Rali de ações no Brasil e em outros emergentes enfrenta novos obstáculos

Cautela renovada de investidores reflete em parte preocupação com desaceleração do crescimento nos EUA e no mundo desenvolvido

Inflação persistente em patamares elevados e o aumento de juros para combatê-la é uma das preocupações de investidores
Por Farah Elbahrawy
06 de Junho, 2022 | 01:51 PM

Bloomberg — A recuperação em relação a cotações mínimas em dois anos nas ações de mercados emergentes vem perdendo força com a preocupação de que o Federal Reserve e outros formuladores de políticas globais não consigam orquestrar uma aterrissagem suave - um soft landing - para a economia.

“É muito cedo para dizer que estamos no fundo do poço e muito cedo para dizer que o único caminho é a recuperação“, disse Wei Li, estrategista chefe global de investimentos da BlackRock (BLK), maior gestora do mundo. “Precisamos de uma guinada dovish do Fed” antes de voltarmos a comprar na baixa, disse.

O MSCI Emerging Markets Index recuperou cerca de 8% desde que caiu para uma mínima de dois anos em 12 de maio, registrando um ganho no mês passado após a mais longa série de perdas mensais em quatro anos. Contudo, até agora, em junho, o indicador está novamente atrás de seus pares de mercado desenvolvidos.

O presidente do Fed, Jerome Powell, advertiu no mês passado que os Estados Unidos continuarão aumentando as taxas de juros até que haja uma evidência “clara e convincente” de que a inflação está recuando. O CPI, Índice de Preços ao Consumidor, avançou 8,3% na taxa anualizada em abril.

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Sua posição foi apoiada na sexta-feira (3) por dados americanos melhores que o esperado, que sinalizaram algum otimismo econômico mesmo com a redução do auxílio monetário. Ainda assim, as preocupações com a perspectiva econômica do mundo afetam os valuations das ações dos mercados emergentes.

O State Street Global Markets afirmou que um maior rali das ações dos mercados em desenvolvimento pode não ocorrer neste ano, ao passo que o Goldman Sachs (GS) defende que o foco do investidor está nos riscos do crescimento, pois os bancos centrais tentam apaziguar os altos preços.

As ações de mercados emergentes  ficaram positivas em maio após maiores perdas desde 2018

O indicador MSCI caiu quase 14% neste ano, aproximadamente em linha com os retornos em dólar do índice Stoxx Europe 600 e do S&P 500 (SPX). As ações de mercados emergentes avançaram em maio com as notícias da China, que abrandou suas restrições contra a covid e avançou em direção à paz com as empresas de tecnologia, bem como com a entrada de capital direcionado às empresas mais seguras e menos voláteis - no Brasil, o movimento beneficiou ações como a da Vale (VALE3) e de bancos.

O ETF iShares MSCI Emerging Markets Minimum Volatility Factor atraiu US$ 2,4 bilhões em recursos no mês passado – um recorde. Mas o maior fundo passivo negociado em bolsa dos EUA que monitora o índice MSCI EM perdeu US$ 474 milhões em maio – seu quarto mês de saídas neste ano.

Mais vulneráveis

Os países em desenvolvimento, nos quais os consumidores normalmente dispõem de menos renda e são mais afetados pelo aumento dos preços, estão lutando contra ventos contrários do aumento dos custos de energia e de commodities, por problemas na cadeia de suprimento, bem como pelo crescimento mais lento no mundo desenvolvido. Isto está piorando as perspectivas de ganhos das empresas, principalmente varejistas e fabricantes de produtos básicos voltados para o consumidor.

“As empresas discricionárias sofrem pressão na margem devido a custos mais altos de insumos e crescimento mais lento se tentarem repassar preços mais altos a consumidores já pressionados [pela inflação]”, disse Daniel Grana, gestor de carteira da Janus Henderson Investors em Boston. “Isso é especialmente verdadeiro para setores de bens de consumo nos países importadores de commodities”, pois os exportadores de matérias-primas se beneficiam de preços mais altos, disse ele.

As leituras de preços ao consumidor da China, do Egito e do México nesta semana deverão oferecer uma melhor visão de como a inflação ficou arraigada nos países em desenvolvimento, potencialmente acumulando mais pressão sobre os banqueiros centrais para agir decisivamente e reduzir o aumento dos preços sem derrubar o crescimento.

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“Como todos os ativos de risco, as ações dos mercados emergentes estão enfrentando um ‘caminho limitado’ com os formuladores de políticas com o objetivo de orquestrar uma aterrissagem suave”, disse o estrategista da Goldman Sachs, Caesar Maasry. “Melhorar os dados inflacionários certamente tiraria a pressão dos mercados acionários, mas os riscos de crescimento ainda estão em foco”.

Perspectivas futuras

Há algumas perspectivas animadoras de longo prazo em ações de emergentes, “mas não será no segundo semestre”, disse Daniel Gerard, estrategista sênior de multimercado da State Street Global Markets. “Precisamos ver o impacto do aperto quantitativo” e “sentir que a inflação está sob controle”, disse ele, em referência à redução do balanço do Fed, que retira liquidez dos mercados.

Exportadores de commodities vêm levando a melhor

Gerard aposta que a América Latina continuará sendo a região emergente mais atrativa devido à sua exposição a materiais básicos e commodities, bem como a setores defensivos como o de telecomunicações. O índice MSCI Emerging Markets Latin America subiu cerca de 15% neste ano, e as ações brasileiras deram retorno de 23%.

Confira outros pontos a serem monitorados nos mercados emergentes nesta semana:

  • A Rússia provavelmente reduzirá as taxas de juros em 100 pontos base, já que os formuladores de políticas públicas estão focando na força da taxa de câmbio e no amortecimento do impacto na economia;
  • Os PMIs (Índices de Gerentes de Compra, na sigla em inglês) da China para maio sugeriram que a economia está saindo do seu pior momento; uma barragem de dados na próxima semana provavelmente trará mais indicações de que a recuperação será difícil;
  • No Chile, o banco central espera aumentar sua taxa de juros de referência em 75 pontos base, chegando a 9% na quinta-feira (9); seu relatório trimestral de política monetária provavelmente indicará aumentos adicionais e uma perspectiva mais desafiadora;
  • No Brasil, a semana trará a inflação de maio (pelo IPCA, do IBGE), que pode apresentar uma ligeira desaceleração nos preços ao consumidor, e as vendas no varejo de abril.

--Com a colaboração de Maria Elena Vizcaino, Sydney Maki, Lilian Karunungan e Nicholas Reynolds.

--Este texto foi traduzido por Bianca Carlos, localization specialist da Bloomberg Línea.

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