Como funciona no Brasil o bilionário mercado de influenciadores digitais?

País tem mais de 500 mil influencers e alimenta de forma crescente negócios de redes como o Instagram e o TikTok e de agências especializadas

Gen Z
23 de Julho, 2022 | 07:44 AM

Bloomberg Línea — O Brasil se tornou um dos maiores mercados de marketing de influência do mundo. São mais de 500 mil influencers, segundo dados da Nielsen Media Research. O país também é aquele cuja população mais compra produtos a partir da recomendação de influenciadores, e isso pelo segundo ano consecutivo, de acordo com informações da plataforma de dados Statista.

O mercado global de marketing de influência foi estimado em US$ 13,8 bilhões em 2021, segundo o Influencer Marketing Hub, com crescimento da ordem de 40%. Cinco anos antes, o tamanho era de US$ 1,7 bilhão, o que dá a dimensão da velocidade da expansão.

Não há cálculos para o tamanho do mercado no Brasil, mas outras métricas atestam a dimensão desse segmento que não para de crescer. Mais de 40% da população é impactada pelas indicações dos influenciadores, o que faz o país superar a China, então líder de mercado. Ou seja, hoje o Brasil pode ser considerado o maior mercado, de acordo com a Global Consumer Survey.

Mas como quantificar um mercado tão dinâmico, em constante crescimento e relativamente novo? “Não é uma ciência exata”, diz Rafael Coca, COO (executivo-chefe de Operações) e fundador da Spark, uma agência que se autointitula “powerhouse de marketing de influência”. São 18.900 empresas que oferecem tais serviços no mundo, segundo a Influencer Marketing Hub.

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Entre as variáveis para chegar a uma precificação final, Coca explica que é preciso levar em consideração se o influencer trabalha exclusivamente para a marca, qual o volume de entregas (publicações), a relação que ele possui com a categoria (se é um expert na área), se as entregas serão físicas (feitas de forma presencial ou apenas online), além de poder de alcance e engajamento.

A Spark é um exemplo do crescimento desse mercado no Brasil. Coca afirma que a empresa cresceu 120% em 2021 em relação ao ano anterior e que o número de colaboradores triplicou. “Isso é um reflexo claro da movimentação do mercado”, diz.

Para Carlos Scappini, COO no Grupo Music 2/Mynd, agência especializada em música, cultura digital e entretenimento, as marcas já enxergam a transformação do mercado, embora ainda haja um caminho pela frente.

“O que as marcas não sabem entender ainda é o tamanho dessa indústria e dessa relevância”, diz o executivo. Ele define as redes sociais como uma “terceira onda” que vai muito além do online e do offline.

“Tive uma reunião recente com uma marca gigantesca que nunca trabalhou com influencers”, diz Scappini, que não citou nomes. Ele reiterou diversas vezes que “as relações são sigilosas” e sustentadas por contratos de confidencialidade.

No que diz respeito à Mynd, os números também atestam como empresas que se dedicam a esse mercado estão crescendo: em 2021, o faturamento foi de R$ 300 milhões, e a meta para este ano é chegar a R$ 550 milhões. A empresa, considerada a maior do Brasil em número de influencers agenciados, executa pelo menos 300 projetos por mês, com marcas dos mais variados segmentos.

Criador como ‘veículo’

A Mynd tem 400 agenciados, entre eles os influenciadores Gkay e Lucas Netto; as cantoras Luisa Sonza, Pablo Vittar e Elba Ramalho; e os ex-BBBs Thelminha e Gil do Vigor. Scappini diz que chegar a um valor final de um projeto é mais complexo do que as pessoas imaginam.

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Diferentes variáveis devem ser levadas em conta, segundo ele: desde o tempo que a empresa vai levar para pagar o projeto até o fato de o influencer possuir ou não afinidade com a marca.

Marcas que influenciadores têm mais dificuldade de aceitar, porque não vendem um produto usual, por exemplo, podem ter que pagar mais por uma campanha.”

O executivo também afirma que tudo o que já sai na mídia sobre cachês e cifras passa longe da realidade. “O que sabemos é que existem ordem de grandeza para determinados talentos. Já soube de influenciadores faturando R$ 10 milhões com uma única marca por ano”, conta.

Expectativa de faturamento é de R$ 550 milhões em 2022

Para Coca, da Spark, o creator (influenciador) é um veículo de comunicação. “É daí que nossa avaliação começa”, explica. Ele diz que não existem barreiras para o preço de uma campanha e que a agência tem projetos que partem de de R$ 100 mil. “Todas as marcas estão crescendo o investimento nesse tipo de projeto. Quanto estão dispostos a pagar? O céu é o limite”, diz.

A política da fatia que fica com cada parte varia de acordo com a empresa. No caso da Spark, Coca cita um projeto específico - também sem citar nomes - para o segundo semestre do ano, que terá dois grandes eventos como a Black Friday e a Copa do Mundo do Catar.

“Fechamos com marcas projetos que superam os R$ 10 milhões de verba, dos quais 30% pode ter ido para um único influenciador. Ou seja, nesse caso, o influencer fica com um total de R$ 3 milhões em um único projeto.”

O que falta olhar?

Um relatório recém-divulgado pela Meltwater apontou que, em 2021, 94% das quase 2 mil empresas analisadas optaram por campanhas com influencers no Instagram, 43% no Facebook, 13% no TikTok e 10% no YouTube. Ou seja: o TikTok passou o YouTube em campanha com influencers.

Para Coca, de fato, o TikTok “é a bola da vez”. Ele conta que, no Brasil, o Instagram é a plataforma que mais absorve investimento das marcas para projetos, também a mais popular e a que mais está no radar das marcas. Mas o poder do TikTok está crescendo, a tal ponto que é o aplicativo mais baixado pelo terceiro ano seguido na Apple Store em nível mundial.

Ele explica que o marketing de influência operava como algo marginal, mas que hoje já faz parte da estratégia e do orçamento da maioria das empresas. “Existem marcas que hoje reservam de 80% a 90% de seu budget para o marketing de influência”, afirma. Os números podem ser ainda maiores, segundo ele, se o mercado se desenvolver em tecnologia de dados. “Estamos em um mercado baseado em tecnologia. Quanto mais crescermos em conhecimento de dados, mais retorno teremos.”

Já Scappini chama a atenção para duas oportunidades para os quais, em sua avaliação, o mercado local ainda não despertou: a plataforma Kwai e o live commerce. Assim como o TikTok, o Kwai também é uma rede social chinesa, mas voltada para vídeos curtos. Por meio do livestream e-commerce, por sua vez, é possível vender online, ao vivo, com os produtos anunciados durante a transmissão.

“Essa estratégia ainda não representa 0,5% do seu potencial. Se as marcas não estão vendo isso, precisam prestar atenção”, finaliza.

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Melina Flynn

Melina Flynn é jornalista naturalizada brasileira, estudou Artes Cênicas e Comunicação Social, e passou por veículos como G1, RBS TV e TC, plataforma de inteligência de mercado, onde se especializou em política e economia, e hoje coordena a operação multimídia da Bloomberg Linea no Brasil.