Bloomberg Opinion — Nunca há um bom momento para um CEO altamente conceituado se demitir, mas a decisão surpreendente de Doug McMillon de se aposentar da Walmart parece particularmente inoportuna.
A maior varejista do mundo anunciou na sexta-feira (14) que McMillon deixaria o cargo em 31 de janeiro; ele será substituído por John Furner, que dirige os negócios do Walmart nos Estados Unidos.
É revigorante ver um CEO se demitir antes de seu prazo de validade, em vez de tentar se agarrar ao poder. E Furner, que já dirige a divisão mais poderosa do Walmart, é uma escolha segura.
Mas a transição ocorre em um momento em que o Walmart enfrenta uma série de desafios: muitos consumidores americanos estão em uma situação financeira precária; as tarifas afetaram o comércio global; o mercado de alimentos está mais competitivo do que nunca e o Walmart deve garantir que não repita seus erros iniciais no e-commerce quando se trata do surgimento das compras com inteligência artificial (IA).
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Sob o comando de McMillon, que se tornou CEO em 2014, o Walmart navegou com sucesso por um período perigoso para o setor de grandes lojas, que enfrentava forte concorrência de varejistas online — particularmente a Amazon.
Para competir, ele fortaleceu o braço de e-commerce do Walmart. Mas, fundamentalmente, ele também percebeu que, para prosperar, a empresa precisava de um negócio de varejo sólido nos Estados Unidos. Ele dobrou a aposta no atendimento aos clientes nas lojas do Walmart, aumentando os salários dos funcionários para ajudar a elevar a experiência.
Isso permitiu conquistar clientes mais abastados quando a inflação disparou em 2022. E ele reconheceu o potencial do Sam’s Club para impedir que a Costco roubasse grande parte da participação de mercado do Walmart.
Funcionário de longa data da empresa, McMillon também entendeu o que não estava funcionando. Ele se desfez de ativos periféricos, como a venda da participação majoritária na Asda, braço britânico do Walmart.
Mais recentemente, ele adicionou o Walmart Plus, um programa de assinatura semelhante ao Amazon Prime e um negócio de mídia de varejo, pelo qual fornecedores e vendedores em seu mercado compram publicidade, aumentando a lucratividade. E ele colocou a IA no centro de sua estratégia para o futuro.
Houve alguns tropeços. Um grande deles foi a montanha de estoque não vendido que se acumulou há três anos. No entanto, o Walmart se recuperou disso mais rapidamente do que sua rival Target, que enfrentou o mesmo problema.
O resultado são vendas e lucros que aumentaram sob a gestão de McMillon, enquanto o preço das ações da empresa quadruplicou. Não é de se admirar que as ações tenham caído 3,6% na sexta-feira.

McMillon, de 59 anos, deixa o Walmart em plena forma — mas isso nem sempre é uma situação confortável para outro executivo assumir.
Furner, de 51 anos, segue muito o modelo de McMillon. Outro funcionário de longa data do Walmart, ele ingressou na empresa como associado por hora em 1993.
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Considerando que os EUA têm sido a base do sucesso do Walmart — e que McMillon provavelmente o escolheu a dedo para o cargo mais alto — espera-se que Furner siga a estratégia de seu antecessor, especialmente no que diz respeito à tecnologia.
Ainda assim, ele terá que manter o bom desempenho e, ao mesmo tempo, deixar sua marca na empresa. Não é uma tarefa fácil, especialmente porque a transição ocorre em um momento particularmente delicado.
Muitos dos principais clientes do Walmart têm sido pressionados pela inflação causada pelas tarifas, bem como pela paralisação do governo. Como precisam pagar mais pelas coisas de que precisam, eles podem optar por comprar menos, especialmente quando se trata de itens discricionários, mas lucrativos, como roupas e artigos para o lar.
Enquanto isso, outras ameaças se aproximam. McMillon conseguiu estabelecer o Walmart como um desafiante da Amazon, mas a batalha ainda não acabou. Em agosto, a gigante anunciou que expandiria massivamente seu negócio de entrega de mantimentos, uma medida que poderia atingir o Walmart onde mais dói.
Depois, há a IA, que está prestes a revolucionar as compras da mesma forma que a internet fez há duas décadas.
McMillon já posicionou o Walmart na próxima corrida do comércio tecnológico, anunciando no mês passado que os consumidores poderiam comprar seus produtos no ChatGPT da OpenAI. É um bom primeiro passo. Para manter o ímpeto, Furner deve evitar ficar para trás, como o Walmart fez nos primórdios do e-commerce.
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Em meio ao avanço tecnológico, há outra ameaça mais popular que o Walmart não pode ignorar: a Aldi, rede alemã de varejo de descontos, está se expandindo pelos Estados Unidos. Ela já tem cerca de 2.500 lojas e pretende chegar a 3.200 até 2028. Furner não pode perder de vista esse concorrente forte, mesmo com os olhos voltados para o horizonte da IA.
Tendo dirigido os negócios nos Estados Unidos, Furner deve ter controle sobre todas essas questões. Mas McMillion, mesmo tendo transformado o Walmart, compreendeu o velho ditado: “varejo é detalhe”. Enquanto o Walmart se prepara para mais uma reinvenção, seu sucessor deve fazer o mesmo.
Esta coluna reflete as opiniões pessoais do autor e não reflete necessariamente a opinião do conselho editorial ou da Bloomberg LP e de seus proprietários.
Andrea Felsted é colunista da Bloomberg Opinion e escreve sobre os setores de varejo e bens de consumo. Anteriormente, escrevia para o Financial Times.
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