Bloomberg Opinion — O filme de grande sucesso da temporada que pegou todo mundo desprevenido acabou se tornando um musical animado sobre estrelas pop coreanas que lutam contra demônios.
Esse é o exemplo mais recente de como o soft power da Coreia do Sul molda as tendências globais. Agora, Seul precisa garantir que se beneficie dessa narrativa única tanto quanto a Netflix (NFLX).
Guerreiras do K-Pop se tornou o filme original da Netflix mais assistido de todos os tempos.
Sua exibição de dois dias nos cinemas superou as bilheterias dos EUA e se tornou a primeira trilha sonora a ter quatro músicas no top 10 da Billboard Hot 100.
A grande popularidade entre crianças e pré-adolescentes fez com que muitos comparassem o potencial da franquia a Frozen, que, segundo estimativas, rendeu bilhões de dólares à Walt Disney (DIS).
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Analistas veem claramente esse potencial. Em uma teleconferência de resultados na semana passada para a varejista americana Five Below, um deles fez uma pergunta direta sobre a mercadoria: “Três palavras: Guerreiras do K-Pop?"
A Netflix pensou que estava fazendo um filme para o público de K-pop e anime. Em um mundo cada vez mais interconectado, essas linhas estão mais tênues do que nunca.
A retórica política e uma guerra comercial instigada por Washington podem fazer parecer que a era do globalismo está morrendo. Mas os jovens sempre demonstram apetite por um mundo multicultural.
O filme se passa em Seul, foca em um grupo feminino de K-pop e se inspira na mitologia e na demonologia coreanas. Embora o diálogo seja em inglês, está longe de ser uma narrativa de brancos para o público americano. E não é apenas a diáspora coreana que comemora a representação asiática do filme.
Hollywood não tem mais motivos para se surpreender quando um conteúdo aparentemente “estrangeiro” se torna um grande sucesso. A onda coreana há muito tempo vem impulsionando as tendências globais da cultura pop.
Um relatório do Fundo Monetário Internacional no ano passado identificou a Coreia do Sul como tendo o mais alto nível de “soft power”.
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A série estrangeira (em um idioma que não é inglês) mais popular da Netflix de todos os tempos é Round 6. A plataforma de streaming disse no ano passado que mais de 80% dos assinantes globais assistiram a conteúdo coreano na plataforma.
Lideradas pela Netflix, as gigantes globais da tecnologia aceleraram e lucraram com a enorme popularidade das exportações culturais da Coreia.
Plataformas como TikTok e Instagram ajudaram a viralizar desde marcas de produtos de beleza coreanos até o ramen Buldak da Samyang Foods e os vídeos de danças e dublagens de Guerreiras do K-Pop.
Esses intercâmbios culturais são uma coisa boa.
A codiretora Maggie Kang, cineasta coreana-canadense, relembrou em uma entrevista como sua professora do ensino fundamental não conseguia sequer apontar a Coreia do Sul no mapa.
Durante uma exibição em Seul, Kang disse que seu conselho para aspirantes a criadores de conteúdo local era nunca tentar atender às opiniões dos outros.
“Essa é a única maneira de o conteúdo coreano atingir um público ainda mais amplo - mostrar nossa cultura exatamente como ela é, com confiança”, disse ela.
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Agora, a Coreia do Sul precisa garantir que as empresas ocidentais não sejam as únicas que lucrem com a moda.
Muito debate nos EUA girou em torno do fato de a Netflix ter perdido dinheiro ao limitar o lançamento do filme nos cinemas ou não ter previsto a demanda crescente por mercadorias (sem mencionar a decisão da Sony Pictures Animation de vender os direitos do filme para o serviço de streaming por um valor que, em retrospecto, foi muito baixo).
Mas esse discurso deixa de lado uma questão mais ampla.
Em um momento em que a demanda global por conteúdo coreano cresce, garantir que as empresas coreanas mantenham os direitos de propriedade intelectual de franquias globais como Guerreiras do K-Pop é um ponto de partida importante.
Para as plataformas que tentam capitalizar o soft power da Coreia do Sul, há uma lição: nem tudo precisa ser culturalmente diluído para o público americano.
A equipe por trás do filme se esforçou muito para garantir que a história mantivesse sua autenticidade ao representar a Coreia para o mundo. Os esforços claramente valeram a pena.
A Netflix deve ser elogiada por reconhecer o apelo internacional da narrativa coreana e investir nela desde o início. Mas agora é hora de a Coreia do Sul proteger e lucrar com suas franquias culturais.
Esta coluna reflete as opiniões pessoais do autor e não reflete necessariamente a opinião do conselho editorial ou da Bloomberg LP e de seus proprietários.
Catherine Thorbecke é colunista da Bloomberg Opinion e cobre tecnologia na Ásia. Já foi repórter de tecnologia na CNN e na ABC News.
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