BC terá espaço para reduzir ‘excesso’ da taxa de juros, diz Caio Megale, da XP

Em entrevista à Bloomberg Línea, economista-chefe avalia que o aumento da Selic ajudou a ‘controlar o incêndio’ da inflação, o que abre caminho para cortes a partir de janeiro, com previsão de que a taxa Selic chegue a 12% ao ano ao fim de 2026

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Bloomberg Línea — A alta de juros no último ano ajudou a “controlar o incêndio” provocado pelo aumento da inflação no Brasil, e isso agora pode abrir espaço para cortes da Selic a partir do ano que vem, na visão de Caio Megale, economista-chefe da XP.

Em entrevista à Bloomberg Línea, Megale disse avaliar que o excesso de estímulos na economia que impulsionou os preços foi revertido e que o “grau de urgência” sobre a inflação hoje é menor do que era no início do ano.

“O país inverteu aquela tendência. É como se fosse um incêndio que estava se alastrando. Ele parou de se alastrar e retrocedeu um pouco”, afirmou o economista em entrevista no escritório da XP em São Paulo.

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O aumento dos preços e das expectativas de inflação no ano passado fizeram o Banco Central elevar a taxa básica de juros a 15% ao ano, o maior patamar em duas décadas.

Mas dados recentes têm mostrado um arrefecimento da atividade econômica, o que tem se refletido em uma desaceleração da inflação no país.

Para Megale, o aumento da Selic a 15% ao ano foi necessário para combater uma subida de preços considerada preocupante. Agora, à medida que a queda da inflação se consolida, o Copom (Comitê de Política Monetária) tem condições de iniciar um ciclo de corte de juros.

O economista prevê que o Banco Central deve começar a reduzir a Selic em janeiro de 2026, em um ciclo total de 300 pontos-base (3 pontos percentuais) de cortes, levando a taxa básica de juros a 12% ao final de 2026.

Essa seria uma forma de o Copom tirar aquilo que Megale classifica como “excesso” do aperto monetário, que foi necessário para combater uma situação de urgência da inflação.

“Vamos dizer que a inflação está rodando em 5%, para arredondar. Hoje nós estamos com uma taxa de juros reais de 10%. Dá para trazer essa taxa de 10% para 7% ou 7,5% de juros reais. Ou seja, reduzindo a Selic de 15% para 12%”, afirmou.

“Saímos da UTI. Talvez o país não precise mais da mesma dose de remédio”, completou.

Meta de 3% ainda fora do radar

Uma dúvida no mercado, entretanto, é sobre se o enfraquecimento da alta dos preços será suficiente para levar a inflação para o centro da meta do Banco Central, de 3% ao ano, com tolerância de 1,5 ponto percentual. Na avaliação do economista da XP, a resposta mais provável é não.

Isso ocorre porque a atividade econômica tende a seguir em expansão ao longo do ano que vem, dado que é esperado que o governo federal adote medidas de estímulo econômico antes das eleições presidenciais de 2026 - embora ainda seja difícil de prever quais seriam elas e os seus efeitos sobre a economia.

“Quando eu faço a nossa projeção do PIB, a economia dá uma enfraquecida agora, mas cresce em média 0,5% ao trimestre até o fim do ano que vem, que é o mais ou menos o crescimento potencial”, disse Megale, que foi secretário de Desenvolvimento da Indústria e Comércio e diretor de programas no Ministério da Economia entre 2019 e 2020.

“Ou seja, você não está realmente gerando ociosidade na economia para desinflá-la. Nós acreditamos que a inflação, que tinha subido para 6%, voltou agora para o patamar de 4% e 4,5% - e ficará assim daqui em diante.”

A perspectiva de a inflação continuar próxima do teto da meta do Banco Central - de 4,5% - impede uma redução ainda maior da taxa de juros pelo Copom.

Megale avalia que a Selic não vai voltar para o patamar de um dígito tão cedo diante desse quadro, principalmente sem a aprovação de reformas econômicas que promovam ajustes na dinâmica das despesas públicas.

Nesse ambiente, o economista-chefe da XP disse avaliar que o Banco Central deve seguir cauteloso, à medida que a economia consolida a desaceleração sob efeito do aperto monetário.

“O Banco Central vai sentir. Não acho que ele vai forçar. Se chegar em janeiro e sentir que tem risco, que tem questionamento em torno dele, aí ele não faz o corte de juros”, disse o economista.

Megale avalia que a autoridade monetária está em uma situação confortável agora, no sentido de que a inflação está em processo de desaceleração e o desemprego permanece em patamares historicamente baixos.

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Além disso, um possível alívio dos juros nos Estados Unidos pode ajudar o Banco Central a manter a inflação controlada, por meio do câmbio, uma vez que a queda dos juros americanos tende a favorecer a alocação de recursos do exterior em ativos brasileiros e fortalecer o real.

Isso permite que os diretores do Copom não tenham pressa para cortar a taxa de juros tão cedo e possam aguardar a política monetária fazer mais efeito sobre a economia.

“O Banco Central vai cortar mais ou menos como aconteceu no ciclo do Ilan [Ilan Goldfajn, ex-presidente do BC entre 2016 e 2019], em que todo mundo pediu para ele cortar - incluindo governo, empresas, mercado e acadêmicos”, disse Megale.

“Quando ninguém mais concordar com ele [Banco Central] e todo mundo achar que tem que cortar, aí ele vai lá e corta. Porque ninguém vai questionar. Vai ter credibilidade. No momento, ele ainda precisa de uma certa confirmação de que a política monetária está dando certo.”

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