Bloomberg — A primeira guerra comercial de Donald Trump prejudicou os produtores de soja americanos em estimados US$ 11 bilhões. Uma sequência dessa guerra está prestes a se tornar ainda pior.
O grão foi o garoto-propaganda da primeira disputa tarifária de Trump com a China, com os embarques americanos para o maior comprador mundial da commodity em queda de 79% nos primeiros dois anos de sua administração, entre 2017 e 2018.
Naquela época, a nação asiática ainda precisava de parte dos suprimentos americanos de soja. Agora, pode simplesmente viver das compras do rival Brasil.
O cenário é semelhante para outras commodities, pois a China tem diversificado seus fornecedores e abre mercado para o milho e o trigo da Argentina, o sorgo do Brasil e o algodão da Austrália.
Os silos da China estão transbordando - ao mesmo tempo que uma economia em desaceleração afeta a demanda doméstica.
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“Da primeira vez a China não estava preparada. Desta vez, eles estão preparados - têm estoques recordes de soja internamente,” disse Steve Nicholson, estrategista global do setor de grãos e oleaginosas no Rabobank. “A dinâmica mudou um pouco.”
O risco de uma escalada da guerra comercial surge no momento em que os agricultores americanos lutam para recuperar sua posição como o principal exportador de produtos básicos, de milho a trigo, após os sucessos do Brasil em conquistar participação de mercado.
Os produtores já estão recebendo menos por suas colheitas, com os preços do milho e da soja nos níveis mais baixos desde 2020 no início deste ano.
Trump deve repetir o manual de seu primeiro mandato, com tarifas impostos que possivelmente serão seguidas por medidas retaliatórias da China, que pesariam sobre os preços dos grãos.
Uma resolução pode eventualmente surgir, mas a China terá um “apetite menor” para retornar aos níveis de importação anteriores, escreveram em nota analistas do Citigroup Global Markets na segunda-feira (9).
A maioria dos produtos agrícolas “está na linha de frente para movimentos comerciais retaliatórios”, porque mudar de fornecedores incorre em custos comparativamente menores, de acordo com analistas da Bloomberg Intelligence.
A primeira guerra comercial ajudou a colocar em movimento a atual situação de oferta, já que o afastamento da China dos EUA estimulou o Brasil a plantar mais soja e abrir terras para expandir a área cultivada.
O Brasil pode colher uma safra de soja no início do próximo ano, mais de 30% maior que os níveis vistos antes da guerra comercial EUA-China.
Entretanto estoques globais abundantes não têm impedido os agricultores americanos de produzir mais — eles acabaram de colher uma safra recorde de soja.
Os produtores provavelmente continuarão a plantar mesmo se a guerra comercial de Trump afetar a demanda — afinal, o ex-presidente destinou US$ 28 bilhões aos agricultores para amortecer os impactos durante a última disputa comercial.
“Não esperamos uma retração na área plantada nos EUA,” disse Chuck Magro, CEO da fabricante de sementes Corteva, que, no entanto, pretende expandir seu programa de soja no Brasil.
“Supondo que as tarifas sejam semelhantes, em que a China sente que precisa comprar de outros mercados, a produção dos EUA ainda encontrará um lar”, afirmou ele.
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Em janeiro de 2020, os EUA e a China assinaram o chamado acordo comercial “Fase Um”, no qual o governo de Pequim se comprometeu a comprar bilhões de dólares em produtos agrícolas americanos e cancelar tarifas.
Se essas tarifas forem restabelecidas, os agricultores americanos poderão perder milhões de toneladas de grãos e exportações de soja anualmente, de acordo com um estudo conjunto das associações nacionais de produtores de milho e de soja, que foi divulgado antes da eleição.
Para reduzir sua dependência dos EUA, a China aprovou em 2022 importações do milho brasileiro. O país asiático também se volta para a Argentina em busca de milho e trigo e autorizou compras no início deste ano.
Isso abriu caminho para os primeiros embarques de milho em 15 anos e os primeiros negócios significativos de trigo entre as duas nações desde a década de 1990.
-- Com a colaboração de Kim Chipman, Tarso Veloso, Gerson Freitas Jr. e Jonathan Gilbert.
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©2024 Bloomberg L.P.
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