CEO da Arezzo: recorde de vendas no 2º tri com força de influência digital

Alexandre Birman conta em entrevista à Bloomberg Línea como o grupo tem operado diante da pressão de custos e fala de aquisições e de abertura de lojas

Alexandre Birman, CEO da Arezzo: recursos do follow-on de R$ 830 milhões já estão sendo investidos
29 de Junho, 2022 | 09:45 AM

São Paulo — A inflação persistente tem impactado o poder de compra de uma parcela considerável da população, mas algumas empresas voltadas para o consumo estão conseguindo manter não só as vendas como as margens. É o caso da Arezzo&Co (ARZZ3), grupo - ou uma house of brands, como se diz no mercado - que reúne as marcas Arezzo, Schutz, Anacapri, Alexandre Birman, Reserva, Fiever, Alme e Vans, entre outras: a previsão é encerrar o segundo trimestre com novo recorde de vendas, segundo revelou o CEO da companhia, Alexandre Birman, em entrevista à Bloomberg Línea.

O CEO da Arezzo aponta o desempenho de vendas digitais, o controle dos custos e da cadeia de suprimentos, os frutos do maior investimento em logística e marketing e a expansão internacional das operações como pano de fundo do próximo resultado financeiro a ser divulgado.

“Estamos com um crescimento muito forte. Vamos encerrar o segundo trimestre com recorde de vendas. Um dos motivos é a venda influenciada. Não esperamos a cliente vir à loja. Levamos a loja até ela”, contou o executivo. A venda pelo WhatsApp responde por 38% do total.“Quando não há cliente na loja, elas fazem contato por WhatsApp. A produtidade das vendedoras cresceu absurdamente.

É uma equação que a permite apostar na abertura de novas lojas no segundo semestre e no avanço de sua agenda de M&A (fusão e aquisição) ao mesmo tempo em que reforça o foco na força de vendas impulsionadas por influenciadores digitais. Nos últimos meses, a Arezzo tem sido apontada no mercado como uma candidata a protagonizar a aquisição de alguma empresa do setor cujo valor de mercado está descontado no mercado diante da forte queda das ações com a alta dos juros.

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Birman, no entanto, trata como especulação as notícias de que a Arezzo mira comprar concorrentes diretos. O executivo diz que o objetivo é buscar aquisições complementares ao portfólio existente.

“Continuamos com uma forte expectativa para o ano, que está em um pace [ritmo] muito forte. Isso pode fortalecer a nossa agenda de M&A. Tudo depende se for o momento das marcas que consideramos interessantes para fazer parte do nosso portfólio versus o timing″, afirmou.

Entre os investimentos, ele destaca a abertura da maior loja da marca Carol Bassi na rua Oscar Freire, endereço badalado em São Paulo e, na frente de marketing, a contratação de Juliette Freire, vencedora do BBB (Big Brother Brasil) em 2021, como garota-propaganda da marca Anacapri. “Iremos abrir três grandes lojas da Carol Bassi no segundo semestre”, disse Birman sobre a marca da influenciadora voltada para o público de alta renda, que foi adquirida por R$ 180 milhões no ano passado.

Apesar dos resultados positivos, as ações estão em queda de 11% no ano, afetadas também pelo ambiente de inflação e juros elevados e de aversão a risco pelo investidor, segundo analistas. É um “combo” que derruba também as cotações de varejistas voltadas para o público de renda mais alta como o Grupo Soma (SOMA3, -26,39%) e a Renner (LREN3, -7,04%). O Ibovespa recua cerca de 4% no ano.

No primeiro trimestre, o grupo Arezzo reportou um lucro líquido ajustado de R$ 57,5 milhões (alta anual de 97%) e uma receita bruta consolidada de R$ 1,042 bilhão (aumento de 64%), com a margem bruta de 53,4% (crescimento de 3,4 pontos percentuais). As vendas digitais de janeiro a março deste ano alcançaram R$ 223 milhões, incremento de 43% em 12 meses.

Ao comentar a recomendação de compra da ação da Arezzo, feita pelo banco norte-americano Goldman Sachs após a divulgação do balanço, citando que a margem operacional veio acima das estimativas do mercado, o CEO disse que a receita para crescer sem sacrificar a lucratividade passa pela disciplina com as planilhas de custos, com os fornecedores e com a precificação de produtos. “Eu controlo a cadeia de suprimentos mesmo sem ter as fábricas. Esse é o grande diferencial”.

Confira os principais trechos da entrevista editada para maior clareza.

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Relatório do Goldman Sachs reiterou recomendação de compra para a ação da Arezzo e destacou o resultado no primeiro trimestre, principalmente o aumento de margem. Como crescer preservando margem em um cenário de juros e inflação em alta?

Já te adianto: estamos para fechar o segundo trimestre e os resultados serão ainda melhores. A empresa foi concebida e tem um processo constante de evolução que nos dá muita agilidade e um controle da cadeia de suprimentos, ao mesmo tempo em que nos dá uma flexibilidade.

Temos nosso modelo de negócios baseado no triplé: a criação de produtos, a valorização de marca e a gestão de nossos canais de distribuição. E nós temos uma das maiores fábricas de amostras de calçados do mundo. São mais de 20 mil metros quadrados e 600 pessoas trabalhando exclusivamente na nossa área de criação e no desenvolvimento de produtos.

Para todo produto da Arezzo, desenvolvemos o que chamamos de “software do calçado”, ou seja, todo o know-how de como produzir aquele produto, seja a forma em que é feito o sapato como a matriz do solado. Desenvolvemos todas as matéria-primas e ficamos proprietários desse know-how.

Hoje produzimos já 16% do que vendemos. A grande maioria é de fornecedores externos que recebem nossa encomenda. Eu controlo toda a forma como o produto é feito. Temos uma felicidade muito grande de encontrar fornecedores que vão estar aptos a produzir aquele produto. E eu negocio em grande quantidade as matéria-primas para todos os meus fornecedores. Com isso eu controlo a cadeia de suprimentos mesmo sem ter as fábricas. Esse é o grande diferencial.

O que mais contribui para elevar a margem de lucro?

Toda a nossa precificação nasce na criação do produto. Quando a equipe de design está criando o produto, há uma equipe que trabalha junto, chamada merchandising, que já faz uma avaliação baseada no valor percebido daquele produto, e se define o que nós chamamos de PVL (preço de venda na loja). Aí para você negociar o custo, o nosso markup [indicador que mede o quanto o preço do produto está acima do seu custo de produção e distribuição] é fixo.

Quando desenvolvemos um produto, estipulamos que ele tem de ser vendido na loja a R$ 390, por exemplo. Nós já temos um markup fixo, ou seja, quando a companhia negociar com um fornecedor, mostramos por que aquele calçado vai ser vendido a R$ 390, quanto vai custar de couro, de sola, quanto vai custar para fazer o corte e a costura e quanto vai ser a margem dele. Não tenho de ficar negociando preço.

Caso o preço não se adeque à proposta feita pelo merchandinsing, o que nós fazemos é trabalhar no processo em que o produto foi desenvolvido: eu posso tirar uma fivela, uma costura, troco a matéria-prima, faço uma reengenharia até que consiga chegar ao preço estabelecido pelo merchandising. Isso nos assegura as margens, nossa margem bruta. E dá uma simplicidade e transparência muito grande na cadeia. O franqueado, por sua vez, sabe também quanto o produto custou. Não tem guerra de preço.

Como atravessar este momento de inflação elevada?

Nós temos uma equipe de engenharia de produto e de suprimento que está buscando as melhores matérias-primas. Nosso produto pode usar vários tipos de matérias-primas, de couro, de material com solado e várias formas. Criamos milhares de modelos por ano.

Conseguimos por meio de grandes investimentos em marketing fortalecer ainda mais o valor das nossas marcas e ter alto crescimento de vendas.

Como estão as vendas digitais da companhia?

Desde o começo da pandemia, fortalecemos algo que já era muito presente na Arezzo, que é nosso e-commerce, que existe há mais de 12 anos. E nós fortalecemos a forma como as vendedoras entram em contato com as clientes sem esperar que venham até a loja. Durante os tempos mais árduos do lockdown, nós conseguimos manter uma média de 60% a 70% das vendas mesmo com as lojas fechadas.

As vendedoras usam um aplicativo que gera diariamente a lista de contatos, com base em quem tem aniversário no dia e se completaram 30 dias da última compra. E entram em contato com a cliente de uma forma muito pessoal. Não é um WhatsApp banal. Ela escreve o nome da pessoa, manda um produto que tem a ver com a cliente. Hoje 38% da venda é feita por meio de influência digital. Agora em 2022, com a reabertura das lojas e o retorno do fluxo, mantivemos as vendas digitais. Ou seja, aumentamos as vendas.

As vendedoras, além do trabalho clássico de atendimento e conversão das clientes que vão à loja, estão em contato por WhatsApp durante o tempo em que a loja está sem cliente. Ou seja, a produtividade cresceu absurdamente. Isso tudo fez com que a Arezzo&Co tivesse realmente vendas muito fortes.

No Investor Day, no fim do ano passado, a Arezzo destacava projetos para 2022, como a entrada de Reserva em vestuário feminino e a expansão das lojas da Vans. Como andam os projetos?

Eram iniciativas que já estavam em andamento e continuaram, principalmente a abertura de lojas da Vans e da Reserva. As marcas core - Arezzo, Schutz, Anacapri e Reserva - tiveram crescimento das vendas. Projetos que anunciamos no Investor’s Day são estruturantes e estamos em uma fase de início. Conseguimos já abrir duas lojas e lançar o novo e-commerce da Schutz de vestuário. Introduzimos em 18 lojas da Reserva um corner, que é uma área da loja com roupas para o público feminino.

Crescemos muito a marca Carol Bassi desde o anúncio da aquisição. Estamos na fase final de projetos. Iremos abrir três grandes lojas da Carol Bassi no segundo semestre. Estamos bem em linha com o que era a nossa previsão, atingindo resultados bastante acima de nossas metas.

Por que a Arezzo tem apostado no nicho dos brechós com a TROC?

Não é que estamos apostando em brechós. É um negócio novo, uma venda de moda inovadora, em que as pessoas colocam no mercado roupas do closet que não usam mais. Essa é a economia circular. Fizemos a aquisição de um percentual relevante da TROC no final de 2020. Estamos investindo cada vez mais. É um business que faz parte de nossa estratégia de venture capital, não é o nosso core business, mas um business de inovação, de growth, de criação de novas iniciativas. Estamos felizes de poder estar ajudando toda a economia circular, que tem um papel na sustentabilidade no futuro.

Recentemente, a Enjoei (ENJU3) desfez um negócio anunciado com a Gringa (brechó virtual de alta renda da influenciadora Fiorella Mattheis). Como a Arezzo vê esse nicho?

É o mesmo negócio: vender roupas usadas. Entretanto o modelo de negócios utilizado é bastante diferente. Dentro da TROC, fazemos a curadoria. Recebemos o produto de todas as clientes em nosso armazém, fazemos todo o processo de seleção baseado na qualidade e na higienização. Deixamos o produto como novo. Aquela que não tem condições, devolvemos para a cliente. Só a partir disso, os produtos estão disponíveis no site da TROC. Somos responsáveis pela qualidade e pela entrega.

Já o modelo da Enjoei é chamado de “peer to peer”: a pessoa quer vender o produto, disponibiliza no site e coloca o produto à venda. A compra é direta de um indíviduo, de um CPF. A Enjoei não se responsabiliza por ter visto o produto previamente e ter enviado.

Analistas têm destacado a expansão internacional da Arezzo. Como você avalia as previsões de risco de recessão nos EUA? Até que ponto isso impacta os planos?

O cenário externo é bastante desafiador. A nossa empresa continua a ter um crescimento fortíssimo na operação americana, a ganhar market share, principalmente pelo fato de nós termos produção própria. No caso da Schutz, 70% da produção é própria. Temos o domínio da produção.

A maioria das marcas com que competimos produz na China e teve sérios problemas de suprimento. A China ficou em lockdown recentemente, em full lockdown durante meses. As fábricas todas estão fechadas. Quem produz na China tem dificuldade muito grande de entrega, além das questões logísticas, os gargalos, o frete na China e nos Estados Unidos.

Nós tivemos a vantagem competitiva de conseguir ofertar o produto, além do fortalecimento das nossas marcas, Schutz, Alexandre Birmann e do nosso e-commerce. Consequentemente, tivemos crescimento forte das vendas. Até aqui não sentimos nenhuma diminuição na demanda. O resultado no segundo trimestre vai ser fortíssimo.

A Arezzo realizou uma oferta de ações de cerca de R$ 830 milhões no começo do ano e gerou expectativa de aquisições entre analistas. Há algo no curto prazo no radar?

Os analistas de sell side de bancos, que estão próximos da empresa e que oficialmente têm interações com nosso time, não escreveram absolutamente nada sobre isso. É o direito de imprensa. A pessoa pode especular da forma que ela acha interessante.

O nosso follow-on [oferta subsequente] foi com o objetivo de fortalecer o nosso crescimento, porque para crescer precisa de capital de giro. A empresa está crescendo mais de 60% ao ano. Temos um pipeline de lojas para abrir e estamos continuamente aumentando a abertura de lojas.

O follow-on não foi feito para o fim principal de aquisições. Foi feito principalmente para suportar o nosso capital de giro e o nosso investimento em lojas e também na infraestrutura da empresa, no que tange muito a área logística.

Já inauguramos o nosso centro de distribuição da Reserva. Triplicamos a área do centro de distribuição antigo. Inovamos em tecnologia e estamos construindo um centro de distribuição. Vamos iniciar 2023 com 65 mil metros quadrados na distribuição. Isso está consumindo bastante do nosso investimento.

Qual o objetivo da estratégia de M&A da companhia?

Nosso objetivo são aquisições complementares ao nosso portfólio, que já é riquíssimo. Já temos as maiores marcas de calçado feminino, temos uma grande marca internacional, que é a Vans. Temos a marca com maior relevância e maior market share no vestuário premium masculino, que é a Reserva.

Estamos iniciando de forma gradativa a nossa penetração no vestuário feminino. Fizemos aquisição de uma fábrica de bolsas [HG, anunciada em abril], categoria que corresponde a 20% das nossas vendas, e outra aquisição com foco na área de sourcing [Sunset, também em abril], pois hoje o maior desafio de todo setor da economia é a parte de suprimentos, é a escassez de matéria-prima e mão-de- obra.

Continuamos com a nossa agenda de M&A, que está em processo contínuo de avaliação de quais são realmente os bons ativos que possam ter no mercado.

Incertezas no cenário macroeconômico podem adiar essa agenda de M&A para 2023?

Pode ser até que os desafios que vamos enfrentar acelerem [a agenda de M&A], porque estamos com resultados realmente muito fortes. Independentemente dos desafios macroeconômicos e políticos que nosso país enfrenta, as perspectivas da companhia continuam muito boas para o segundo semestre. Nosso produto é motivado pelo desejo. Não é uma compra planejada, algo de que você precisa de grande capital ou fazer dívida para adquirir. Ou financiar. É uma compra emotiva.

Continuamos com uma forte expectativa para o ano, que está em um pace muito forte. Isso pode fortalecer a nossa agenda de M&A. Tudo depende se for o momento das marcas que achamos interessantes para fazer parte do nosso portfólio versus o timing. Em um M&A, não conseguimos planejar uma data, faz parte do processo constante de negociação. Não dá para precisar se vai ser no segundo semestre ou em 2023. A empresa tem uma área de M&A e está fazendo a diligência e análise dos ativos do mercado.

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Sérgio Ripardo

Jornalista brasileiro com mais de 25 anos de experiência, com passagem por sites de alcance nacional como Folha e R7, cobrindo indicadores econômicos, mercado financeiro e companhias abertas.