Por que fundos avaliam que startups latinas podem retomar onda de IPOs

SoftBank e Endeavor Catalyst apontam que empresas como Rappi, Clip e Creditas, entre outras, estão a caminho do lucro e prontas para abrir o capital no fim do ano

Cerimônia de estreia da startup uruguaia DLocal em junho de 2021 na Nasdaq, antes do fechamento da janela para ofertas que já dura mais de um ano
08 de Abril, 2023 | 03:11 PM

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Bloomberg Línea — Depois de um hiato que já dura um ano e meio, algumas das maiores e mais maduras startups latino-americanas podem protagonizar uma nova onda de IPOs (ofertas públicas iniciais de ações) quando os mercados “reabrirem” para ofertas no fim deste ano ou no início de 2024. Essa é a avaliação de dois dos maiores investidores na região, o SoftBank e o fundo Endeavor Catalyst.

Em entrevista à Bloomberg Línea, a diretora global da Endeavor Catalyst, María Angélica Enríquez, disse que pelo menos uma dezena de startups da região está pronta para abrir o capital na bolsa, como a Rappi, da Colômbia, a mexicana Clip e a Creditas, do Brasil.

É a mesma avaliação do managing partner do SoftBank Latin America Fund, Juan Franck, que disse que há startups da região a caminho do lucro e em condições de lançar um IPO no final de 2023 ou início de 2024 se houver estabilidade no mercado de capitais, com empresas como Rappi, Clip e Creditas, além da mexicana Kavak e das brasileiras MadeiraMadeira e Unico, como possíveis candidatos.

“Startups maduras como a Rappi estavam a caminho de um IPO antes dos atuais choques no mercado”, disse Franck à Bloomberg News.

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Mas por que as startups latino-americanas suspenderam seus planos de IPO a partir do final de 2021 - empresas como a uruguaia DLocal (DLO) e o brasileiro Nubank (NU) foram algumas das últimas - e em que contexto elas esperam retomá-los caso decidam abrir o capital?

Em entrevista à Bloomberg Línea, o CEO da empresa de capital de risco Cube Ventures, Santiago Rojas, disse que a redução no número de IPOs para empresas de tecnologia se deveu aos “múltiplos de valuation que caíram nos últimos dois anos, de uma média de 8,8 vezes o faturamento para 3,7 vezes”.

Rojas explicou que os múltiplos de valuation são uma medida fundamental utilizada por investidores para avaliar o potencial de crescimento de uma empresa e determinar seu valor no mercado público.

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Dessa forma, “quando os múltiplos de valuation são altos, as empresas podem levantar mais capital em um IPO, e os investidores obtêm um retorno maior”, disse.

A Cube Ventures ressalvou, no entanto, que nos últimos anos houve uma diminuição nos múltiplos de valuation de empresas de tecnologia devido à incerteza econômica global e ao aumento das taxas de juros por parte dos maiores bancos centrais do mundo, como o Federal Reserve.

Juros mais altos impactam a projeção de fluxo de caixa descontado de uma empresa trazido a valor presente, o que se traduz na redução do valor justo para a ação.

“Isso levou as empresas de tecnologia a serem mais cautelosas ao considerar um IPO e optarem por permanecer no mercado privado por um período mais longo até que os múltiplos de valuation sejam mais favoráveis”, disse Rojas.

Na avaliação de Daniel Ospina, cofundador da aceleradora de startups baseada em tecnologia Pygma, o adiamento dos IPOs das startups é uma resposta ao aumento das taxas de juros, à situação dos mercados globais e às pressões enfrentadas pelas ações em meio à turbulência no setor bancário após o colapso do Silicon Valley Bank (SVB).

Ele também citou os efeitos que o setor de tecnologia está sofrendo devido à disponibilidade limitada de capital de risco - novamente em razão dos juros mais altos no mundo.

“Esse mix de fatores significa que estas não são condições ideais para abrir o capital, principalmente quando o sentimento do consumidor está mudando para temas como economia e menor exposição à tecnologia. Acredito que quando o mercado acionário e o mercado internacional se recuperarem, certamente haverá um aumento no número de IPOs”, disse Ospina.

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Em sua avaliação, a América Latina continua a ser uma região “com muito poucos IPOs de startups”, e a provável onda de IPOs geraria “um grande impacto para o melhor ou para o pior, a depender de como as ações se comportam nos primeiros meses de cotação.

“Mas o mercado latino-americano definitivamente carece de maior liquidez em termos de poder ter mais saídas na carteira, e eu acho que esse é um grande sinal para futuros investidores de que pode haver IPOs de empresas locais e gerar a liquidez que tantos investidores estão procurando”, disse ele.

Por sua vez, Santiago Rojas, da Cube Ventures, disse que, apesar da expectativa de reabertura dos mercados, é difícil prever o que vai acontecer.

“É como tentar ver o futuro sem um oráculo”, disse ele. “No entanto acredito que uma recuperação dos mercados financeiros deve acontecer a partir do momento em que o Federal Reserve deixar de aumentar as taxas de juros, já que foi isso que aconteceu em todas as crises financeiras dos últimos 40 anos: em 1987, em 2001 e em 2008.” É uma referência às apostas que ganharam força no mercado depois da crise bancária, cujo efeito de contração de crédito equivale a um aumento de juros, dizem analistas.

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“Isso nos diz que o melhor momento para investir novamente em startups será a partir do momento em que as taxas deixarem de subir. Será um sinal de que investir em instrumentos de baixo risco não será mais atraente o suficiente, portanto haverá mais uma vez oportunidades no capital de risco que os investidores não vão querer perder”, concluiu o especialista em investimento de risco.

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Daniel Salazar

Profissional de comunicação e jornalista com ênfase em economia e finanças. Participou do programa de jornalismo econômico da agência Efe, da Universidad Externado, do Banco Santander e da Universia. Ex-editor de negócios da Revista Dinero e da Mesa América da Efe.