Bloomberg Línea — De um lado, o produtor recebe insumos como sementes e fertilizantes de empresas fornecedoras e, em troca, entrega parte das sacas de sua safra como pagamento. Essa forma de “troca” está entre as práticas mais tradicionais do agronegócio: o barter.
Apesar da tradição, o modelo traz desafios, como o risco de quebra de safra e, principalmente, a oscilação dos preços das commodities.
Foi atenta a essa “dor” que a agtech Grão Direto propõe um novo modelo de barter, com precificação em tempo real via aplicativo, que promete viabilizar as trocas no setor de maneira mais dinâmica e transparente.
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A digitalização tem permitido a entrada de empresas de fora do agro no mercado. É o caso da Volkswagen, que se “plugou” à plataforma com a possibilidade de trocar veículos em troca de grãos, e da Vibra Energia, que realizou recentemente uma operação com 25.000 litros de diesel negociados da mesma forma.
“Nós resolvemos o desafio de liquidez e o pareamento dos preços em tempo real. Para o produtor, o grão se torna moeda. Para a empresa, o risco é neutralizado”, disse Alexandre Borges, CEO e cofundador da Grão Direto, em entrevista à Bloomberg Línea, em passagem por São Paulo.
Fundada em 2016, a agtech movimentou 8 milhões de toneladas de grãos em 2024 e estima crescer esse volume para 12 milhões neste ano.
Além da solução de um barter reformulado, a empresa tem integrado serviços financeiros à plataforma, como antecipação de recebíveis e até um cartão de crédito com bandeira Mastercard, em que o produtor pode pagar com grãos vinculados a contratos já firmados.
“O produtor vê o valor da compra em reais e em sacas de soja, por exemplo. Isso reforça o senso de pertencimento e melhora a gestão do dia a dia”, disse Borges.
Em março, a agtech captou R$ 90 milhões em uma rodada que marcou a entrada de grandes investidores, alguns dos quais habitualmente de fora do agro, como Kaszek e Bradesco, além de SLC Venture e CME Ventures.
A empresa já havia firmado em 2021 uma parceria com o CME Group, que opera a Bolsa de Chicago, para a precificação de grãos em tempo real.
Metade dos novos recursos será dedicada à expansão das frentes de barter, originação e digitalização de operações. A outra metade será investida em novos produtos e serviços financeiros, segundo Borges.
A empresa também vem apostando em inteligência artificial, disse o executivo. Seu assistente virtual, Airton (batizado em homenagem ao interior mineiro onde nasceu a startup), atua na interlocução com produtores e no matchmaking entre compradores e vendedores.
Embora mantenha o foco estratégico no Brasil, onde já tem uma base sólida, a Grão Direto não descarta internacionalizar a operação.
“Esse problema [da falta de dados confiáveis na comercialização de grãos] é mundial e ainda não está resolvido em nenhum lugar”, disse Borges.
Segundo ele, o produtor brasileiro usa soluções mais técnicas e inovadoras do que o americano e, por isso, o Brasil pode liderar a transformação global nesse setor.
Hoje, a operação da agtech conta com cerca de 170 funcionários, dos quais mais da metade atua em tecnologia e produto.
A empresa não descarta novas aquisições — especialmente de negócios que acelerem seu crescimento ou ofereçam sinergias em dados e serviços financeiros.
“O digital será onipresente na comercialização de grãos nos próximos anos. E nós queremos estar na linha de frente dessa transformação.”
Para monetização, a Grão Direto ganha um percentual em cima de cada operação realizada. Do lado dos produtores, o uso da plataforma é gratuito e eles não pagam para acessar nem para instalar o aplicativo.
A receita vem das empresas, que pagam um fee proporcional ao volume movimentado, além de uma assinatura mensal que varia de acordo com os serviços contratados.
“O mercado de comercialização no agro vai se digitalizar, sim ou sim. E esse movimento deve acontecer entre os próximos três a quatro anos”, disse Borges.
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