Opinión - Bloomberg

Diferença maior de ambição entre homens e mulheres mostra retrocesso em avanços

Novo estudo da McKinsey e da LeanIn.org destaca um momento crítico de estagnação no progresso das mulheres no trabalho, com muitos obstáculos que dificultam ainda mais a ascensão na carreira - e que se refletem em suas ambições

A ascensão de mulheres em empresas nos EUA tem se mostrado mais uma vez cada vez mais desafiadora, em vez de melhorar (Foto: Andre Malerba/Bloomberg)
Tempo de leitura: 5 minutos

Bloomberg Opinion — Um novo estudo que analisa a situação de trabalhadoras de escritórios confirma algo que muitas mulheres têm sentido ultimamente: a carreira corporativa não foi projetada para elas.

A pesquisa, realizada anualmente pela consultoria McKinsey e pela organização sem fins lucrativos LeanIn.org, que defende os direitos das mulheres, descobriu que, embora a ambição das mulheres tenha aumentado no último ano, a diferença entre a ambição das mulheres e dos homens foi a maior em seus 11 anos de história.

Sejamos claros: as mulheres continuam tão motivadas e comprometidas com o trabalho quanto seus colegas homens.

Mas seu desejo de subir na carreira está ficando para trás, com 80% das trabalhadoras afirmando que querem ser promovidas para o próximo nível, em comparação com 86% dos trabalhadores do sexo masculino.

PUBLICIDADE

Leia mais: Menos status, mais propósito: por que mulheres trocam cargo de CEO por vaga na OpenAI

Não podemos culpá-las.

No último ano, o local de trabalho se tornou um lugar mais hostil para as mulheres — não que ele já as tivesse acolhido de forma particularmente calorosa.

PUBLICIDADE

À medida que alguns dos avanços conquistados com muito esforço na última década retrocedem, elas se perguntam por que deveriam aspirar a algo que parece cada vez mais fora de alcance.

Gráfico

As mulheres estão descobrindo que seus empregadores estão menos comprometidos com seu sucesso, justamente no momento em que seu apoio é mais necessário. A pesquisa relata que cerca de metade das empresas afirma que o avanço na carreira das mulheres é uma alta prioridade.

Um total de 20% admitiu que dá pouca ou nenhuma prioridade ao avanço na carreira das mulheres — um número que sobe para cerca de 30% quando questionadas sobre o avanço de mulheres negras.

A pesquisa não apresenta uma comparação histórica direta, mas a tendência em como as empresas estão valorizando o sucesso das mulheres é clara: em 2017, 88% das empresas afirmaram que a diversidade de gênero era uma prioridade; no ano passado, 78% concordaram.

PUBLICIDADE

A reversão é uma traição, que alimenta ainda mais a diferença de ambição. A pesquisa da McKinsey/LeanIn mostra que, quando as mulheres recebem o mesmo apoio e patrocínio de seus gerentes que os homens, a diferença de ambição é eliminada.

“É lógico que você comece a ver a ambição diminuir à medida que as mulheres perdem a fé de que as empresas americanas estão lá para ajudá-las”, me disse Alexis Krivkovich, sócia sênior da McKinsey e coautora do relatório. “Elas sentem isso visceralmente em suas experiências diárias.”

Leia mais: Esta executiva era a única mulher na diretoria da Pandora. Agora assumiu como CEO

PUBLICIDADE

A diferença de ambição é mais acentuada no topo e na base da hierarquia corporativa: a diferença entre as mulheres em nível inicial e seus colegas homens que relatam querer uma promoção é de 11 pontos percentuais, e de oito pontos para mulheres e homens em nível sênior.

Não demora muito para que as mulheres na base da carreira percebam as disparidades no local de trabalho.

Dentro de suas empresas, elas têm menos chances de ter patrocinadores, serem indicadas para promoção ou receberem atribuições desafiadoras.

Elas observam suas empresas eliminarem acordos de trabalho flexíveis, sem se importar com o impacto que isso tem sobre as mulheres trabalhadoras, que mais se beneficiam deles.

Elas absorveram os recentes apelos por mais “energia masculina” e agressividade nas empresas americanas.

Elas ouviram os CEOs dizerem que a política DEI (Diversity, Equity, and Inclusion) foi longe demais, mesmo com a diferença salarial entre homens e mulheres aumentando pelo segundo ano consecutivo.

Mais mulheres em cargos sênior têm experiência em primeira mão com o quanto é difícil subir na carreira. Elas são mais propensas a terem sido preteridas em uma promoção ou a olharem à sua frente e “verem um caminho mais íngreme e um destino menos atraente”, diz a coautora do relatório, Rachel Thomas, cofundadora e diretora executiva da LeanIn.

Elas se sentem desmotivadas pelo percentual maior de CEOs mulheres que deixaram seus empregos neste ano em comparação com seus colegas homens — e por verem a maioria dessas mulheres sendo substituídas por homens.

Elas estão percebendo que a proporção de mulheres recém-eleitas para conselhos está diminuindo e que mais de 40% das startups de IA sediadas na Califórnia não nomeiam nenhuma mulher para seus conselhos.

Elas veem que as mulheres que chegam ao topo são submetidas a padrões mais elevados. As CEOs mulheres são mais propensas a serem alvo de investidores ativistas e seus mandatos são mais curtos do que os de seus colegas homens.

A enxurrada de notícias no último mês não ajudou a mudar a sensação de que ser mulher no mercado de trabalho está ficando mais difícil. Em novembro, o Goldman Sachs promoveu a menor proporção de mulheres a diretoras executivas desde 2018, quando o CEO David Solomon assumiu o cargo.

Leia mais: Sheryl Sandberg vê retrocesso nas políticas de empresas para promover mulheres

Também em novembro, o presidente Donald Trump chamou uma repórter da Bloomberg News de “porquinha” e, no início de dezembro, classificou Kaitlan Collins, da CNN, como “estúpida e desagradável”.

O Financial Times informou que o presidente só concordou em participar do Fórum Econômico Mundial em Davos depois que os organizadores afirmaram que não destacariam temas “politicamente corretos”, incluindo o empoderamento feminino.

E-mails recém-divulgados entre o criminoso sexual condenado Jeffrey Epstein e o ex-presidente da Harvard e secretário do Tesouro dos EUA, Larry Summers, nos deram uma ideia do que alguns membros da elite realmente pensam sobre as mulheres. O New York Times publicou uma manchete perguntando se “as mulheres arruinaram o local de trabalho”.

É implacável e enlouquecedor, e eu gostaria que houvesse uma visão mais positiva para dar a tudo isso. Já escrevi antes que o progresso das mulheres há muito é chamado de “revolução de gênero estagnada” por um motivo, e agora estamos claramente em um desses momentos de estagnação.

O melhor que podemos fazer é reconhecer que os obstáculos ficaram maiores e esperar que, apesar de tudo, as mulheres ainda possam encontrar maneiras de superar pelo menos alguns deles.

Esta coluna reflete as opiniões pessoais do autor e não reflete necessariamente a opinião do conselho editorial ou da Bloomberg LP e de seus proprietários.

Beth Kowitt é colunista da Bloomberg Opinion e cobre o mundo corporativo dos Estados Unidos. Foi redatora e editora sênior da revista Fortune.

Veja mais em Bloomberg.com

Leia também

Irmãs sauditas que comandam ‘império’ de US$ 50 bi são elo entre Wall St e Riad

Guinness inaugura centro temático de US$ 97 mi em Londres de olho na Gen Z

Nvidia firma acordo para uso de tecnologia da startup Groq de olho na liderança em IA