Opinión - Bloomberg

A aposta na alta do petróleo tem fundamento, mas é uma realidade ainda distante

Apesar de uma queda de quase 20% nos preços nos últimos dois anos, investidores do setor esperam recuperação do petróleo, o que exige paciência e pode resultar em custos de oportunidade significativos

Plataforma de petróleo
Tempo de leitura: 6 minutos

Bloomberg Opinion — Quando uma aposta no mercado dá errado, os investidores muitas vezes ficam tentados a aguentar firme, convencendo a si mesmos de que sua negociação de curto prazo sempre foi destinada a ser uma posição de longo prazo.

A ilusão é mais fácil de ocorrer nos mercados de commodities: sua natureza cíclica significa que, inevitavelmente, o que está em alta acabará ficando em baixa e vice-versa. É só uma questão de paciência – e coragem para aguentar as perdas pelo tempo que for preciso.

Com a queda de quase 20% nos índices de referência do petróleo nos últimos dois anos, os investidores otimistas estão, por necessidade, esperando.

A expressão "We remain bullish" até mesmo viralizou nas redes sociais, desafiando o fato de que quase todos os bancos de Wall Street continuam decididamente pessimistas para 2026.

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Para falar a verdade, eu também estou pessimista no curto prazo. Mas isso não significa que os preços do petróleo – e as ações associadas ao mercado de energia – não vão acabar se recuperando.

Ali Al-Naimi, que foi ministro do Petróleo da Arábia Saudita por mais de 20 anos, resumiu uma vez sua vida profissional como uma montanha-russa de preços.

“Durante minhas sete décadas no setor, vi o petróleo a menos de US$ 2 o barril e a US$ 147, e muita volatilidade entre esses valores”, disse ele em 2016, pouco antes de se aposentar. Sua sabedoria continua relevante hoje.

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Gráfico

Mas esperar pela recuperação exigirá muita paciência e acarretará custos de oportunidade significativos. Isso é particularmente verdadeiro para quem comprou a mais de US$ 100 o barril, dado que o petróleo bruto hoje oscila em torno de US$ 65.

A situação é ainda pior no lado das ações; as pequenas e médias empresas petrolíferas foram negociadas em 2022 e 2023 a múltiplos insustentáveis, e muitas caíram entre 20% e 50% desde então.

Recuperar essas perdas não será fácil. A última grande recessão ilustra o caminho difícil que os otimistas terão pela frente: o petróleo Brent perdeu seu valor de três dígitos em 9 de setembro de 2014 e só recuperou esse nível em 28 de fevereiro de 2022. Foram sete anos, cinco meses e 19 dias longos – e caros – antes de poderem comemorar a vitória.

É possível traçar um quadro levemente otimista para os preços do petróleo, provavelmente já em 2027 e ainda mais em 2028-2029, com base em dois fatores principais.

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Primeiro, apesar da desaceleração, o crescimento atual da demanda global por petróleo continua saudável, não muito longe da média de longo prazo de 20 anos, que é de um aumento de cerca de 1,1 milhão de barris por dia.

A menos que haja uma recessão global, provavelmente já vimos o fundo do poço do crescimento da demanda.

Em segundo lugar, os preços baixos prevalecentes prejudicarão os investimentos e, portanto, a produção futura fora da Opep+.

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A indústria de xisto dos EUA, mais sensível ao petróleo barato e mais rápida a reagir aos preços baixos, já está mostrando sinais de estabilização; a Diamondback Energy, maior produtora americana de xisto, disse no início desta semana que a produção de petróleo dos EUA enfrentaria uma queda “inevitável” depois que as empresas parassem as perfurações.

As previsões de oferta e demanda de petróleo para 2026 e 2027 sugerem que, nas últimas semanas, os analistas começaram a reduzir suas estimativas para a produção global nos próximos dois anos. Esse é um sinal importante de que um ponto de inflexão está por vir.

Além disso, à medida que os países da Opep+ aumentam a produção, a capacidade excedente restante se esgota, o que normalmente eleva os preços.

Por fim, os estoques globais de petróleo bruto estavam baixos antes que o excesso atingisse o mercado, limitando o armazenamento.

Acrescente a esse coquetel otimista outras incógnitas potenciais — um furacão prejudicando a produção de petróleo do Golfo do México nos EUA, um inverno frio aumentando a demanda ou até mesmo uma guerra eclodindo em um país produtor de petróleo.

Além disso, há Donald Trump: tudo o que separa um mercado de petróleo lutando contra um excesso significativo e um enfrentando um grande déficit é uma mensagem do presidente nas redes sociais anunciando sanções reais contra o Irã e a Rússia.

Assim, os otimistas podem estar certos se a Casa Branca ajudar. Infelizmente para eles, Trump deixou claro que não gosta de preços altos do petróleo, embora tenha imposto uma tarifa adicional de 25% sobre produtos importados da Índia na quarta-feira (6) como punição pelo país continuar comprando petróleo russo.

Ainda assim, juntando tudo isso, uma aposta de que o petróleo será negociado a preços mais altos em 18 a 24 meses – digamos, acima de US$ 75 a US$ 80 por barril – tem uma chance razoável de se concretizar.

E quanto a US$ 100 por barril? Altamente improvável. E quanto a preços recordes acima de US$ 150? Nunca diga nunca – mas não.

Há uma questão preocupante: alguns dos catalisadores otimistas exigem primeiro um petróleo ainda mais barato.

Para que o crescimento da produção fora da Opep+ pare ou até mesmo diminua, o setor precisa passar por um período doloroso de preços entre US$ 50 e US$ 60, que convença todos os conselhos de administração a cortar investimentos.

Para que o cartel esgote sua capacidade de produção excedente atual, a Opep+ precisa primeiro bombear mais, fazendo com que os preços caiam. Em resumo: para ser otimista no médio prazo, é preciso ser pessimista no curto prazo.

Existem outros obstáculos. A demanda por petróleo ainda é saudável, mas sua taxa de crescimento está em uma trajetória estrutural de queda devido a mudanças na estrutura da economia chinesa, além da chegada de carros a gasolina mais eficientes e veículos elétricos às ruas.

Quanto mais tempo o ciclo otimista demorar para surgir, maior será o risco de que o crescimento da demanda não seja suficiente para impulsionar os preços.

A produção fora da Opep+ também pode surpreender positivamente, especialmente fora da indústria de xisto dos EUA.

Projetos na Guiana, Brasil, Canadá, Uganda, Noruega e China adicionarão barris extras nos próximos dois anos, independentemente dos preços. O crescimento da produção fora da Opep+ pode desacelerar, mas não entrará em colapso.

Portanto, embora seja possível ficar entusiasmado com as perspectivas para o petróleo nos próximos dois anos, assumir uma posição longa no contrato futuro Brent dezembro 2027 (para citar uma aposta popular) requer bastante disposição para suportar possíveis perdas contábeis nesse intervalo.

Por enquanto, tudo aponta para preços mais baixos nos próximos meses, especialmente após o fim do aumento sazonal da demanda durante o verão no hemisfério norte.

Com o tempo, os preços baixos atuais criarão as bases para a próxima recuperação cíclica. Mas isso ainda está muito, muito longe.

Esta coluna reflete as opiniões pessoais do autor e não reflete necessariamente a opinião do conselho editorial ou da Bloomberg LP e de seus proprietários.

Javier Blas é colunista da Bloomberg Opinion e cobre energia e commodities. É coautor de “The World for Sale: Money, Power, and the Traders Who Barter the Earth’s Resources”.

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