Bloomberg — O pedido da Gol Linhas Aéreas para uma reestruturação no Chapter 11 dos Estados Unidos é o mais novo capítulo de uma série espetacular de crises de empresas de aviação latino-americanas, o que mostra que a indústria continua a lutar com o impacto financeiro persistente da pandemia mesmo depois do seu fim.
A Gol (GOLL4) informou na quinta-feira (25) que pretende continuar operando enquanto passa por uma recuperação judicial que inclui a renegociação de obrigações financeiras de curto prazo, como a de contratos com empresas de arrendamento de aeronaves.
A empresa disse que emergirá do processo com a estrutura de capital que considera correta.
A companhia aérea, que tinha um terço da participação de mercado doméstico do Brasil no final do ano passado, tem lutado para recuperar sua posição financeira desde a pandemia de covid, que devastou a demanda por viagens, obrigou as empresas a deixar suas frotas em terra e custou à indústria cerca de US$ 21 bilhões.
A Gol solicitou proteção contra credores nos EUA mais cedo do que o planejado depois que a notícia do pedido de insolvência vazou para a imprensa, disse um advogado da companhia aérea em uma audiência judicial por meio de vídeo na sexta-feira (26). Para evitar que os credores adotem medidas que possam prejudicar seus ativos, a administração buscou proteção judicial em Nova York.
Três das maiores companhias aéreas da região - Avianca Holdings, Latam Airlines e Grupo Aeroméxico - solicitaram proteção contra credores em 2020 em processos que se arrastariam por anos. Nos três anos seguintes, operadoras menores como a Interjet, do México, e a Viva Air, da Colômbia, encerrariam as operações.
“A volatilidade do setor é maior no Brasil, dada a exposição aos custos em dólares, e a América Latina como um todo tende a sofrer mais em um ambiente de alta inflação e taxas, afetando a renda disponível e a demanda por voos”, disse Carolina Chimenti, analista de crédito da Moody's Investors Service. “As companhias aéreas da região devem ser mais conservadoras com seu capital.”
A demanda por voos se recuperou em grande parte para os níveis pré-pandemia em toda a América Latina, mas a Gol nunca conseguiu superar as consequências financeiras.
Diferentemente de seus pares nos Estados Unidos e na Europa, a Gol e suas empresas brasileiras não receberam resgates. Somente mais recentemente o governo brasileiro começou a considerar empréstimos como parte do plano para aliviar a pressão financeira das companhias aéreas locais.
A pressão levou a Gol a realizar mais de dez processos de gestão de passivos ou captação de recursos desde o início de 2020. A empresa informou que sua dívida consolidada em 31 de dezembro era de cerca de US$ 4,2 bilhões, incluindo obrigações de arrendamento.
A suspensão temporária da operação de aeronaves Boeing 737 Max 8 e as condições de crédito globais restritas foram alguns dos fatores que levaram ao pedido de concordata, segundo uma autoridade de reestruturação da Gol, Joseph Bliley.
Mas o maior problema foi o impacto financeiro duradouro da pandemia. No auge da emergência, a Gol operava menos de 50 voos diários, uma redução de 90% em relação à sua malha normal.
“O componente mais significativo dos choques econômicos que resultaram na crise de liquidez atual dos devedores foi a pandemia de covid”, escreveu ele em uma declaração ao tribunal de Nova York.
A queda da Gol também mostra a diferença de caminhos na indústria aérea latino-americana desde a pandemia. Avianca, Latam e Aeroméxico têm apresentado números financeiros robustos e conquistado investidores desde que emergiram do processo do Capítulo 11.
Os títulos do trio tiveram um ganho médio de 21% no último ano, um dos melhores desempenhos em dívida corporativa da região no período, de acordo com dados compilados pela Bloomberg.
![Bonds da Gol despencam diante de crescentes dificuldades financeiras da companhia aérea Bonds da Gol despencam diante de crescentes dificuldades financeiras da companhia aérea](https://www.bloomberglinea.com/resizer/v2/3ZSNR6ZANVHEDCPA2ZDB2L2DFU.jpeg?auth=b342c243b11230531aafbb3da5a66226d3ea947f9ff2e8d59df9c7b7bd84d133&width=1000&height=562&quality=80&smart=true)
As notas da Gol, no entanto, caíram para níveis que refletem profunda angústia. A Lucror Analytics estima que o valor de recuperação para notas de dólar não garantidas com vencimento em 2025 está entre 15% e 20% - aproximadamente o mesmo nível atual.
As ações da empresa despencaram até 14,4% na sexta-feira, com expectativas de que os acionistas sejam amplamente eliminados como parte do processo do Chapter 11.
O CEO da Gol, Celso Ferrer, disse na quinta-feira que espera que o processo seja mais curto do que foi para os concorrentes, pois não há mais restrições relacionadas à pandemia e a demanda voltou.
Os pedidos de quatro companhias aéreas no Chapter 11 na América Latina estão “em grande parte relacionados à pandemia de Covid e à enorme interrupção que ela causou para a indústria”, disse Amalia Bulacios, diretora da S&P Global Ratings.
“Isso não reflete riscos de viabilidade para o setor”, acrescentou, observando que essas companhias aéreas continuaram a operar normalmente enquanto reestruturavam suas dívidas e nenhuma faliu.
A última reestruturação pode abrir caminho para possíveis fusões, segundo alguns analistas.
Uma aquisição da Gol pela concorrente Azul (AZUL4), seguida de parceria com a Abra - a empresa controladora da Gol e da Avianca da Colômbia, formada em 2022 na tentativa de melhorar os custos - poderia ser “uma proposta intrigante”, de acordo com uma analista da Raymond James, Savanthi Syth.
“Devido à menor sobreposição de malhas, acreditamos que tal aquisição poderia passar pelo escrutínio regulatório.”
Um representante da Azul se recusou a comentar, enquanto o Grupo Abra não respondeu imediatamente.
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