Tarifas dos EUA travam avanço de novo polo de suco de laranja no Nordeste

Expansão da citricultura no Nordeste, vista como alternativa à proliferação da doença conhecida como greening no Sudeste, agora enfrenta incertezas com tarifa de 50% dos EUA

Sergipe e Bahia foram responsáveis por cerca de 6% da produção brasileira na safra de 2023/24, de acordo com o (IBGE). (Foto: Eva Marie Uzcategui/ Bloomberg)
Por Beatriz Reis
29 de Julho, 2025 | 11:33 AM

Bloomberg — Depois de décadas lutando contra o greening, os produtores de laranja do Brasil, o maior produtor global, estavam finalmente expandindo a produção em uma nova fronteira cítrica no Nordeste do país. Agora, as tarifas do presidente Donald Trump ameaçam paralisar o setor nascente.

O suco de laranja engarrafado é um item básico das mesas de café da manhã dos americanos, mas mais de 40% desse suprimento vem do Brasil.

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À medida que a doença do greening se espalhou por mais de 44% dos pomares no tradicional cinturão cítrico do Sudeste, os produtores do nordeste começaram a se expandir para se beneficiar da alta dos preços.

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É o caso de Fernando Franca, um pequeno produtor de Sergipe, que vem expandindo sua fazenda. Ele estava vendendo caminhões de laranjas para produtores de suco do Sudeste pelo dobro do preço normal.

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“Todos os dias chegavam mais caminhões em busca de frutas - as empresas do Sudeste estavam desesperadas, tudo por causa do greening”, disse Franca, que cultiva exclusivamente laranjas em 250 hectares acres em Boquim, uma cidade a cerca de 80 quilômetros da capital Aracaju.

(Fonte: Bloomberg)

Agora, as tarifas dos EUA, que entrarão em vigor em 1º de agosto, “atrapalharam as coisas aqui”.

O greening provoca a queda prematura dos frutos. Uma vez infectada, a maioria das laranjeiras morre em poucos anos. Os cientistas ainda não encontraram uma cura para a doença, que também dizimou a produção na Flórida.

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A produção no principal estado produtor dos EUA deve cair para o nível mais baixo desde 1930, depois que um furacão no outono passado acelerou uma queda no setor desencadeada pelo greening, de acordo com o Departamento de Agricultura dos EUA.

Leia também: Exportadores de frutas do Vale do São Francisco temem ‘colapso’ com tarifa dos EUA

Aumento dos preços

O declínio na produção global fez com que os preços subissem nos últimos cinco anos, a mais longa sequência de vitórias em dados que remontam a 1975. Os futuros negociados em Nova York atingiram o recorde de US$ 5,4315 por libra-peso em dezembro.

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Isso criou um incentivo para que os produtores se expandissem em novas áreas livres de greening. Os contratos futuros fecharam a US$ 3,2545 por libra-peso na segunda-feira, mas ainda estão quase 40% acima da média de cinco anos.

(Fonte: Ice Futures via Bloomberg)

No Brasil, o Nordeste foi o lugar perfeito. Uma mistura de temperaturas altas e constantes nos estados ensolarados da Bahia e de Sergipe atua como uma defesa natural contra o greening.

O inseto que é o vetor da doença tem dificuldade para sobreviver em ambientes onde as temperaturas excedem consistentemente os 32°C.

E os estados já produziam algumas laranjas, principalmente em pequenas propriedades familiares.

Eles foram responsáveis por cerca de 6% da produção brasileira na safra de 2023/24, de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Franca, o produtor de Sergipe, lembra-se de uma corrida de processadores de suco de laranja no Sudeste, que enviaram caminhões que viajaram cerca de 2.000 quilômetros para comprar suas laranjas.

“Vendi tudo pelo dobro”, disse. “Quatro mil toneladas de laranjas me renderam 8 milhões de reais (US$ 1,4 milhão).”

Expansão da produção

Prevendo que os preços podem subir ainda mais, Cleber Bacamal, um produtor de laranja com várias fazendas em Sergipe e na Bahia, já está em expansão.

Ele espera que a tonelada da fruta chegue a R$ 3.500 a tonelada, acima dos já elevados preços de R$ 2.200 do ano passado.

“Já estou expandindo, comprando as fazendas vizinhas”, disse Bacamal. “Hoje tenho 120.000 pés de laranja plantados, e a meta é dobrar esse número.”

Os produtores estão adquirindo fazendas vizinhas e aumentam seus investimentos em áreas de cultivo.

Novas mudas levam cerca de dois anos para começar a produzir, portanto, ainda levará algum tempo até que qualquer aumento na produção possa ser refletido nas estatísticas.

Ameaça de tarifas

Por enquanto, a produção é tão pequena que o governo brasileiro nem sequer a acompanha regularmente.

Os últimos números publicados mostraram que ambos os estados produziram cerca de um milhão de toneladas na temporada 2023-2024, em comparação com 14,8 milhões de toneladas no Sudeste, de acordo com o IBGE.

Mas, à medida que a imposição de 50% de Trump se aproxima, as perspectivas de expansão no Nordeste ficam mais nebulosas. Se forem aplicadas no mês que vem, as tarifas provavelmente interromperão o comércio global e os embarques do Brasil.

Os caminhões que até recentemente inundavam as rodovias, recolhendo frutas para serem processadas pelo setor, agora “recuaram”, acrescentou Franca.

-- Com a colaboração de Dayanne Sousa, Meg Lopes, Giovanna Serafim, Ilena Peng e Gerson Freitas Jr.

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