Como a seca na Tailândia pressiona os preços de açúcar e arroz no mundo

Terceiro maior produtor mundial de açúcar prepara planos de contingência para seca que pode durar anos, e usinas do país já preveem queda na produção

Trabalhador ordena pedras de gelo em cidade na Tailândia, país que sofre com onda de calor e seca (Foto: Andre Malerba/Bloomberg)
Por Napat Kongsawad
03 de Julho, 2023 | 09:03 PM

Bloomberg — A Tailândia tem preparado planos de contingência para lidar com uma possível seca que pode durar anos e reduzir a oferta global de açúcar e arroz. O país é o terceiro maior produtor e o segundo maior exportador de açúcar e tem, portanto, influência na formação dos preços no mercado.

As chuvas em todo o país podem ficar até 10% abaixo da média nesta temporada de monções, e o início do fenômeno climático conhecido como El Niño pode reduzir ainda mais a precipitação nos próximos dois anos, de acordo com funcionários do governo. A Tailândia enfrenta condições de seca generalizada desde o início de 2023, alertaram as autoridades.

A perspectiva levou as autoridades tailandesas a pedir aos agricultores que restringissem o plantio de arroz a uma única safra para economizar água, e os produtores de açúcar veem a produção cair pela primeira vez em três anos.

A notícia pode beneficiar a Raízen (RAIZ4) com o aumento dos preços do açúcar, embora a gigante mundial de açúcar e etanol também sofra risco de ser impactada pelo El Niño se chover acima do esperado nos próximos meses em suas áreas de produção, justamente no período de colheita.

PUBLICIDADE

Por ora, a produção de açúcar no centro-sul do Brasil estava 32% acima na safra 2023-24 versus a passada até a primeira quinzena de junho, segundo dados da Unica, a entidade que reúne as empresas do setor - a ressalva é a base de comparação mais fraca, dado que a safra anterior foi afetada pela seca. O aumento da produção, se confirmado mais à frente, tende também a amenizar a pressão sobre as cotações.

Por ora, os contratos futuros continuavam a ser negociados com preços próximos aos maiores níveis em mais de uma década, a 24 centavos de dólar por libra-peso até o mês passado, muito acima dos cerca de 14 centavos na média histórica dos últimos cinco anos, segundo dados do Itaú BBA.

Uma seca certamente alimentará a inflação no país do Sudeste Asiático, já que o custo de vegetais, alimentos frescos e carne fica mais caro com a redução das colheitas e a ração animal mais cara.

PUBLICIDADE

O primeiro-ministro Prayuth Chan-Ocha pediu à Autoridade de Geração de Eletricidade da concessionária de energia estatal e ao Escritório de Recursos Hídricos Naturais para ajudar a elaborar planos de contingência para economizar água. Até agora, em 2023, as chuvas do país estão 28% abaixo do mesmo período do ano passado, segundo dados oficiais.

Precipitação na Tailândia costuma ser mais baixa em anos de El Niño, o que prejudica a agriculturadfd

O El Niño pode levar a condições mais secas em partes da Ásia e da África e a fortes chuvas na América do Sul, danificando uma ampla gama de culturas em todo o mundo. Em anos anteriores, o El Niño resultou em um impacto marcante na inflação global e atingiu o Produto Interno Bruto em nações do Brasil à Índia e à Austrália.

A Tailândia tenta alimentar uma recuperação no crescimento econômico que já enfrenta ventos contrários de uma desaceleração na China, o maior parceiro comercial do país, e uma seca prolongada pode prejudicar os esforços para manter a inflação sob controle. A Tailândia já enfrentou calor recorde neste ano.

“O El Niño representará uma preocupação maior para o crescimento do que a inflação”, disse Euben Paracuelles, analista da Nomura Holdings. “A Tailândia é um grande exportador de alimentos, com apenas metade da produção total consumida internamente. Portanto, os amortecedores podem ajudar a limitar o impacto da inflação no curto prazo, juntamente com os controles de preços e subsídios do governo.”

Se o El Niño se agravar, pode cortar 0,2 ponto percentual do Produto Interno Bruto do país neste ano, porque as condições de seca podem coincidir com a produção sazonal no segundo semestre, especialmente a de arroz, disse Paracuelles. O banco central prevê que a Tailândia registrará um crescimento do PIB de 3,6% neste ano, o que representaria ainda assim uma aceleração versus os 2,6% em 2022.

A demanda de energia na Tailândia atingiu um recorde em abril, quando algumas regiões registraram altas temperaturas, o que forçou empresas e residências a aumentar o uso de ar-condicionado para escapar do calor sufocante.

O maior impacto global das chuvas abaixo da média na Tailândia afetará culturas como açúcar e borracha e pode até ameaçar a posição do país como o segundo maior fornecedor mundial de arroz. Os embarques caíram um terço, para 7,6 milhões de toneladas, em 2019, o primeiro ano do El Niño anterior.

PUBLICIDADE

A cana-de-açúcar é uma cultura robusta, mas as usinas do país prevêem um declínio na produção. Isso reduzirá a oferta para o mercado mundial e alimentará ainda mais uma alta nos preços do açúcar refinado, que estão oscilando em torno de uma década.

O país produziu cerca de 11 milhões de toneladas de açúcar na temporada 2022-23 e estima-se que tenha exportado cerca de 80% de sua produção.

A falta de esforços de mitigação de longo prazo da Tailândia para lidar com inundações e secas provavelmente agravará o impacto do clima extremo no país, de acordo com o Banco Mundial.

“A frequência de inundações e secas, e o alto custo humano e econômico associado a elas, tornam a adaptação às mudanças climáticas e a gestão da água importantes na Tailândia”, disse Fabrizio Zarcone, gerente nacional do Banco Mundial para a Tailândia.

PUBLICIDADE

“É necessária uma estrutura mais robusta que priorize o planejamento de mitigação de riscos, investindo em infraestrutura de recursos hídricos e gerenciando o uso da terra e da água.”

- Com assistência de Kevin Dharmawan.

- Com informações da Bloomberg Línea.

Veja mais em Bloomberg.com

PUBLICIDADE

Leia também

Como a grande seca chegou décadas antes do esperado e muda a Europa

Como a seca no Canal do Panamá pode dificultar o controle da inflação nos EUA