Bloomberg Opinion — A maior notícia em torno da Tesla (TSLA) neste momento diz respeito à ruptura repentina, embora não surpreendente, do CEO Elon Musk com um líder que, assim como ele, não é nem um pouco calmo nem modesto: o presidente Donald Trump. Mas a notícia mais importante em relação à empresa diz respeito ao que está acontecendo longe dali: na China.
As remessas da fábrica da Tesla em Xangai caíram 15% em maio em comparação com o ano anterior, de acordo com dados preliminares da Associação Chinesa de Veículos de Passageiros. Isso marca oito meses consecutivos de queda na produção da maior fábrica de veículos elétricos da Tesla, responsável por cerca de 40% de sua capacidade global.
Esses números não discriminam quais desses veículos elétricos são vendidos na China ou exportados de lá, mas essa tendência não é favorável à Tesla.
Até abril, sua participação no mercado chinês de veículos elétricos havia caído mais da metade nos últimos quatro anos, de acordo com dados compilados pela New AutoMotive, uma empresa de pesquisa sediada no Reino Unido.

Os números também sugerem uma deterioração econômica. Em uma base simples de dias corridos, eles implicam uma utilização da fábrica de Xangai de 76% em maio. Isso não é terrível, mas é uma queda significativa em relação a maio do ano passado.
Até agora neste ano, excluindo o mês de fevereiro, quando a Tesla estava se reequipando para o Model Y atualizado, a utilização implícita está 10 pontos abaixo do mesmo período em 2024.
Falando desse Model Y atualizado, não é um bom sinal que a Tesla já tenha oferecido incentivos como financiamento a juros zero na China.
Em conjunto, a menor utilização da capacidade, implicando custos fixos mais altos por veículo, e descontos mais elevados, significando menos receita líquida, apontam para um problema contínuo com o que ficou muito evidente nos resultados do primeiro trimestre da Tesla: margens de lucro reduzidas em seu negócio principal.
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Diferentemente das vendas mais fracas de veículos elétricos da Tesla em outros mercados importantes, como Califórnia e Europa, a queda na China não tem nada a ver com a atuação política de Musk.
A reputação da Tesla na China continua alta, vista como um catalisador essencial na revolução da qualidade e escala do setor automotivo do país.
Exceto que “catalisador” não é bem a palavra certa, porque a beleza dos catalisadores é que eles provocam transformações, mas não se esgotam no processo.
Nesse caso, seria mais preciso chamar a Tesla de reagente, porque a indústria doméstica chinesa de veículos elétricos, estimulada por seu exemplo, agora está devorando-a viva.
Embora a participação da Tesla nas vendas de veículos elétricos a bateria na China tenha caído para cerca de 10% neste ano, esse número cai para 5,8% quando se incluem outros veículos chamados de “veículos de energia nova”, como híbridos plug-in, de acordo com dados compilados pelo Goldman Sachs.
Concorrentes como a BYD (BYD), que detém cerca de 27% do mercado de veículos elétricos a bateria da China, agora provocam o tipo de entusiasmo que a Tesla costumava proporcionar em relação a aparência, autonomia e recursos de assistência ao motorista — e a preços mais baixos.
A Xiaomi, fabricante de smartphones, está lançando o YU7, um SUV elétrico de alta tecnologia e carregamento rápido que se assemelha a um Porsche ou Ferrari, mas talvez seja melhor descrito como um míssil direcionado ao Model Y.
Em uma dimensão alternativa, a China serviria como um laboratório para a Tesla aprimorar veículos elétricos lucrativos e líderes mundiais, que poderiam até mesmo ser exportados para seu mercado interno.
Na dimensão em que vivemos, Musk parece ter perdido sua ambição de desenvolver veículos elétricos novos e acessíveis que possam competir em todo o mundo.
O último modelo genuinamente novo da Tesla, o Cybertruck, é certamente grande, mas tão “bonito” quanto a reforma tributária de Trump, que Musk agora ridiculariza abertamente como uma “abominação”.
Embora a Tesla se destaque das montadoras tradicionais dos Estados Unidos, da Alemanha e do Japão em muitos aspectos — certamente em valor de mercado —, ela, assim como as outras companhias, viu sua posição na China se deteriorar rapidamente.
E, independentemente das últimas postagens de Musk no X, ele trabalhou duro para garantir a eleição de um presidente e uma maioria no Congresso com a intenção de esmagar as vendas de veículos elétricos nos Estados Unidos.
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Com o fim do segundo trimestre se aproximando e os números de vendas vindos da China e da Europa prenunciando mais uma série de resultados fracos, talvez não seja de se admirar que essa narrativa seja ofuscada por todo tipo de outras coisas.
Musk, que dispensou a equipe de relações públicas da Tesla e rotineiramente denuncia a mídia como “propaganda”, mergulhou recentemente em uma campanha midiática e agora criou uma nova intriga política.
Além disso, é claro, temos o lançamento iminente dos carros autônomos da Tesla em Austin. Seja qual for o resultado final, com a narrativa sempre duvidosa de que o cargo de Musk na Casa Branca impulsionaria a sorte da Tesla agora esgotada, esses táxis robóticos constituem o principal pilar que sustenta o múltiplo de lucros de três dígitos da Tesla.
Certamente, esse número não tem nada a ver com o que está acontecendo no maior mercado de veículos elétricos do planeta.
Esta coluna reflete as opiniões pessoais do autor e não reflete necessariamente a opinião do conselho editorial ou da Bloomberg LP e de seus proprietários.
Liam Denning é colunista da Bloomberg Opinion e cobre energia. Ex-banqueiro, foi editor da coluna “Heard on the Street”, do Wall Street Journal, e escreveu para a coluna “Lex”, do Financial Times.
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