Bloomberg Línea — Em março, o mercado de family office ganhou um novo player de peso, resultado de um M&A conduzido pela Turim para a sua recém-criada marca Tori, com foco em famílias com até R$ 100 milhões em patrimônio, em acordo com a Vita Investimentos.
Passados seis meses, a Tori superou a marca de R$ 5 bilhões em ativos sob financial advisory, com atendimento a mais de 200 famílias.
“É um nicho de clientes muito grande. Tem muita família desassistida ou insatisfeita com o modelo com que é atendida”, disse Ricardo Guimarães, CEO da Tori, em entrevista à Bloomberg Línea, a primeira desde o começo da operação.
Assim como a Turim, pioneira no modelo de multifamily office do país, a Tori nasceu low profile, em linha com a discrição que o próprio business recomenda no atendimento a famílias que estão entre as mais ricas do país.
“Temos visto muito interesse de clientes potenciais e em temas como o modelo fee-based [modelo de remuneração de ambas as casas] e em alocação offshore, em que tanto a Turim como a Vita são fortes. O cliente médio da Tori hoje tem entre 35% e 40% do patrimônio fora do país.”
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Segundo ele, a indicação de quem já conhece o trabalho da casa - ou da Turim ou da Vita - tem sido o principal canal de captação de clientes, como costuma acontecer nesse segmento em que confiança é fundamental.
Essa alocação dos clientes, por sua vez, em geral está “espalhada” em diferentes corretoras no Brasil e no exterior, o que dificulta a visão consolidada que permita uma melhor tomada de decisões.
“O banker no Brasil não conversa com o banker do exterior. Às vezes, o investimento está duplicado. O cliente investe daqui em um fundo de ações offshore para ter exposição a certas empresas e lá fora compra as mesmas ações”, contou.
“Mas o orçamento de risco dele é o mesmo. Ele deveria ter condições de poder escolher se prefere operar daqui ou de fora”, disse Guimarães.
Para a Tori, trata-se de uma oportunidade diante do que o executivo apontou como uma das fortalezas da casa, herdadas da Vita (veja mais abaixo).
“Costumamos dizer que a Tori é o melhor da Vita, com toda a parte de tecnologia; e o melhor da Turim, no que diz respeito à assessoria e a investimentos.”

Segundo ele, existe uma diretriz de investimentos que é compartilhada tanto pela Turim como pela Tori, com os mesmos produtos aprovados - 100% de terceiros, justamente para evitar potenciais conflitos de interesse.
“Esses são valores muito alinhados nas duas casas [Turim e Vita] que pesaram nas negociações. A palavra independência está sempre presente nas conversas com clientes. Temos transparência sobre como somos remunerados e mostramos todos os fees e tudo o que o cliente recebe de rebates”, disse o CEO da Tori.
Se o cliente precisa de um advogado ou mesmo de um escritório ou um banco para um M&A de sua empresa, a Tori faz apenas a indicação, dado que a sua atuação é exclusiva em financial advisory, ressaltou Guimarães citando os exemplos.
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A partir das diretrizes, e dentro do escopo de famílias atendidas pelas duas casas, cada cliente tem sua própria carteira, de acordo com suas necessidades e objetivos e com o perfil - “o portfólio de família com R$ 20 milhões é diferente de outra com R$ 80 milhões e de uma com R$ 500 milhões, a complexidade é diferente.”
São dois CIOs (Chief Investment Officer) exclusivos na Tori, que estão no comitê de investimentos e dedicados à montagem da carteiras: um voltado à estratégia local, e o outro, à alocação offshore.
Outro ponto que recebe atenção em particular na Tori, segundo ele, é o cuidado e a estratégia com os recursos que entram, seja mensal, semestral ou anualmente.
“Em famílias com menos de R$ 100 milhões em patrimônio, é normal que muitas sejam ainda poupadoras, ou seja, que acumulam recursos. Saber o que fazer com esse dinheiro é algo muito importante”, disse o executivo.
Isso inclui a projeção de patrimônio que é fornecida a partir do sistema proprietário da casa, o que torna o planejamento algo mais tangível para as famílias.
“Nós nos preocupamos em direcionar reuniões com as famílias nessa direção, para que elas saibam no que as decisões de investimento vão resultar lá na frente”, explicou o executivo.
“Quando o cliente olha a curva [da projeção de patrimônio], é como se acendesse uma luz. E ele passa a entender e a se interessar mais.”
Da Vita até o acordo com a Turim
A citada plataforma proprietária da Tori remete às origens da Vita e ao que se consolidou como diferencial estratégico na trajetória da casa cofundada por Guimarães.
Ele trabalhou cerca de uma década em Nova York, inicialmente no Macquarie e depois no Morgan Stanley e no Goldman Sachs. Nos dois últimos, montou mesas de trading de derivativos para mercados emergentes - e chegou a co-head no Goldman.
Mas decidiu em 2016 voltar ao Brasil por questões pessoais.
De volta ao país, decidiu deixar de trabalhar com trading e começar a empreender, ajudando famílias a investir, ainda que não conhecesse à época ninguém que já pudesse assumir como clientes.
“No período de non-compete, decidi estudar o mercado de wealth e vi que o modelo independente era o que mais fazia sentido”, contou o executivo em referência, mais uma vez, ao que ressalta como pilar do negócio.
Ele ficou de quatro a cinco meses sem cliente até que um amigo indicou a mãe, que havia acabado de receber uma herança de cerca de R$ 5 milhões.
Em dois anos, em 2018, a Vita aumentou a carteira de clientes, em sua maioria por meio de indicações de amigos e com esse tamanho aproximado de patrimônio, alguns até menores, com cerca de R$ 2 milhões a R$ 3 milhões.
“Percebi que seria um desafio ‘escalar’ o negócio e decidi estudar mais o segmento. Fui a uma feira de financial advisors nos Estados Unidos, conversei com muita gente e, na volta ao Brasil, falei para o meu sócio à época: ‘precisamos desenvolver um sistema’”, relembrou Guimarães.
Eles conseguiram desenvolver um sistema proprietário para financial advisors que endereçava as principais demandas. E isso ajudou no ganho de escala.
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Outro divisor de águas, segundo ele, foi a pandemia. “Entramos em 2020 com R$ 300 milhões [em advisory] e encerramos o ano com R$ 800 milhões."
No ano seguinte, a Vita recebeu investimento do Gorila, um fundo de venture capital, com o objetivo de acelerar o desenvolvimento de tecnologia para a operação - foi o acionista que saiu para a aquisição da Turim.
Em 2022, Guimarães e seus sócios na Vita decidiram que era momento de buscar profissionais especializados em wealth para a operação, dado o fato de que tanto ele como seus sócios tinham uma carreira pregressa como traders.
“Entrevistamos mais de 200 pessoas, com ajuda de uma empresa de headhunting. Mas era um momento em que bancos e plataformas pagavam muito pelos profissionais e de forma antecipada, e nós éramos uma empresa pequena. Não conseguimos contratar ninguém”, relembrou Guimarães.
Diante desse desafio, eles decidiram adotar outra estratégia de crescimento: buscar outros pequenos family offices que gostariam de contar com a sua estrutura e de tê-los como sócios, em uma frente B2B.
“Começamos com cold call, pegando contatos em lista da CVM [Comissão de Valores Mobiliários]: acertamos um deal em 2022, outro em 2023 e daí passou a aumentar, até que concluímos em 2024 que era um negócio com potencial: vamos investir e dividir os times [entre essa frente e a de family office]“, disse.
Naquele momento, o segmento B2B já contava com 20% em média de participação em 23 empresas, com um pipeline para novas transações.
“A Vita se tornou um negócio forte para acelerar family offices. Muitos profissionais que saem de bancos procuram a empresa para conseguir se estruturar rapidamente”, afirmou.
Trata-se de uma vertical cujo atendimento abrange diferentes perfis, de novos escritórios de assessores de investimento a single family office que se torna multifamily office e outros que já atuam dessa forma mas ganham escala e multiplicam os ativos sob assessoria.
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O negócio de multifamily office, por sua vez, também crescia a um ritmo médio que chegava a 40% ao ano considerando o período desde o início de operação, o que justificava manter o foco também nessa frente.
“Decidimos que queríamos recomprar a participação minoritária da Gorila e o plano era fazer isso com nossos recursos. Até que decidimos antes procurar a Turim, uma empresa que já admirávamos como referência”, contou.
A Turim tinha acabado de criar uma nova marca - a Tori -, dedicada a atender famílias cujo patrimônio de valores menores não estava no radar da operação.
As conversas com os sócios da Turim resultaram no acordo anunciado ao mercado em março.
A Turim incorporou o negócio de multifamily office da Vita dentro da Tori, como acionista majoritário; e Guimarães e seus sócios ficaram como minoritários na Tori e majoritários na Vita com o negócio exclusivamente B2B, com a Turim como minoritário, dado que o Gorila tinha participação em ambos os negócios.
Segundo Guimarães, no momento da fusão, a Vita estava com cerca de R$ 3,5 bilhões em ativos sob advisory, com atendimento a famílias com patrimônio médio na faixa de R$ 15 milhões a R$ 20 milhões.
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