Americanas: bancos credores miram bens pessoais de Lemann, Telles e Sicupira

Credores como o Bradesco pretendem buscar ‘desconsideração da pessoa jurídica’ da empresa se trio não injetar ao menos R$ 15 bilhões, segundo fontes à Bloomberg News

A partir da esq., Carlos Alberto Sicupira, Jorge Paulo Lemann e Marcel Telles: trio alega que não sabia do rombo contábil na Americanas (Divulgação)
Por Cristiane Lucchesi - Vinícius Andrade - Rachel Gamarski
02 de Fevereiro, 2023 | 07:28 PM

Bloomberg — Alguns dos principais bancos brasileiros que são credores da Americanas (AMER3) planejam ir atrás de ativos pessoais de bilionários que são os maiores acionistas da empresa: Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Carlos Alberto Sicupira.

Os credores pretendem buscar a “desconsideração da pessoa jurídica” da Americanas se os bilionários não resgatarem a empresa com aportes de pelo menos R$ 15 bilhões, segundo pessoas a par do assunto, que pediram anonimato porque as decisões não são públicas. Os bilionários não ofereceram mais do que R$ 6 bilhões, disseram as pessoas.

Os credores tentam levantar provas para identificar quem foram os responsáveis pelas “inconsistências contábeis” de R$ 20 bilhões anunciadas pela Americanas no dia 11 de janeiro, que dobraram o passivo da varejista e a fizeram pedir recuperação judicial em uma semana. Eles dizem que os diretores e os principais acionistas da empresa se beneficiaram do que eles chamam de fraude.

A Americanas, Lemann, Sicupira e Telles não responderam a pedidos de comentário.

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Em uma declaração de 22 de janeiro, os três bilionários disseram que não sabiam sobre as questões contábeis. “Nunca tivemos conhecimento e jamais toleraríamos manobras ou artimanhas contábeis na empresa”, disseram Lemann, Telles e Sicupira. “Nossa atuação ao longo de décadas sempre foi de rigor ético e legal.”

O Bradesco (BBDC4), maior credor da Americanas e segundo maior banco do Brasil em valor de mercado, disse em documento obtido pela Bloomberg News que planeja buscar os bens pessoais dos acionistas para pagar os credores. Outros bancos que pediram para não ser identificados disseram que pretendem seguir o mesmo caminho.

Com uma dívida de R$ 41,2 bilhões, a Americanas entrou com pedido de recuperação judicial na Justiça do Rio de Janeiro em 19 de janeiro. As negociações com os credores pararam e a empresa está envolvida em uma briga legal com os bancos desde então.

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Além do Bradesco, os detentores de dívida da Americanas incluem o BTG Pactual (BPAC11), o Santander (SANB11), o Itaú (ITUB4) e o Safra.

Grande parte da equipe de gestão que dirigia a Americanas, com sede no Rio de Janeiro, antes que as questões contábeis fossem reveladas, ainda está na companhia. O ex-presidente Miguel Gutierrez, que ficou 20 anos no cargo, saiu antes do anúncio.

Para evitar a destruição de provas, a juíza Andréa Galhardo Palma concedeu ao Bradesco o direito de “produção antecipada de provas” - busca e apreensão de e-mails e documentos de conselheiros, principais acionistas, diretores executivos e funcionários nos últimos dez anos.

Essa decisão foi confirmada nesta quinta-feira (2) pelo juiz Ricardo Negrão após recurso da Americanas alegando “quebra de sigilo e violação da privacidade de sujeitos” que não têm qualquer relação com o caso.

A Kroll Associates Brasil foi nomeada para examinar esses documentos, que serão mantidos lacrados e compartilhados com a CVM, autarquia reguladora do mercado de capitais no Brasil. Outros bancos credores consideram que poderiam usar as mesmas provas contra os acionistas.

Em seu processo de 23 de janeiro assinado pelo escritório Warde Advogados, o Bradesco disse que os acionistas receberam R$ 1,8 bilhão em dividendos durante os dez anos de “inconsistências”. No ano passado, a Americanas distribuiu um recorde de R$ 330 milhões em dividendos, segundo o documento.

Nos mesmos dez anos, os diretores da Americanas receberam mais de R$ 700 milhões de reais em salários, bônus e benefícios, alguns atrelados aos resultados da empresa, disse o Bradesco. Os executivos venderam ações da Americanas avaliadas em R$ 241 milhões no ano passado, segundo o processo.

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Em um documento separado, o BTG cita uma reestruturação na Americanas em meados de 2021, que diluiu Lemann, Sicupira e Telles para sua participação de 31% na empresa. Os três desistiram do controle sem pedir um prêmio, o que é incomum para eles, disse o BTG no processo de 14 de janeiro.

Os empresários - que fundaram o 3G Capital e investem na Americanas desde 1982 - são os três brasileiros mais ricos. Eles têm uma fortuna combinada de US$ 39,4 bilhões, de acordo com o Bloomberg Billionaires Index.

Eles disseram que nos últimos 20 anos a empresa foi dirigida por executivos altamente qualificados e que nem o auditor PwC nem os bancos envolvidos na revisão das demonstrações financeiras encontraram irregularidades.

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