O crédito ao consumidor cresceu US$ 33,1 bilhões por mês nos últimos seis meses
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Bloomberg Opinion — Os americanos aumentaram seus saldos devedores a níveis recordes este ano. Os mais assustados afirmam que isso claramente mostra que as famílias estão com dificuldades devido à inflação mais alta desde o início da década de 1980 e não têm escolha a não ser contrair dívidas para pagar suas contas.

A realidade não é tão aterradora. As finanças dos consumidores estão, na verdade, muito próximas de seu melhor estado em toda a história, o que torna o endividamento um problema distante.

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É fácil entender as preocupações. Quatro dos maiores saltos mensais no crédito ao consumidor da história ocorreram este ano – os saldos devedores cresceram em cerca de US$ 33,1 bilhões por mês nos últimos seis meses, segundo dados do Federal Reserve. Apenas para fins de contexto, a média mensal em todo o ano de 2019 foi pouco menos da metade disso – US$ 15,4 bilhões. Os dados são chocantes, sim, mas há indícios de que eles estão dentro do normal.

Em primeiro lugar, tomemos o crédito rotativo. Essa forma de crédito foi tomada em massa no início da pandemia, quando consumidores tinham menos opções para gastar e acabaram usando suas economias e os auxílios do governo para quitar dívidas.

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Atualmente, os consumidores estão apenas correndo atrás do prejuízo enquanto os saldos devedores das linhas de crédito rotativo permanecem abaixo da média pré-pandemia. Se essa linha for cruzada, isso indicaria uma tensão induzida pela inflação. É claro que muitas famílias de baixa renda estão sofrendo com o aumento dos preços e estão sendo obrigadas a recorrer ao crédito. Mas não há sinais de um problema de endividamento no horizonte que possa afetar a economia.

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O crédito não rotativo é um caso diferente. Este é contraído em sua maioria para pagar pela mensalidade das instituições de ensino e pelo financiamento de veículos, mas também inclui financiamento de outros bens menos acessíveis, como barcos e trailers, cuja popularidade aumentou durante a pandemia.

Essa categoria teve uma expansão muito superior à média na pandemia; e o grande culpado, que soma 39% do crédito não rotativo e 30% do crédito ao consumidor são os automóveis. Esse posto é atribuído ao aumento extraordinário nos preços de veículos em 2021 e, de certa forma, o aumento no interesse por carros devido às questões de saúde pública. Muitas pessoas que antes utilizavam transporte público preferiram optar pelo distanciamento social proporcionado por um veículo.

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Em menor grau quando comparado aos automóveis, o verdadeiro líder do crescimento nos empréstimos foi a categoria “outros” dentro do crédito não rotativo, o que inclui os barcos mencionados. No início da pandemia, as comunidades costeiras testemunharam um salto no interesse em resposta às orientações de distanciamento social. Contudo, essa categoria é diminuta e não deve causar um amplo impacto.

Além disso, proprietários de barcos não costumam passar dificuldades financeiras, então não seriam os motivadores de uma crise estrutural. Se houvesse motivos para preocupações a partir dos dados de crédito ao consumidor, estes seriam provenientes do crédito não rotativo. No entanto, o crescimento do segmento atingiu seu auge no início do ano e já mostrou sinais de moderação no relatório mais recentes. O aumento mais recente foi o mais baixo desde janeiro.

Categoria "outros" foi a que teve o maior salto desde 2019dfd

Por fim, a proporção entre o pagamento de dívidas e a renda disponível das famílias está próxima de baixas históricas. Isso se deve às oportunidades de refinanciamento de dívidas a taxas mais baixas em 2020 e 2021 e ao pagamento de trilhões de dólares em auxílios do governo durante a pandemia de covid-19.

Por mais que a inflação seja um problema, proprietários que pagam hipotecas a taxas fixas, que representam a maioria dos empréstimos imobiliários, podem ter se beneficiado com o aumento dos salários ao mesmo tempo que seus maiores passivos continuaram os mesmos ou foram renegociados a taxas mais baixas. Somando as dívidas dos consumidores e os empréstimos imobiliários, o ônus total continua extremamente modesto.

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A proporção entre dívidas e renda disponível ainda é baixadfd

Nada disso significa que não há motivos para se preocupar. A economia passa por um momento em que as chances de uma recessão são elevadas devido, em parte, ao rápido aumento das taxas pelo Fed para domar a inflação, e muitos economistas projetam que o desemprego pode aumentar nesse processo. Inexistência de empregos significa inexistência de renda, e a proporção entre dívidas e renda, que atualmente parece baixa, pode aumentar rapidamente se o mercado de trabalho apresentar queda.

O grupo que mais sofreria seriam as famílias de baixa renda que gastaram suas economias para acompanhar a inflação. Porém, do ponto de vista sistêmico, as finanças das famílias parecem estar sólidas. Pelo menos por enquanto, o aumento do crédito não parece ameaçador.

Esta coluna não reflete necessariamente a opinião do conselho editorial ou da Bloomberg LP e de seus proprietários.

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Jonathan Levin trabalhou como jornalista da Bloomberg na América Latina e nos EUA, cobrindo finanças, mercados e fusões e aquisições. Mais recentemente, ele atuou como chefe da sucursal da empresa em Miami. Ele é analista financeiro certificado pelo CFA Institute.

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