Bloomberg Opinion — O mundo não é mais dos homens. Há mais de uma década, especialistas especulam sobre o fim da dominância dos homens. Após séculos dominando a economia, a maior parte do crescimento das vagas de emprego ocorre em setores tradicionalmente protagonizados por mulheres. Esses empregos exigem mais educação. Os dados mais recentes indicam que as mulheres dominam os índices de matrícula nas faculdades. Em alguns anos, para cada homem, duas mulheres terão diploma.
Por um lado, é bastante tentador comemorar o fato. As mulheres ficaram de fora da força de trabalho durante décadas e ainda ganham menos. E vale a pena observar que os homens ainda são bem representados nas áreas de ensino superior em ciências, tecnologia, engenharia e matemática, cujos empregos tendem a ter melhor remuneração. Mas na economia, para que um lado ganhe, o outro lado não precisa perder – ter uma grande parcela de homens defasada não ajuda ninguém. Homens com perspectivas de renda mais baixas e menos escolaridade têm menos probabilidade de se casar. Para piorar a situação, vir de uma família monoparental diminui as chances de um menino ir para a faculdade (o impacto de pais solteiros sobre meninas não é tão profundo), criando um ciclo vicioso de monoparentalidade que gera mais homens que não vão para a faculdade.
Existem muitos motivos além da estrutura familiar que explicam por que os homens não estão cursando o ensino superior. Alguns rapazes não enxergam o valor em assumir muitas dívidas para aprender conceitos esotéricos que não estão diretamente relacionados a um trabalho. Na verdade, algumas escolas não oferecem um bom valor. Derek Thompson, da revista The Atlantic, argumenta que rapazes tendem a ter mais problemas na escola, então não é nenhuma surpresa que não desejem seguir com o aprendizado. Ele também aponta uma pesquisa que sugere que os meninos têm menos capacidade de adiar a gratificação.
Esse é um problemão. A economia está evoluindo e o ensino superior está se tornando um pré-requisito para uma vida estável de classe média. Existem enormes disparidades de riqueza entre as pessoas que vão para a faculdade e as que não trilham esse caminho. Podemos ver os impactos dessa tendência de longa duração. Homens com menos escolaridade não estão apenas em empregos que pagam menos – muitos também não estão trabalhando. Em 1992, cerca de 72% dos homens formados apenas no ensino médio com mais de 25 anos estavam empregados. Pouco antes da pandemia, apenas 64% tinham emprego, e a situação só piorou nos últimos 18 meses: no último trimestre, apenas 61% dos homens com ensino médio estavam empregados. Cada recessão retira os homens da força de trabalho, e eles não retornam.
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Isso não é apenas devastador econômica e socialmente, mas também afeta a saúde. O livro Deaths of Despair and the Future of Capitalism, de Anne Case e Angus Deaton, que fala sobre o futuro do capitalismo, estima que pessoas sem diploma universitário são mais propensas ao vício em drogas, suicídio e morte precoce.
Mudanças na tecnologia e no comércio significam que a economia evoluiu e chegou a um ponto em que a maior parte do crescimento de vagas de emprego está nos trabalhos tradicionalmente dominados por mulheres, como na área de cuidados e educação, e muitos dos melhores empregos nessas áreas exigem algum de ensino superior. Vemos as mulheres dominando em todos os níveis nessas áreas; há mais mulheres do que homens na faculdade de medicina e obtendo PhD. Conforme as mulheres assumem as indústrias com o crescimento mais rápido, parece inevitável que uma população de homens que não vão para a faculdade corra o risco de ficar permanentemente em uma classe mais baixa.
Contudo, os homens já tiveram dificuldades no mercado de trabalho antes. De acordo com Joel Mokyr, historiador econômico da Northwestern University, antes da industrialização a maioria das pessoas eram fazendeiros e artesãos independentes – geralmente alfaiates e ourives. Eles trabalhavam em casa e definiam seus próprios horários. Quando os empregos migraram para fábricas em cidades maiores, os homens tiveram dificuldade em se acostumar a receber ordens. No início, as fábricas contratavam mulheres e crianças porque eram mais complacentes e mais adequadas à estrutura da economia industrial. Um dos motivos da escolaridade universal era condicionar os meninos a um dia serem operários fabris que pudessem receber orientações de um chefe e cumprir um cronograma.
Isso sugere que os homens também podem se adaptar a essa economia. De fato, a última adaptação que os homens precisaram fazer levou quase 100 anos e causou muitos conflitos sociais, mas é possível acelerar esse processo. Em primeiro lugar, prosperar na nova economia significa aceitar a mudança, em vez de combatê-la. Isso envolverá, de certa forma, voltar ao modelo de trabalhador independente que existia antes da industrialização. Os empregos fabris sindicalizados e bem pagos que exigem apenas um diploma de ensino médio não estão voltando ao mainstream, e os esforços para restaurar a velha economia com reshoring – nome dado ao processo de retornar as fábricas ao país de origem da empresa – ou programas governamentais de capacitação não ajudarão os homens – isso apenas os mantém presos no passado.
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Em vez disso, precisamos permitir uma economia mais dinâmica que permita o trabalho independente, incluindo com o fornecimento de benefícios a trabalhadores autônomos e a redução do número de contratos de não concorrência e requisitos de licenciamento desnecessários. Essas medidas capacitariam homens sem diplomas universitários a buscar trabalho em uma economia moderna, sem restrições e em seus próprios termos.
Também podemos oferecer mais opções de educação que pareçam mais relevantes e ofereçam valor imediato. O plano de orçamento atual do governo Biden oferece cursos técnicos gratuitos. No entanto, nos Estados Unidos, os cursos técnicos não tem um grande histórico de preparação de pessoas para o trabalho, majoritariamente por terem sido criados principalmente para preparar as pessoas para a graduação em vez de empregos. Uma solução melhor implicaria mais estágios, programas de emprego e revitalização das escolas técnicas de ensino médio.
Além disso, o mais importante é respeitar todos os empregos e deixar de lado o discurso elitista que presume que algum trabalho é inútil ou que alguns empregos são de menos prestígio por não exigir diploma universitário. Afinal, nos EUA, um bom encanador costuma ganhar mais do que um advogado comum. O fato de haver mais mulheres na faculdade pode não sinalizar o fim para os homens tanto quanto sinaliza uma economia em transição, na qual alguns homens vão se atrapalhar e outros vão encontrar uma maneira de se adaptar e prosperar.
Esta coluna não reflete necessariamente a opinião do conselho editorial ou da Bloomberg LP e de seus proprietários.
Allison Schrager é colunista da Bloomberg Opinion. É pesquisadora sênior do Manhattan Institute e autora de An Economist Walks Into a Brothel: And Other Unexpected Places to Understand Risk.
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