Opinión - Bloomberg

Intel terá mais riscos do que ganhos potenciais com governo dos EUA como acionista

Participação acionária do governo quase certamente levará a conflitos de interesses e tomadas de decisão politizadas e poderá afetar a produtividade e a inovação. Também distorceria a concorrência, além de abrir as portas para a corrupção

Fachada da Intel
Tempo de leitura: 4 minutos

Bloomberg Opinion — O que fazer com a Intel (INTC), a fabricante de chips dos EUA outrora famosa e agora em declínio?

Após anos de decisões equivocadas, os semicondutores da Intel ficaram para trás em relação aos concorrentes e seu negócio de fundição - foundry - não tem clientes importantes.

A empresa perdeu praticamente todas as oportunidades no setor de inteligência artificial.

No ano passado, em meio a uma reestruturação, demitiu seu CEO, reduziu dividendos, realizou demissões em massa e perdeu cerca de US$ 19 bilhões.

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Uma coisa a não fazer: conceder ao governo dos Estados Unidos uma participação acionária de 10% na empresa, como a Casa Branca acaba de conseguir.

Leia mais: Trump acerta acordo com a Intel para dar 10% de participação na empresa aos EUA

Embora o governo tenha dado poucos detalhes sobre como esse acordo funcionará, os riscos são muito claros.

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Uma participação desse tamanho do governo em uma empresa privada quase certamente levará a conflitos de objetivos e tomadas de decisão politizadas. Isso poderia impedir a produtividade, a inovação e o crescimento. Certamente distorceria a concorrência, abriria as portas para a corrupção e criaria um precedente ruim.

Gráfico

Na verdade, quase todos os problemas enfrentados pela Intel poderiam ser agravados por essa ideia.

Decisões difíceis provavelmente serão adiadas, talvez indefinidamente. As preocupações dos acionistas podem ficar subordinadas às partidárias.

Um apoio federal pode sustentar temporariamente o preço das ações da empresa, mas também corroerá sua competitividade ao longo do tempo.

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Esse tipo de acordo já produziu o tipo de inventividade ou visão estratégica que a recuperação da Intel exigirá?

Para piorar a situação, de acordo com alguns relatos, o governo pode pressionar outras empresas de tecnologia a usar a área de foundry da Intel ou comprar seus chips, forçando assim os atores mais produtivos a subsidiar os fracassos de seus concorrentes — contra sua vontade e em seu detrimento.

Embora o secretário do Tesouro, Scott Bessent, tenha negado que uma medida desse tipo esteja sendo considerada, é preciso questionar.

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Afinal, o governo parece ter uma tendência para esse tipo de coisa.

Anteriormente, propôs adquirir uma participação na plataforma de mídia social TikTok, ofereceu isenções de controle de exportação a empresas de chips que concordassem em ceder 15% de sua receita e obteve uma “participação especial” na United States Steel Corpration como parte de um acordo para aprovar sua venda a um comprador japonês.

No mês passado, o Pentágono adquiriu uma participação de US$ 400 milhões em uma empresa de mineração de terras raras. Outros “acordos” estão supostamente em negociação.

Somadas, essas ideias começam a parecer um clientelismo como política. O que deveria acontecer em vez disso?

Leia mais: Como a Intel passou de alvo de Trump a empresa cobiçada pelo governo e pelo SoftBank

No que diz respeito aos semicondutores, o Congresso americano deveria empreender algumas reformas há muito esperadas: oferecer um visto para fabricantes de chips e, de outra forma, expandir a imigração qualificada; fazer mais para conter as disputas legais onerosas induzidas pelas leis de licenciamento; reduzir as tarifas sobre peças e componentes relevantes; investir em linhas de transmissão e expansão da rede; eliminar termos de trabalho e aquisição que inflacionam os custos; aumentar o financiamento para P&D em semicondutores; melhorar o tratamento tributário dos gastos com investimentos; e muito mais.

Nada disso resolveria a situação da Intel da noite para o dia, mas tornaria a fabricação de chips nos EUA mais competitiva, o que supostamente é o objetivo.

Na medida em que o governo está preocupado com a segurança nacional de um país, uma abordagem melhor é reforçar esforços como o Trusted Foundry do Pentágono e programas de garantia quantificável, que visam criar áreas e processos seguros em fábricas comerciais para atender às necessidades militares.

Um esforço separado, chamado Secure Enclave, que concedeu cerca de US$ 3 bilhões à Intel para produzir chips em uma instalação especializada, provavelmente não será sustentável, a menos que seja aberto a mais empresas; o objetivo deve ser subsídios econômicos fortemente focados nas necessidades de defesa, não um resgate financeiro ilimitado.

Quanto à própria Intel?

No curso normal das coisas, o mercado livre determinaria seu destino e a destruição criativa faria sua mágica conforme necessário.

Se o governo quiser impedir esse processo, deve explicar sua lógica, oferecer uma visão plausível para o futuro e tentar mitigar as desvantagens previsíveis. Até agora, nada disso foi oferecido.

O Conselho Editorial publica as opiniões dos editores sobre uma série de assuntos de interesse global.

--Editores: Timothy Lavin, Nisid Hajari.

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