Bloomberg — Poucos dias antes do início da temporada de exportação de soja dos EUA, o maior importador do mundo parece não ter comprado uma única carga americana para o próximo ano.
O impasse entre a China e os EUA - há muito tempo seu segundo maior fornecedor - ocorre no momento em que os dois governos negociam o fim das hostilidades comerciais que têm prejudicado o comércio entre os países desde que Donald Trump voltou à presidência americana.
Enquanto isso, o Brasil ganha protagonismo como possível alternativa de empresas chinesas que têm alta demanda pela commodity.
Os agricultores norte-americanos afirmaram que o impasse os leva a um precipício financeiro, mas dados do governo dos EUA sugerem que os compradores chineses estão se mantendo firmes.
A China impôs tarifas retaliatórias sobre a soja dos EUA em março, tornando as cargas menos competitivas. A colheita dos EUA normalmente começa em setembro, o que marca a mudança de uma temporada de exportação para a outra.
As usinas chinesas que trituram a oleaginosa para a produção de ração animal geralmente fazem reservas antecipadas para aproveitar os preços mais baratos e garantir que suas necessidades sejam atendidas nas primeiras semanas ou meses do ano-safra.
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Desta vez, o obstáculo parece ser a negociação comercial, que foi prorrogada até 10 de novembro, e Pequim não está disposta a abrir mão de uma moeda de troca.
Embora as compras chinesas de commodities sejam apenas um aspecto das discussões, durante o primeiro governo Trump, a soja, em particular, foi vista como uma forma de ajudar a fechar o que os EUA caracterizaram como um déficit comercial injusto com a China.
O mercado é altamente sazonal, com os suprimentos americanos dominando até que a safra do hemisfério sul seja colhida e as remessas do principal fornecedor da China, o Brasil, estejam disponíveis. Isso poderia, em teoria, significar uma escassez até que a próxima onda de grãos brasileiros esteja pronta a partir de fevereiro.
A esperança, é claro, é que o serviço normal seja retomado depois que Washington e Pequim chegarem a um acordo favorável a ambos os grupos de agricultores.
Mas se isso for uma tarefa muito difícil, o consenso entre os traders e analistas é que o Brasil deve ter estoques de safras antigas suficientes para cobrir a lacuna, enquanto a China sempre poderá recorrer às suas enormes reservas para atender às suas necessidades.
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As processadoras chinesas já abocanharam grandes quantidades de soja brasileira nos últimos meses, e mais está a caminho.
As chegadas nos próximos três meses são esperadas em mais de 30 milhões de toneladas, de acordo com a consultoria chinesa de commodities Mysteel. Nesta década, a China importou um total de 90 milhões a 105 milhões de toneladas por ano.
O Brasil tinha cerca de 37 milhões de toneladas - ou aproximadamente 22% de sua safra - da temporada passada ainda para vender até 5 de agosto, de acordo com a consultoria Safras & Mercado.
Outras alavancas
Se a China não aceitar os grãos dos EUA, pode simplesmente comprar do Brasil ou da Argentina, disse um gerente de uma grande usina chinesa, que não quis se identificar por não estar autorizado a falar com a mídia.
Ele disse que sua fábrica tem cargas sul-americanas alinhadas até novembro.
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Ainda assim, evitar os EUA não é isento de riscos.
“O Brasil pode suprir a maior parte de suas necessidades, mas a sazonalidade torna perigoso depender apenas da América do Sul”, disse Kang Wei Cheang, corretor agrícola do StoneX, em Singapura. “É por isso que, mesmo com a política em jogo, a China geralmente volta aos grãos dos EUA quando a janela do Brasil se fecha.”
E as empresas chinesas quase certamente terão que pagar preços mais altos. Os grãos brasileiros subiram quase 20% desde o início do ano e estão sendo negociados com um prêmio considerável em relação à concorrência americana.
As outras alavancas da China são diversificar ainda mais os suprimentos ou reduzir a demanda direta. Para isso, estão sendo testados carregamentos de farelo de soja da Argentina, enquanto Pequim continua a pressionar por menos farelo de soja nas receitas de rações para gado, bem como pela restrição do tamanho de seu vasto rebanho suíno.
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