O médico tem uma carreira longa. A Afya construiu um ecossistema para atendê-lo

O CEO Virgílio Gibbon e o CFO Luis Blanco contam à Bloomberg Línea como a maior empresa de graduação de medicina do país já possui mais de 300 mil profissionais e alunos que usam suas soluções, ao mesmo tempo em que cresce e amplia margens

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Bloomberg Línea — O segmento de graduação para medicina no país tem se tornado mais competitivo nos últimos anos em razão de sua dinâmica: ticket médio mais elevado, menor índice de abandono do curso e dados que apontam que o Brasil ainda tem menos médicos por mil habitantes do que a média dos países da OCDE, por exemplo.

Os entrantes incluem de grandes grupos de educação do país a players locais que muitas vezses se valem de liminares na justiça para conseguir abrir vagas e, depois, oferecem descontos agressivos para tentar atrair alunos.

Nessa dinâmica, a entrega de resultados operacionais e financeiros consistentes se torna em tese mais desafiadora e difícil de alçancar. Mas não tem sido o caso para a Afya, maior empresa de educação e de tecnologia para medicina do país, cujos resultados do terceiro trimestre, divulgados na noite de quarta-feira (12), mostraram novamente expansão em dois dígitos e aumento de margens.

As receitas cresceram na casa de dois dígitos tanto no resultado consolidado, para R$ 928,5 milhões (+10,4% na base anual), como no dado que exclui o efeito de aquisições recentes, para R$ 926,2 milhões (+10,1%).

O Ebitda ajustado (métrica de geração de caixa operacional) do terceiro trimestre cresceu 14,6% versus o mesmo período de 2024, para R$ 398,9 milhões, com margem Ebitda ajustada de 43,0%, com aumento de 160 pontos base.

A empresa alcançou conversão de caixa operacional de 101,5%, o que ajudou a levar a posição de caixa para R$ 996,8 milhões ao fim do período.

“Desde o nosso IPO, no segundo semestre de 2019, são 13 semestres em que temos com sucesso na nossa captação [de alunos de graduação], com 100% de ocupação, ou seja, é uma companhia com trajetória muito regular”, disse Virgílio Gibbon, CEO da Afya, em entrevista para a Bloomberg Línea.

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“Nós sempre falamos que a Afya é um negócio de alto crescimento, com margem e rentabilidade e, principalmente, alta previsibilidade”, acrescentou o executivo, citando o cumprimento do guidance em todos os anos, com trajetória que aponta para isso a cada trimestre, quando não acima das projeções.

No caso do guidance de 2025, que foi reafirmado pela empresa, as receitas devem encerrar o ano no intervalo de R$ 3,670 bilhões a R$ 3,770 bilhões (versus R$ 3,304 bilhões em 2024), enquanto o Ebitda ajustado ficará no intervalo de R$ 1,620 bilhão a R$ 1,720 bilhão (versus R$ 1,456 bilhão em 2024).

A geração de caixa operacional, bem como o caixa na casa de R$ 1 bilhão, com alavancagem em nível considerado confortável, mantém as condições para a continuidade de sua estratégia de crescimento também por meio de M&As (aquisições) e de remuneração de acionistas, seja por meio da distribuição de dividendos como de programa de recompra de ações.

Gibbon destacou que a companhia tem se mostrado capaz de repassar preços às mensalidades de forma que classificou como eficiente apesar da pressão de alguns concorrentes, o que permite o ganho de margem em relação ao ano passado.

“São dados que mostram mais uma vez a resiliência do nosso negócio, o diferencial e os efeitos da nossa construção da marca e do ecossistema para toda a comunidade médica”, disse o CEO da Afya, que concedeu a entrevista com Luis Blanco, CFO (Chief Financial Officer). “São mais de 300 mil médicos e alunos de medicina que são usuários das nossas soluções.”

Segundo ele, por outro lado, para além dos números, entender as perspectivas da empresa passa também pela análise qualitativa: “Qual o diferencial da Afya? Como está construindo reputação? Como ela se diferencia em termos de produto, currículo, proposta e geração de valor para o médico na sua carreira?”

O executivo fez referência ao que considera uma das principais vantagens competitivas da Afya em relação a outros players, se não a mais relevante: mais do que um grupo de ensino de medicina, a empresa se tornou um caso único no Brasil de provedor de soluções digitais que busca acompanhar o médico ao longo de sua carreira, da gradução à preparação para a residência e à especialização, passando pelo relacionamento com outros stakeholders, como farmacêuticas.

É uma estratégia que dialoga com o conceito cada vez mais disseminado de lifelong learning mas não só isso, ao tratar também de demandas operacionais.

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Esses diferenciais se mostram cada vez mais relevantes no ambiente mais concorrido, segundo o CEO da Afya, citando, por exemplo, que a empresa opera com 100% de ocupação de suas cerca de 3.600 vagas de medicina aprovadas pelo MEC (Ministério da Educação), enquanto players locais com ensino de boa qualidade enfrentam desafio para conseguir preencher as vagas que possuem.

Negócio de ‘R$ 1,8 bilhão’ (e crescendo)

A Afya conta hoje com duas outras verticais de negócios: a de educação continuada e a de soluções digitais - denominada Soluções para Prática Médica (SPM) -, cujos números ainda representam uma fração menor do resultado consolidado mas que aceleram o seu crescimento e apresentam potencial relevante.

No primeiro caso, a de educação continuada, a empresa oferece a já citada preparação para a residência e também pós-graduação, cursos de atualização, de finanças para médicos e gestão de consultórios, entre outros.

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A vertical de soluções digitais, por outro lado, apresenta as perspectivas mais promissoras, segundo Gibbon. São mais de 300 mil usuários ativos mensais de produtos como o Afya Whitebook, uma plataforma digital de conteúdo e literatura médica, preparada e revisada por médicos, para auxiliar na tomada de decisões de casos clínicos, que se tornou a mais utilizada no país pela categoria.

Há ainda o iClinic, um software de gestão clínica e prontuário eletrônico que funciona no modelo B2B; e o recém-desenvolvido ReceitaPro, um assistente digital de prescrição com uso de IA (Inteligência Artificial) com diferentes interfaces, do smartphone ao WhatsApp, para cuidar de tarefas burocráticas.

A empresa não divulga o LTV (Lifetime Value) do médico que está na sua base com mais de 300 mil profissionais e alunos, métrica de receita do “cliente” ao longo de um relacionamento com uma empresa, mas Gibbon disse que se trata de um número em trajetória de crescimento.

“[As verticais de educação continuada e de soluções digitais] são uma parte pequena ainda em termos de conhecimento [do mercado] e de valor, mas, sem dúvida, garantem um diferencial muito grande", disse o CEO.

Ele destacou a oportunidade que se coloca pelo fato de que a Afya forma e prepara médicos para o mercado de trabalho, enquanto a indústria farmacêutica e outras empresas procuram justamente a proximidade com esses profissionais.

Segundo informações reveladas no seu Investor Day no fim de outubro, a Afya já conta com cerca de 160 contratos com empresas como farmacêuticas, prestadores de serviços e operadoras de saúde.

Essa expansão alimenta a sua plataforma de dados proprietários para gerar insights, medir a eficácia do marketing e fortalecer o engajamento de médicos, segundo apontou o analista Samuel Alves, da equipe de equity research do BTG Pactual, em relatório sobre o evento com investidores.

As duas áreas somadas, de educação continuada e de soluções digitais, devem gerar cerca de R$ 450 milhões em receitas no ano cheio de 2025. Há seis anos, em 2019, juntas contribuíram com R$ 100 milhões.

Gibbon apontou para um exercício hipotético de valuation dessas verticais, que consistem em um negócio essencialmente digital, com múltiplo “bastante conservador” de 4x a receita, o que atribuiria um valor de R$ 1,8 bilhão.

“Como você precifica um negócio digital, uma healthtech? Hoje é um negócio que está precificado a zero pelo mercado”, afirmou o CEO da Afya, citando o seu entendimento sobre o potencial de valor da companhia.

Segundo ele, o valor de mercado atribuído à empresa não reflete não só as perspectivas de geração de valor como o que já existe e tem sido entregue.

Negociada na Nasdaq desde julho de 2019, a Afya tem hoje market cap de US$ 1,35 bilhão (cerca de R$ 7,2 bilhões ao câmbio corrente). A ação acumula queda de 9% no acumulado de 2025.

-- Em atualização.

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