Indefinição sobre gasto extra-teto de Lula gera cautela nos mercados

Para cobrir todas as promessas, o presidente eleito precisará de algo entre R$ 160 bilhões e R$ 200 bilhões em recursos adicionais

Lula precisa agir rápido para evitar interrupção nos pagamentos do programa de transferência de renda
Por Daniel Carvalho - Martha Beck
08 de Novembro, 2022 | 10:39 AM

Bloomberg — O presidente eleito do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva (PT) adiou na segunda-feira o tão esperado anúncio de um plano de gastos multibilionário para o próximo ano, enquanto sua equipe continua a discutir maneiras de pagar suas principais promessas de campanha.

Lula voltou a São Paulo no fim de semana depois de uma pequena pausa para acompanhar o processo. Mas depois de um longo dia de reuniões a portas fechadas na segunda-feira (7), uma entrevista coletiva marcada para o mesmo dia foi adiada para os próximos dias. O vice-presidente eleito Geraldo Alckmin (PSB), que também é responsável por coordenar a transição, retorna a Brasília, onde deve anunciar novos membros da equipe de transição.

Lula precisa agir rápido para evitar qualquer interrupção nos pagamentos do programa de transferência de renda. O atual presidente do Brasil, Jair Bolsonaro (PL), aumentou os pagamentos em dinheiro por meio de seu programa Auxilio Brasil de R$ 400 para R$ 600 por mês, mas reservou dinheiro para apenas R$ 400 no Orçamento do próximo ano. São necessários mais R$ 50 bilhões para manter o benefício no nível atual.

Mas Lula também prometeu aumentar as transferências de renda para famílias mais pobres com filhos menores de 6 anos, isentar mais pessoas do imposto de renda e aumentar o salário mínimo para R$ 1.320, acima da inflação. Para cobrir todas essas promessas, ele precisará de algo entre R$ 160 bilhões e R$ 200 bilhões em recursos adicionais, segundo pessoas a par do assunto ouvidas pela Bloomberg News.

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A ansiedade sobre o tamanho do plano de gastos de Lula, juntamente com as perguntas sobre quem ele indicará como ministro da Fazenda, pesou nos mercados locais na segunda-feira e mantém o ritmo de cautela ainda nesta terça-feira (8). O real brasileiro caiu 2% para 5,1621 por dólar, o pior desempenho entre as moedas de mercados emergentes, enquanto o índice de ações Ibovespa de referência perdeu 2,4%.

Rompendo o teto

Qualquer gasto extra exigirá a aprovação do Congresso, pois quebrará a principal regra fiscal do país - um teto constitucional que limita o crescimento dos gastos públicos à taxa de inflação do ano anterior. Embora os mercados já tenham precificado que o limite será quebrado, há preocupação com as finanças do governo e como as propostas serão negociadas com o Congresso.

Há duas opções principais sobre a mesa. A primeira é uma emenda constitucional que permite ao governo romper o limite. O projeto precisaria ser aprovado ainda em 2022, antes mesmo de Lula tomar posse.

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A alternativa seria Lula assinar uma medida provisória assim que tomar posse, permitindo ao Tesouro emitir um crédito extraordinário que não está sujeito à regra do teto de gastos apenas para manter o nível atual de doações em dinheiro. Outras promessas de campanha seriam negociadas posteriormente.

Uma medida provisória não exigiria aprovação imediata do Congresso, dando uma margem maior de tempo para Lula negociar com os parlamentares. Eventualmente, o novo governo terá que negociar com membros do Centrão, um grupo ideologicamente fluido de legisladores que geralmente apoiam o governo em troca de fundos para seus projetos.

“Uma emenda constitucional coloca a Câmara no poder”, disse o senador Renan Calheiros, aliado do presidente eleito, em entrevista.

Calheiros, que é adversário do presidente da Câmara, Arthur Lira, vem aconselhando Lula a emitir uma medida provisória. O senador eleito Wellington Dias (PT), responsável por Lula nas primeiras negociações com o Congresso, disse que todas as alternativas estão sendo discutidas, embora a mais favorável seja uma mudança na Constituição.

“Nossa prioridade é a emenda constitucional”, disse ele em mensagem de texto no sábado. “Mas também analisamos outras possibilidades que nos foram apresentadas.”

Embora as negociações ainda estejam em andamento, é provável que a equipe de Lula escolha uma proposta de emenda constitucional para os gastos extras em 2023, segundo o senador Marcelo Castro (MBD), relator do projeto de lei orçamentária de 2023. Segundo ele, a emenda constitucional daria mais segurança jurídica ao novo governo.

--Com a colaboração de Bárbara Nascimento e Maria Eloisa Capurro.

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