Bloomberg Línea — Com mais de 80 anos de atuação em melhoramento genético de hortaliças, a empresa holandesa Enza Zaden tem ampliado sua presença para além da Europa e dos Estados Unidos, onde estão os seus principais mercados, e aposta no Brasil como um local propício para o desenvolvimento de variedades tropicais.
No ano passado, a empresa, que tem capital fechado, faturou cerca de € 500 milhões e reinvestiu 30% da receita em pesquisa e desenvolvimento, o equivalente a aproximadamente € 150 milhões anuais.
Nos últimos cinco anos, parte desse montante foi destinada ao Brasil, que representa metade do mercado sul-americano de sementes de hortaliças para a companhia.
Globalmente, o Brasil responde por menos de 5% da receita, mas é considerado mercado estratégico pela semelhança de características com outras regiões tropicais, como a África Subsaariana e a Oceania.
“No Brasil é possível obter resultados que são facilmente aplicáveis a outras regiões na mesma latitude dos trópicos”, disse Jean François, general manager da empresa na América do Sul, em entrevista à Bloomberg Línea.
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O maior investimento em pesquisa e desenvolvimento da empresa ocorre em um momento em que o agro como um todo busca justamente aumentar a produção.
É um objetivo que enfrenta desafios: isso porque, com as mudanças climáticas, as janelas de cultivos têm mudado de região a região.
No caso da Enza Zaden, essa alteração do clima do mundo, sobretudo em regiões tropicais, exige sementes “mais fortes”, capazes de se adaptar a diferentes cenários.
Para acompanhar as mudanças do setor e do mundo, a empresa lança cerca de 150 novas variedades de vegetais anualmente e vende cerca de 800 toneladas de sementes.
Segundo François, a empresa tenta entregar cada vez mais produtos para que o agricultor consiga ter um painel de opções.
Trata-se de “um leque de portfólio de produtos que, a depender da janela do ano, vai permitir que ele consiga produzir e manter o fluxo de contratos que tem”.
Não se trata de simplesmente desenvolver novas alfaces “mas aquelas que cada vez mais sejam adequadas a diferentes janelas de plantio”, disse.
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A subsidiária brasileira opera em sede própria em Holambra, no interior paulista, e trabalha com diferentes tecnologias e equipamentos para desenvolver seus produtos, com estufas, laboratórios e uma equipe de quase 30 profissionais.
No ano passado, a empresa também inaugurou uma subsidiária no Chile.
Hoje, a maior parte do faturamento global ainda vem da Europa, da América do Norte e do norte da África, mas a Ásia também desponta no radar da empresa como uma próxima fronteira de crescimento.
Desenvolvimento em Holambra
No mercado local, a companhia detém 65% do market share em cebolas híbridas, além de ter forte presença em alfaces americanas destinadas ao processamento industrial e em alfaces crespas para cultivo hidropônico.
Recentemente, incorporou um programa de melhoramento de cenouras, justamente para ampliar o portfólio.
A empresa também atua com melão, desenvolvido no Nordeste exclusivamente para exportação, além de melancia, abóbora, abobrinha e pimentões coloridos voltados ao cultivo protegido.
O modelo de negócios da empresa se apoia em parcerias com distribuidores e revendas regionais, responsáveis por garantir capilaridade comercial. A produção de sementes acontece de maneira terceirizada fora do Brasil.
Após o beneficiamento e o controle de qualidade na matriz na Holanda, o material é enviado ao país para distribuição.
Segundo a Enza Zaden, essa estrutura busca assegurar a rastreabilidade, a padronização e a conformidade sanitária internacional.
Embora a participação no faturamento global ainda seja relativamente pequena, a operação brasileira tem potencial de crescer de 10% a 15% ao ano, impulsionada pela tecnificação dos produtores e pelo aumento da exigência dos consumidores, segundo o executivo.
Em segmentos mais dinâmicos, como o de tomates híbridos, a expansão pode chegar a 30% já em 2025.
O desenvolvimento vislumbrado pela companhia, no entanto, tem foco no longo prazo: um híbrido de tomate leva de cinco a sete anos para chegar ao mercado, enquanto uma cebola pode demandar até 15 anos de pesquisa e validação em campo.
Esse horizonte se cruza, novamente, com o desafio das mudanças climáticas, que afetam a adaptabilidade futura das sementes.
“Desenvolvemos hoje um produto que só chegará ao mercado daqui a dez anos, e nesse período o clima pode ter mudado de forma significativa”, disse François.
“A inovação está em oferecer sementes mais rústicas, que demandem menos insumos e mantenham qualidade frente às restrições ambientais.”
Como reflexo dos investimentos locais, a companhia colocou no mercado brasileiro, em 2025, um tomate salada resistente ao Gemini Virus, novas cebolas híbridas para o Nordeste e o Centro-Oeste, alfaces crespas para hidroponia, alfaces americanas voltadas ao mercado de processados e porta-enxertos de tomate desenvolvidos para prolongar a longevidade das plantas e ampliar a produtividade.
Para 2026, está prevista a chegada de um tomate italiano adaptado às condições locais, reforçando o papel do Brasil como campo de prova da estratégia global da empresa.
A Enza Zaden está presente em 26 países, com mais de 45 subsidiárias e 3.000 colaboradores.
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