Bloomberg — Quando Estados Unidos e China encerraram sua guerra comercial anterior, em 2020, os produtores americanos de soja viram suas exportações dispararem para níveis próximos aos recordes. Desta vez, porém, qualquer novo acordo deve render benefícios bem menores.
O presidente Donald Trump e seu homólogo Xi Jinping devem aprovar, ainda nesta semana, durante um encontro presencial na Coreia do Sul, os termos de um acordo preliminar negociado por suas equipes comerciais.
O acerto incluirá compras “substanciais” de soja americana, segundo afirmou no domingo o secretário do Tesouro, Scott Bessent.
Os preços da soja subiram com o otimismo antes da reunião, e os contratos futuros atingiram nesta terça-feira (28) o maior valor em 15 meses.
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Mesmo assim, o acordo dificilmente mudará as transformações de longo prazo no comércio global que reduziram a presença dos produtores americanos na China.
Nos últimos anos, Pequim se tornou muito menos dependente do fornecimento dos Estados Unidos, à medida que o Brasil — maior produtor mundial — ampliou rapidamente sua produção e conquistou uma fatia maior do comércio global.
Ao mesmo tempo, a economia chinesa perdeu fôlego, o que diminui o espaço para um compromisso de compras mais agressivo.
A China não deve precisar importar mais de 10 milhões de toneladas de soja americana no ciclo que termina em agosto, segundo estimativas da StoneX Financial.
Isso representaria o menor volume de compras em uma temporada completa desde 2006, de acordo com dados compilados pela Bloomberg.

Qualquer volume acima desse nível “seria um bônus”, afirmou Arlan Suderman, economista-chefe de commodities da StoneX, em relatório enviado a clientes na segunda-feira.
O maior comprador mundial do grão usado em rações e óleos de cozinha conseguiu evitar completamente as importações da safra atual dos EUA, obtendo a maior parte de seu suprimento na América do Sul.
Caso um acordo seja fechado, os exportadores americanos terão uma janela de apenas dois meses para vender soja à China antes de o Brasil voltar a inundar o mercado com o que deve ser outra safra recorde.
“A China tem hoje muito mais poder de barganha do que no passado”, disse Vinicius Ito, diretor do Marex Group, que calcula em no máximo 8 milhões de toneladas as compras chinesas de soja americana até janeiro. “Não há motivo para a China continuar comprando dos EUA se o fornecimento no Brasil é mais abundante e barato.”
Segundo Ito, o país asiático poderia ainda comprar cerca de 20 milhões de toneladas de soja americana por safra de forma mais regular, desde que o Brasil não sofra uma grande quebra de produção. Mesmo assim, seria bem menos do que as mais de 36 milhões de toneladas exportadas pelos EUA para a China na safra 2020-21 — resultado do acordo da “Fase Um”, que encerrou a primeira guerra tarifária entre os dois países.
Embora esse acordo tenha provocado um salto temporário nas vendas americanas, as tensões comerciais do primeiro mandato de Trump também levaram Pequim a adotar uma estratégia de longo prazo para diversificar suas compras agrícolas e reduzir a dependência dos EUA.
Desde então, a posição americana piorou, diante da concorrência mais acirrada, à medida que produtores brasileiros aproveitaram sua capacidade de expandir rapidamente a área cultivada.
As exportações totais de soja do Brasil devem chegar a 112 milhões de toneladas na safra 2025-26 — quase 60 milhões a mais do que uma década atrás, quando Trump assumiu o cargo —, segundo o Departamento de Agricultura dos EUA. Esse volume seria suficiente para cobrir todas as importações esperadas da China nesta safra.
Enquanto isso, o fornecimento americano praticamente estagnou no mesmo período. Diante da perspectiva de guerra comercial, agricultores dos EUA reduziram em 7% o plantio de soja neste ano.
“A América do Sul, especialmente o Brasil, deve continuar sendo o principal fornecedor da China, o que pode reduzir ainda mais a fatia de mercado dos EUA, mesmo que as tensões comerciais diminuam”, disse Kang Wei Cheang, corretor agrícola da StoneX Group em Cingapura.
“Ao mesmo tempo, o crescimento da demanda interna chinesa tende a se moderar, com o aumento da eficiência das rações e a estabilização do consumo de farelo de soja, o que desacelera o ritmo das importações.”
Além disso, os EUA têm destinado uma fatia crescente da colheita para a produção de biocombustível, usada em caminhões, à medida que empresas como Bunge e Cargill buscam aproveitar os incentivos à fabricação de combustíveis sustentáveis. Isso significa que sobra menos soja para exportação a preços competitivos.
Os EUA tentam diversificar suas exportações para reduzir a dependência da China, firmando acordos com outros mercados, como o Reino Unido. A secretária de Agricultura, Brooke Rollins, anunciou nesta terça-feira que o Japão concordou em comprar US$ 8 bilhões em milho, soja, arroz, etanol e outros produtos.
“Somos muito afortunados por ter uma rede bastante ampla de destinos para a soja americana”, disse Jim Sutter, presidente do Conselho de Exportação de Soja dos EUA. “O que queremos é que não haja barreiras para a entrada da soja americana na China.”
Qualquer acordo com Pequim seria bem-vindo, segundo Eric Larson, gerente-geral da cooperativa James Valley Grain, que atua no armazenamento e manuseio de grãos.
“É soja sendo escoada — o que é bom”, afirmou Larson em entrevista. “Mas acho que isso não vai mudar muita coisa.”
-- Com a colaboração de Ben Westcott e Michael Hirtzer.
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