Na BlackRock, ‘exército’ de PhDs na gestão quant com IA entrega resultados recordes

Unidade de investimentos sistemáticos conta com 200 pessoas, atraiu ao menos US$ 40 bilhões em recursos em dois anos e faturou quase US$ 1 bilhão em 2024 com uso crescente de IA, ‘batendo’ com folga gestores tradicionais e benchmarks

Blackrock
Por Silla Brush
13 de Dezembro, 2025 | 06:00 AM

Bloomberg — Ron Kahn pensa sobre inteligência artificial (IA) desde que a última bolha do setor estourou em Wall Street. Era 2007, na fase final da era do subprime. Algoritmos de negociação falharam e um “terremoto quant” sacudiu os mercados, antecipando a crise financeira que viria.

Kahn, físico formado por Princeton e Harvard, concluiu que deveria existir um caminho melhor. Levou cerca de 15 anos, mas ele e seus colegas da BlackRock (BLK) finalmente estão avançando.

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Kahn e os colegas Jeff Shen e Raffaele Savi lideram uma divisão da BlackRock que tem aplicado cada vez mais técnicas de machine learning e IA para analisar mais de 1.100 sinais de mercado e que usa um “robô temático” para decidir quais ações comprar e quais vender a descoberto.

Nos últimos dois anos, a unidade de 200 pessoas, conhecida como investimentos sistemáticos, atraiu ao menos US$ 40 bilhões em novos recursos.

Liderado por Shen e Savi, com Kahn à frente da área de pesquisa, o time agora administra US$ 378 bilhões. O grupo lançou nesta semana um novo ETF focado em ativos alternativos líquidos.

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Enquanto alguns nomes de peso do setor, como Ken Griffin, da Citadel, têm colocado em dúvida o potencial da IA para gerar alfa para gestores de investimentos até agora, o grupo discreto de PhDs aficionados por computação da BlackRock tornou-se um dos mais entusiasmados defensores da tecnologia em Wall Street.

Um motivo central: a área de investimentos sistemáticos da BlackRock faturou quase US$ 1 bilhão em 2024, o maior valor de sua história. Neste ano, deve registrar captação recorde de recursos de clientes.

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BlackRock Systematic Finds AI Is Helping Beat Benchmarks | Group's equity funds have outperformed firm's fundamental stock strategies

Futuro dos investimentos

Kahn, força intelectual por trás da unidade e seu integrante há mais tempo, afirma que o futuro dos investimentos pertence a quem souber combinar gestores experientes com novas tecnologias poderosas.

“Poucas pessoas têm a capacidade de realmente enxergar o futuro”, disse Kahn, referindo-se a investidores focados em fundamentos de mercado ou de empresas.

“Sempre vai existir espaço para profissionais assim”, afirmou. “Só acho que não existem muitos.”

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A capacidade de aproveitar IA e estratégias sistemáticas será essencial daqui em diante.

“Isto se torna cada vez mais poderoso”, disse.

Nos últimos tempos, a fórmula da BlackRock Systematic tem funcionado. Até setembro, os fundos de ações da unidade superaram seus benchmarks internos, no horizonte de cinco anos, em cerca de 94% das vezes. Os gestores tradicionais da BlackRock bateram o mercado em metade desse período.

Um grande entusiasta é o CEO da BlackRock, Larry Fink. Do alto de uma das maiores gestoras de ETFs e fundos indexados do mundo, com cerca de US$ 13,5 trilhões sob gestão, Fink vê a unidade como um modelo de como fundos ativamente geridos por humanos com apoio de IA podem superar o mercado.

Inauguración del Foro Económico Mundial (FEM) 2023

Embora a BlackRock seja uma das maiores gestoras de fundos indexados de baixo custo, sua área sistemática vem sendo promovida pela alta liderança como parte da estratégia de transformar de fato a empresa e cobrar taxas mais altas.

Com esse realinhamento, a BlackRock vem reformulando uma de suas divisões que historicamente dependia mais do trabalho humano. A unidade de ações fundamentalista também vem incorporando mais IA, com sua própria plataforma proprietária de pesquisa, batizada de “Asimov”.

As mudanças também envolveram uma reorganização do grupo para aumentar o uso da tecnologia e da escala da BlackRock a fim de melhorar o desempenho.

Em um memorando enviado aos funcionários em novembro, a BlackRock informou que vários gestores de portfólio da unidade, que administra cerca de US$ 300 bilhões, estão deixando a empresa.

A BSYS, como a equipe sistemática é conhecida internamente, tem raízes antigas. Surgiu em meados da década de 1980 como parte do Wells Fargo e remonta à empresa de modelagem de risco BARRA. Depois tornou-se parte da Barclays Global Investors (BGI), a gestora que Fink comprou em 2009.

Embora a BlackRock tenha sede em Nova York, a BSYS permaneceu baseada em São Francisco, perto do Vale do Silício. Sua influência vem crescendo entre os clientes institucionais de grande porte da BlackRock, bem como nos fundos voltados ao varejo e nos ETFs da casa, segundo executivos da empresa.

“Estamos analisando cada etapa do processo e fazendo uma pergunta muito simples: por que não pensar em IA, IA generativa ou machine learning de forma mais ampla para torná-lo melhor, mais produtivo, mais rápido e mais escalável?”, disse Shen, que tem doutorado em finanças pela Universidade de Nova York.

Shen prevê que a precisão dos modelos de IA avançará em um ritmo “não linear”. O volume de dados e a capacidade computacional para processá-los crescem tão depressa que as decisões tendem a se tornar mais consistentes, precisas e lucrativas.

20 anos de dados financeiros

A BSYS treinou seu modelo de linguagem com 20 anos de dados financeiros. Segundo a BlackRock, o modelo prevê retornos de ações com mais precisão do que o ChatGPT, da OpenAI, de Sam Altman.

O que, naturalmente, é o objetivo. Se todos usam o mesmo chatbot, ninguém tem vantagem competitiva no mercado.

“Mas, se eu puder ajustá-lo, aí sim posso usá-lo de verdade”, disse Shen.

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O sucesso não surgiu de um dia para o outro.

Nos anos 1990, antes de a BlackRock adquirir a BGI, os antecessores da BSYS tinham de lidar com computadores relativamente limitados.

Depois, nos anos 2000, o terremoto quant — provavelmente causado por muitos traders usando algoritmos semelhantes para operações semelhantes — provocou um ajuste doloroso.

Os quants de Wall Street levaram anos para se recuperar. A compra da BGI por Fink, em 2009, transformou a BlackRock em uma gigante dos ETFs.

Naquela época, o grupo quant era quase uma nota de rodapé. Em 2016, a equipe sofreu outro revés ao registrar alguns dos piores retornos de sua história.

“Houve, sem dúvida, muitos percalços pelo caminho”, disse Shen.

125 pessoas com doutorado ou pós

Hoje, o grupo tem 125 pessoas com doutorado ou pós-graduação, incluindo ao menos um ex-cientista de foguetes que trabalhou na Nasa.

O clima é de lounge acadêmico misturado com Wall Street.

Um “robô temático” desenvolvido internamente combina conhecimento humano e perguntas com poder computacional e big data para identificar vencedores e perdedores no mercado.

O sistema mantém um “humano no circuito” para treinar e ajustar os modelos e analisar os 1.100 possíveis sinais de mercado, segundo uma apresentação para investidores.

O fundo Global Equity Market Neutral, com cerca de US$ 7,5 bilhões, e o Global Equity High Income, com US$ 11,5 bilhões, superaram regularmente seus índices compostos na última década, de acordo com dados da Bloomberg.

O grupo administra o tradicional fundo hedge equity-market neutral 32 Capital e lançou em 2022 um de seus maiores motores de receita, a estratégia Systematic Total Alpha.

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Há responsáveis designados para supervisionar propostas de novas ideias de negociação, e o grupo avalia essas ideias antes de usá-las. O horizonte típico de investimento varia de três a quatro meses.

Não chega nem perto da agilidade de traders de alta frequência, cujos computadores operam em frações de segundo, mas também não é exatamente uma estratégia de longo prazo.

A gigante BlackRock não tem a aura mítica de fundos quantitativos como DE Shaw e Two Sigma Investments.

Mas possui sua plataforma de ETFs e uma escala de distribuição robusta, incluindo executivos que tomam grandes decisões de investimento para carteiras-modelo que podem envolver dezenas ou até centenas de bilhões de dólares, seguidas por consultores financeiros e seus clientes nos EUA.

Essas carteiras-modelo vêm incorporando cada vez mais estratégias sistemáticas, o que significa que o grupo tem muito mais recursos sob gestão e que os clientes estão aplicando em fundos influenciados por IA e técnicas de machine learning.

O sinal mais claro disso é o ETF ativo US Equity Factor Rotation, com US$ 30 bilhões, que sobe quase 20% neste ano e supera seu benchmark. Os modelos da empresa passaram a incluir esse ETF — conhecido como DYNF — e isso ajudou a atrair US$ 13 bilhões em novos recursos para o fundo somente em 2025.

Kahn afirma que sistemas tendem a superar gestores humanos em oito ou nove anos a cada dez. Mesmo assim, ele não está pronto para deixar as máquinas assumirem tudo.

“Você quer manter gestores humanos para pensar no que pode dar errado ou em situações em que a máquina simplesmente não tem informação nenhuma”, disse.

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