‘Governo não deveria subsidiar combustível da minha SUV’, diz ex-BC

Para Alexandre Schwartsman, proposta do governo de assumir perda de receita com ICMS beneficia quem não precisa e transfere inflação para 2023

Subsídio beneficia quem não precisa em vez de estar focado em beneficiar diretamente quem tem renda baixa
07 de Junho, 2022 | 04:34 PM

Bloomberg Línea — Ex-diretor de Assuntos Internacionais do Banco Central e ex-economista-chefe dos bancos ABN Amro e Santander (SANB11), o economista Alexandre Schwartsman é crítico da proposta do governo Jair Bolsonaro de tentar emplacar um subsídio estimado em R$ 40 bilhões para compensar Estados que zerarem o ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) dos combustíveis.

Segundo ele, além da questão fiscal e legislativa (o governo terá que aprovar uma nova proposta de emenda constitucional para abrir novamente espaço no teto de gastos), um subsídio irrestrito aos combustíveis – mesmo com duração limitada a 31 de dezembro deste ano – não faz sentido econômico porque parte do dinheiro vai beneficiar quem não deveria.

“Tenho uma Santa Fé [SUV da Hyundai], que, quando quer, faz cinco quilômetros com litro. Se isso passar, eu talvez pague mais barato pelo combustível até o final do ano, mas, convenhamos, o governo não deveria estar subsidiando o meu carro”, ironiza o economista, que hoje lidera a consultoria Schwartsman e Associados.

“Economicamente não faz nenhum sentido. Podiam arranjar uma maneira melhor de usar esses R$ 40 bilhões em vez de um subsídio geral para os combustíveis, como, por exemplo, destinar diretamente às famílias de baixa renda para comprar gás de cozinha.

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Um segundo aspecto importante e que, segundo ele, está sendo pouco discutido na proposta até agora é que, se prosperar, a medida do governo deve transferir a inflação deste ano – “um jogo já perdido no Brasil e no mundo” – para 2023.

Isso se dá, segundo ele, porque, em 1º de janeiro, dia seguinte ao fim dos subsídio aos Estados para cortarem o ICMS, a tributação voltará, os preços subirão e a inflação dará um novo salto.

“Definitivamente não é uma boa ideia porque mina a capacidade do Banco Central de atuar para combater a inflação. A expectativa de inflação alta [pelos agentes econômicos] vai durar mais tempo”, explica o economista.

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“Se houvesse as caixinhas do que faz sentido [nesse pacote proposto pelo governo], você não assinalaria a caixinha do fiscal, do monetário e da perspectiva de uma ajuda bem direcionada para pessoas de baixa renda. Faz sentido em uma única caixinha, a eleitoral, do ponto de vista do governo”, disse.

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Graciliano Rocha

Editor da Bloomberg Línea no Brasil. Jornalista formado pela UFMS. Foi correspondente internacional (2012-2015), cobriu Operação Lava Jato e foi um dos vencedores do Prêmio Petrobras de Jornalismo em 2018. É autor do livro "Irmã Dulce, a Santa dos Pobres" (Planeta), que figurou nas principais listas de best-sellers em 2019.