Fed terá que desacelerar a atividade, diz ex-economista-chefe do FMI

Olivier Blanchard afirma que a economia americana está sobreaquecida e que a demanda ainda não deu sinais de esfriamento

Ciclo de alta de juros será temporário e mundo deve voltar a conviver com taxas baixas
20 de Setembro, 2022 | 10:43 AM

Bloomberg Línea — O economista Olivier Blanchard tem uma visão diferente do consenso do mercado a respeito do trabalho do Federal Reserve, o banco central americano, para combater a inflação elevada. Blanchard, que foi economista-chefe do Fundo Monetário Internacional (FMI), acredita que o Fed terá de elevar a taxa básica de juros no país a um nível bem acima de 4% para fazer a inflação retroceder. Ou seja, para um patamar mais alto do que o esperado pela maioria dos economistas do mercado financeiro.

“A economia dos Estados Unidos está sobreaquecida. A demanda não vai retroceder e o Fed vai precisar aumentar os juros”, afirmou o economista nesta terça-feira, 20, durante apresentação por vídeo no evento MKBR22, promovido pela B3 e a Anbima.

Durante seu painel, Blanchard afirmou que a taxa de desemprego nos EUA, atualmente ao redor de 3,5%, está muito abaixo do nível de equilíbrio – o que seria algo em torno de 5%. Nessa situação, a demanda na economia americana continua aquecida e o Fed tem espaço para adotar uma política monetária mais agressiva para desacelerar a alta de preços.

Blanchard disse acreditar que os trabalhadores americanos hoje tem mais poder de barganha para negociar salários e o aumento dos rendimentos pode ser outra fonte de pressão para os preços, daí a necessidade de desacelerar a economia.

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Em relação à Europa, o economista afirmou que há condições de a demanda desacelerar por si só, justamente porque o poder de barganha dos trabalhadores é menor e a taxa de desemprego é mais alta. Além disso, a alta de preços na Europa tem sido muito mais alimentada pelos choques de preços de energia do que nos Estados Unidos.

Na visão de Blanchard, a inflação geral na Europa tem sido maior do que nos Estados Unidos, mas o núcleo da inflação, que desconsidera a variação preços mais voláteis como alimentos e energia, está numa situação mais controlada. Já nos Estados Unidos, a perspectiva é o contrário. A inflação geral está retrocedendo, mas o núcleo da inflação continua em patamar elevado, o que demonstra uma pressão inflacionária ainda forte.

“A desaceleração da economia vai ter que ser mais forte nos Estados Unidos. Já na Europa poderá ser menor”, afirmou Blanchard, que também é professor de economia no Massachusetts Institute of Technology (MIT) . “Se a demanda estiver forte, o Fed precisará usar o freio para desacelerar a economia.”

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Longo prazo

Olhando para o médio e longo prazo, o ex-economista-chefe do FMI acredita que ainda é possível que as taxas de juros voltem aos patamares baixos dos anos pré-pandemia. Ele afirma que as condições que permitiram os juros ficarem nesses níveis ainda estão presentes na economia mundial.

“Acho que ainda vamos voltar às taxas de juros baixas. O que estamos vendo hoje é um solavanco”, disse Blanchard. “As taxas devem subir por 5 ou 6 meses, mas acredito que vão retroceder depois.”

Blanchard é um dos principais economistas que defendem a tese de que, num ambiente de taxa de juros permanente baixas, o nível da dívida pública não deveria ser uma preocupação, uma vez que os governos não teriam dificuldades de se refinanciar. Na visão do economista, esse cenário deve voltar a se tornar realidade uma vez que a inflação esteja controlada.

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Filipe Serrano

É editor da Bloomberg Línea Brasil e jornalista especializado na cobertura de macroeconomia, negócios, internacional e tecnologia. Foi editor de economia no jornal O Estado de S. Paulo, e editor na Exame e na revista INFO, da Editora Abril. Tem pós-graduação em Relações Internacionais pela FGV-SP, e graduação em Jornalismo pela PUC-SP.