Fundos ESG recebem ‘alerta brutal’ sobre títulos russos

Fundos ESG detêm cerca de US$ 800 milhões em títulos emitidos pelo governo de Vladimir Putin com vencimento nesta semana

"É inaceitável que os títulos soberanos russos sejam listados em fundos ESG"
Por Frances Schwartzkopff
16 de Março, 2022 | 06:22 PM

Bloomberg — Parte dos cerca de US$ 40 bilhões de dívida russa em moeda estrangeira agora em risco de inadimplência é detida por um grupo de fundos ESG criados para investir nos chamados ativos sustentáveis.

Os fundos do Artigo 8 – uma categoria sob as regras de investimento ambiental, social e de governança da Europa – detêm cerca de US$ 800 milhões em títulos emitidos pelo governo de Vladimir Putin que têm um pagamento de cupom com vencimento nesta semana, segundo dados compilados pela Bloomberg.

O valor atual dos títulos provavelmente será apenas uma fração dos valores relatados, sem um roteiro claro de como os investidores serão reembolsados. Como outros credores que financiaram o governo de Putin, que agora está com 21 dias de guerra contra a Ucrânia, os fundos do ESG enfrentam perdas profundas e um processo legal moroso à medida que os mercados de dívida entram em território desconhecido.

Embora os fundos ESG representem uma pequena parte do total, eles ainda ajudaram a “financiar a construção de um baú de guerra na Rússia desde 2014″, disse Sasja Beslik, autora de “Where the Money Tree Grows” e ex-chefe de finanças sustentáveis no Bank J Safra Sarasin, que foi recentemente contratada pelo fundo de pensão PFA da Dinamarca.

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É “um alerta brutal”, disse ela.

Dados da Bloomberg:

A análise da Bloomberg examinou os títulos russos em moeda estrangeira com vencimento em 2025, 2027, 2029, 2032, 2035 e 2036. A pesquisa inclui títulos soberanos em dólares da Rússia que se enquadram nas regras do Regulamento S - para títulos vendidos fora dos Estados Unidos - e participações de fundos passivos, incluindo fundos negociados em bolsa. Para ETFs que rastreiam índices de títulos, há pouca ou nenhuma escolha sobre o que os fundos compram ou vendem.

Também vale a pena notar que os dados da Bloomberg não incluem todas as participações de investidores que não são obrigados a divulgar suas transações de dívida.

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Se houver um calote nas obrigações externas da Rússia, seria a primeira vez desde que os bolcheviques se recusaram a pagar ou reconhecer as dívidas do czar, há mais de um século.

As participações em títulos russos são o exemplo mais recente de investidores ESG que possuem ativos que parecem colidir com o rótulo. Dados da Bloomberg mostram que os fundos ESG detinham pelo menos US$ 8,3 bilhões em ativos russos antes da guerra, incluindo participações em empresas estatais como a Gazprom, a Rosneft e o Sberbank, além de títulos do governo.

“À luz dos eventos atuais, é claramente inaceitável que os títulos soberanos russos sejam listados em fundos ESG”, Peter Uhlenbruch, diretor interino de padrões do setor financeiro da ShareAction, uma organização sem fins lucrativos com sede em Londres, que defende o investimento responsável. “Dado que a Rússia já estava sob sanções internacionais por sua anexação da Crimeia, certamente é legítimo perguntar por que esses títulos estavam em fundos ESG em primeiro lugar.”

O governo de Putin disse que toda a sua dívida será paga. Mas também disse que os investidores de países que apoiam as sanções à Rússia serão pagos em rublos. Se a Rússia não pagar – ou tentar pagar títulos em moeda estrangeira em rublos, o que pode ser tratado como inadimplência – as consequências atingirão não apenas o mercado de títulos soberanos do país, mas potencialmente todos os seus emissores corporativos. O choque total provavelmente afetará um montante de dívida russa de cerca de US$ 150 bilhões.

“Todo mundo no Ocidente – instituições financeiras, empresas, políticos – previu e supôs que nós e a Rússia arriscamos a própria pele juntos, dado o pacto econômico do mercado”, disse Beslik. “Agora acontece que a Rússia quebrou esse pacto... e as instituições financeiras, bem como as empresas, vão ter que pagar caro por esse passeio, enquanto na Ucrânia, seus cidadãos estão pagando com a própria vida.”

– Com a colaboração de Amine Haddaoui.

– Esta notícia foi traduzida por Marcelle Castro, localization specialist da Bloomberg Línea.

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