperados com o vinho fortificado espanhol, peça central no perfil de sabor do rótulo.

“Acreditamos que esse processo nos diferencia. Muitos produtores fazem apenas o ‘acabamento’ em barris de jerez. Nós usamos o envelhecimento completo. É uma das razões pelas quais a marca tem esse perfil tão característico.”

Speirs reconheceu que o método é custoso e pouco racional sob a ótica financeira, mas defendeu que é essencial para a construção da marca.

“Fazemos coisas que, do ponto de vista de um contador, não fazem sentido. Mas é isso que torna The Macallan o que ela é. Guardamos barris que só estarão prontos em décadas, talvez quando eu já não estiver mais na empresa. Nosso papel é garantir que a próxima geração receba a marca em um estado ainda melhor.”

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Daniel Buarque
Daniel Buarque