Os legisladores da cidade de Nova York aprovaram um conjunto de regras com o objetivo de melhorar as condições de trabalho e de remuneração para os trabalhadores de aplicativos de delivery, tornando-se uma das primeiras cidades nos EUA a regulamentar significativamente o setor de entrega de alimentos dominado por DoorDash Inc., Grubhub e Uber Technologies Inc.
As medidas podem exigir com que os restaurantes concedam aos entregadores acesso aos banheiros, estabeleçam um pagamento mínimo por viagem e garantam o recebimento de gorjetas inteiras, além de permitir com que estabeleçam limites em suas rotas de delivery. Os aplicativos também serão obrigados a remunerá-los pelo menos uma vez por semana, incluindo opções que não exijam uma conta bancária, e ainda proíbem a cobrança de taxas dos trabalhadores para receber o pagamento.
A proposta de legislação é um dos esforços mais abrangentes nos EUA para regulamentar a indústria de delivery depois que o boom induzido pela pandemia na entrega de alimentos expôs vulnerabilidades para restaurantes e trabalhadores que mantêm os aplicativos funcionando.
A dicotomia entrou em foco no mês passado, depois que as tempestades torrenciais do furacão Ida desencadearam inundações históricas e mortais em Nova York. Imagens de entregadores trabalhando em meio ao aguaceiro, e nem sempre recebendo os melhores salários, geraram indignação.
“Os entregadores trabalharam incansavelmente durante esta pandemia, arriscando suas vidas, seus meios de subsistência”, disse a vereadora Carlina Rivera, uma das principais patrocinadoras dos projetos de lei. “Eles sustentaram quase que sozinhos a nossa indústria de restaurantes. Todos nós vimos aquelas fotos com água na altura da cintura que eles percorriam para levar comida e remédios para as pessoas “.
Na cidade de Nova York, cerca de 65 mil entregadores de alimentos foram considerados trabalhadores essenciais durante a pandemia de Covid-19. Esses trabalhadores, classificados como contratados independentes, não têm acesso a benefícios como salário mínimo ou horas extras, o que levou a uma pressão dos defensores do segmento para reforçar as proteções no último ano.
Mas o escrutínio das plataformas online também se intensificou em todo o país. Em agosto, Chicago processou o Grubhub, que é propriedade da Just Eat Takeaway.com NV, de Amsterdã, e o DoorDash por taxas “enganosas” e listas de restaurantes em aplicativos sem sua permissão. Os legisladores da Califórnia aprovaram um projeto de lei exigindo que as empresas de entrega de refeições divulguem aos clientes taxas e comissões de terceiros e quanto os restaurantes ganham com seus pedidos.
As empresas de delivery começaram a reagir, para defender seus modelos de negócios que dependem desses trabalhadores. As empresas de aplicativos endossaram a oferta de benefícios básicos em troca da flexibilidade dos demais contratados, mas não dos direitos totais de um funcionário.
Essa dinâmica ocorreu na Califórnia com uma iniciativa eleitoral de US$ 220 milhões, a Proposta 22, que deu aos esses trabalhadores acesso a certos benefícios, como auxílio-saúde e piso de salário mínimo. As empresas estão apoiando um esforço semelhante em Massachusetts.
“Muitos deles, não todos, não os tratam com o respeito que esses trabalhadores merecem”, disse Rivera sobre as empresas, acrescentando que o pagamento por hora média costuma ser menor do que o salário mínimo. “Essa vitória vai para todos os trabalhadores lá fora.”
Senso comum
DoorDash e Grubhub processaram San Francisco, e UberEats juntou-se aos outros dois em um processo contra Nova York depois que as cidades impuseram um limite permanente nas comissões que as plataformas podem cobrar de restaurantes, chamando a legislação de “inconstitucional, prejudicial e desnecessária”.
As novas regras têm uma medida de apoio de pelo menos algumas das empresas de entrega, no entanto, incluindo Grubhub e DoorDash. O Uber não respondeu a um pedido de comentário.
“Essas propostas são medidas de bom senso para apoiar os entregadores que trabalham duro todos os dias para os restaurantes e residentes de Nova York”, de acordo com um comunicado de Grant Klinzman, porta-voz do Grubhub. “Garantir que eles recebam um salário mínimo e tenham acesso a banheiros não é apenas uma boa ideia - é a coisa certa a se fazer.”
Os trabalhadores de delivery disseram que planejavam se reunir do lado de fora da prefeitura na quinta-feira em apoio aos projetos, semelhante a outras manifestações realizadas este ano lideradas por um grupo de defesa de base “Los Deliveristas”, que defendeu melhores condições de trabalho para os trabalhadores de entrega de aplicativos.
“Reconhecemos os desafios únicos enfrentados pelos trabalhadores de entrega na cidade de Nova York e compartilhamos o objetivo de identificar políticas que ajudarão a Dashers e trabalhadores como eles”, disse o porta-voz da DoorDash, Campbell Millum. “Continuaremos a trabalhar com todas as partes interessadas, incluindo a Câmara Municipal, para identificar maneiras de apoiar todos os trabalhadores de entrega na cidade de Nova York, sem consequências indesejadas.”
Pandemia

A pandemia Covid-19 levou muitos nova-iorquinos desempregados a recorrer a serviços de entrega por meio de aplicativos, que aumentaram de popularidade com o fechamento de restaurantes em toda a cidade. Um estudo da Universidade Cornell disse que 75% dos entregadores se juntaram à indústria porque perderam o trabalho durante a pandemia.
Depois de contabilizar as despesas, o salário médio por hora para entregadores na cidade de Nova York é de US$ 7,94, excluindo gorjetas, de acordo com o relatório realizado pelo Worker’s Justice Project em parceria com a Escola de Relações Industriais e Trabalhistas de Cornell. O salário mínimo em Nova York é de US$ 15 por hora para funcionários. Os dados do estudo também mostram que 65% dos entregadores entrevistados tiveram o acesso negado ao banheiro do restaurante.
“Sentimos que estamos em um terreno jurídico sólido”, disse o presidente da Câmara Corey Johnson. “Não me surpreenderia se algumas das grandes corporações multibilionárias que estavam ganhando muito dinheiro na cidade de Nova York tentassem impedir isso, mas diante disso, minha esperança é que outras cidades ajam e se juntem à cidade de Nova York na promulgação de proteções para funcionários de delivery“.
Os esforços para lutar por proteções básicas para os trabalhadores do segmento podem ser replicados em outras localidades, disse Erin Hatton, professora de sociologia da Universidade de Buffalo, que estuda os movimentos trabalhistas. Ela disse que a cidade de Nova York está mais adiantada do que as outras, e a pressão por direitos básicos que ajudam os trabalhadores é uma coisa boa de se replicar, mas a luta expõe questões mais amplas com classificação incorreta.
“As localidades têm que lutar por proteções muito modestas”, disse Hatton. “Mas esse tipo de esforço está respondendo ao setor e às suas necessidades particulares, que o emprego básico não cobre. A legislação trabalhista precisa ser atualizada para responder ao século XXI. Tenho receio de que os trabalhadores tenham que se organizar repetidamente para atender às necessidades mais básicas, como ir ao banheiro no trabalho “.
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