Opinión - Bloomberg

Novo CEO da Kering tem difícil tarefa de reduzir dívida e revitalizar marcas de luxo

Luca de Meo, ex-CEO da Renault, assumirá a liderança do grupo dono da Gucci e deve reestruturar a empresa, encarando a saúde financeira da empresa, que tem uma dívida líquida estimada em € 8,9 bilhões

Luca de Meo
Tempo de leitura: 5 minutos

Bloomberg Opinion — Quando Luca de Meo, ex-CEO da Renault, assumir o cargo mais alto da Kering, proprietária da Gucci, na próxima semana, ele terá pela frente uma transformação complicada.

Ao substituir o herdeiro da família controladora, ele deve reduzir a dívida e lidar com o excesso de executivos, mas, acima de tudo, fazer com que a Gucci volte a funcionar a todo vapor.

Isso já seria difícil em uma montadora, onde os custos podem ser simplesmente cortados. Mas o setor de luxo depende da visão dos designers e dos gastos com marketing para se destacar em um mercado concorrido.

Na Renault, De Meo combinou perspicácia financeira com talento para o design. Mesmo assim, o delicado equilíbrio entre economizar e promover a criatividade torna essa reviravolta repleta de possíveis erros de moda.

PUBLICIDADE

Leia mais: Além da Gucci: conheça as marcas da Kering, segundo maior grupo de luxo do mundo

A primeira tarefa do novo CEO, que substitui François-Henri Pinault, é colocar a Kering em uma posição financeira mais sólida.

Erwan Rambourg, analista da HSBC Holdings, estima a dívida líquida no final do ano em € 8,9 bilhões, excluindo passivos de arrendamento, 3,3 vezes sua estimativa de lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização (Ebitda) para 2025.

PUBLICIDADE
Gráfico

De Meo terá pouca escolha a não ser reduzir o peso dos empréstimos e cortar custos, como ele mesmo destacou na terça-feira (9). Enfrentando os acionistas pela primeira vez, ele disse que tomaria decisões rápidas e difíceis e apresentaria seu plano estratégico na primavera.

Gráfico

Como se isso não bastasse, há o legado da decisão da Kering, há dois anos, de adquirir 30% da marca italiana Valentino, da Mayhoola, do Catar, por € 1,7 bilhão, com a opção de comprar o restante até 2028, por um valor estimado em € 4 bilhões.

A Valentino enfrenta seus próprios desafios, então é improvável que a Mayhoola force a Kering a comprar o restante antes de 2028, como poderia fazer. Como o preço será baseado no desempenho da Valentino, a Kering disse em julho que o valor seria “substancialmente inferior” a € 4 bilhões.

Mas De Meo poderia tentar reestruturar o negócio, por exemplo, pagando mais em ações, dando à Mayhoola uma participação na empresa. Isso livraria a Kering de um grande desembolso de dinheiro e traria um acionista forte – se o fundo do Catar e a família Pinault estiverem dispostos.

PUBLICIDADE
Gráfico

O novo CEO também deve decidir sobre projetos estratégicos, como a expansão no setor de beleza. A empresa adquiriu a Creed em 2023 por um valor estimado em 3,5 bilhões de euros para construir a plataforma de beleza da Kering. Mas, desde então, ela tem lidado com questões mais urgentes.

A Kering não escondeu seu desejo de trazer os produtos de beleza e fragrâncias da Gucci para dentro da empresa. Atualmente, o negócio é licenciado para a Coty, mas o Women’s Wear Daily informou que a empresa considera uma separação. Isso poderia abrir caminho para uma saída antecipada da licença da Gucci.

De Meo terá que ponderar essas ambições em relação a outras demandas sobre o caixa da empresa. Ele poderia adotar uma abordagem diferente: sair do setor de beleza e joias da mesma forma que a Kering se desfez de seu negócio de relógios em 2022, como observa Luca Solca, analista da Berstein.

PUBLICIDADE

Leia mais: Armani lutou por marca independente; legado será posto à prova por herdeiros

Com o tempo, marcas menores, como a McQueen, poderiam ser colocadas à venda. Tal estratégia provavelmente resultaria em uma despesa única para a Creed, mas daria ao novo CEO mais tempo para revitalizar a Gucci.

Além de lidar com as finanças da Kering, De Meo deve enfrentar uma estrutura administrativa pesada, que cresceu nos últimos anos e agora inclui dois vice-CEOs.

Com as vendas da Gucci sem apresentar melhora no último trimestre, o novo CEO faria bem em divulgar todas as más notícias o quanto antes.

Há dois fatores que podem impedir uma enxurrada de más notícias. O primeiro – que Pinault continue como presidente – seria preocupante. O segundo – que De Meo tenha que equilibrar as metas financeiras com o fomento de seus talentos criativos e o investimento em suas marcas – ressalta o desafio que ele enfrenta.

Gráfico

A saída de Matthieu Blazy da Bottega Veneta, outra marca do grupo, para se tornar diretor criativo da Chanel significa que todas as marcas da Kering estão em transição criativa ou em modo de recuperação.

De Meo reconheceu a importância do bom design, da herança e da conexão emocional na Renault. No entanto, reacender as vendas requer investimento e está em desacordo com seus planos de cortar custos.

Esse equilíbrio é mais extremo na Gucci, que em seu auge representava mais de 60% das vendas do grupo.

Gráfico

Não estou convencido de que Demna Gvasalia seja o designer certo para liderar a marca italiana. Mas, considerando que ele é o segundo diretor criativo em menos de três anos, o novo CEO não tem muita escolha a não ser mantê-lo.

Gvasalia revelará sua visão em Milão no final deste mês, enquanto algumas peças estarão disponíveis para compra. Se ele conseguir explorar alguma demanda incipiente pela Gucci, como a popularidade da bolsa Giglio, uma bolsa com o logotipo G e preço razoável, então o caminho de De Meo poderá ficar mais fácil.

Não podemos esquecer que, em um passado não muito distante, a Kering era mestre em combinar o designer certo com a marca certa, com sucesso espetacular. Agora, ela precisa do mesmo tipo de alquimia entre suas marcas de luxo e seu novo CEO. Sem isso, o trabalho mais difícil no mundo do glamour será ainda mais difícil.

Esta coluna reflete as opiniões pessoais do autor e não reflete necessariamente a opinião do conselho editorial ou da Bloomberg LP e de seus proprietários.

Andrea Felsted é colunista da Bloomberg Opinion e escreve sobre os setores de varejo e bens de consumo. Previously, she was a reporter for the Financial Times.

Veja mais em Bloomberg.com

Leia também

Fundador da Oracle ‘ganha’ US$ 100 bi em um dia e se torna o mais rico do mundo

Even completa tríade do luxo com residencial em frente à ‘praia’ de ultrarricos em SP

Por que a Porsche aumentou a aposta em elétricos no Brasil, segundo o CEO