Na Alliança Saúde, de Tanure, expansão passa por diferentes avenidas, diz novo CEO

Em entrevista à Bloomberg Línea, Ricardo Sartim e Isabella Tanure, que agora preside o conselho, contam as razões para a mudança no comando e a agenda orgânica e inorgânica de um dos maiores grupos de medicina diagnóstica e exames do país

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Bloomberg Línea — As oportunidades proporcionadas pelo avanço da Inteligência Artificial (IA) têm sido amplamente discutidas na Alliança Saúde, segundo Ricardo Sartim, o novo CEO, e Isabella Tanure, presidente do conselho de administração.

“Cada tarefa de backoffice, como fazer a conferência de guias de pacientes - e são milhares diariamente -, colocar em um lote e enviar para a operadora, representa uma oportunidade de ganho de produtividade com uso de IA”, disse Sartim em entrevista à Bloomberg Línea no escritório da empresa em São Paulo.

“São pequenas contribuições incrementais que, somadas, fazem diferença no resultado, com ganhos de margem aqui e ali”, disse.

“O que eu quero dizer? Esse é um exemplo de como consistência é o nome do jogo para nós. Isso é muito poderoso”, completou o executivo, que assumiu o cargo há pouco mais de um mês, em substituição justamente a Isabella Tanure.

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A sucessão já estava de certa forma planejada. “Foi uma escolha muito natural. O Sartim já vinha atuando como meu braço-direito em muitas questões importantes da operação da empresa”, disse Isabella na mesma entrevista.

“A ideia é que ele possa dar continuidade ao trabalho que vem sendo realizado, e, ao mesmo tempo, eu continuarei muito próxima da diretoria. Isso é algo que trouxemos e que segue como prioridade: a relação próxima do conselho com a administração, do estratégico com a operação”, disse a executiva.

Segundo eles, isso se traduz em questões práticas como a tomada e a execução de decisões com mais agilidade.

“As trocas e as devoluções com a equipe são muito mais rápidas. É algo que contribuiu para que a empresa conseguisse concluir o turnaround”, disse o CEO, que chegou à empresa (AALR3) em 2023, vindo da rede de hospitais Américas, da Amil.

Um exemplo é a forma como a empresa avalia e decide o que é relevante e estratégico. “Temos um escritório de projetos que estava ligado à Isabella e agora está comigo. Nos reunimos semanalmente, junto com o conselho, para revisar o que é prioridade e o que pode ser deixado para depois”, disse Sartim.

Os executivos fizeram questão de ressaltar o valor dessa dinâmica para se dedicar ao que realmente pode fazer a diferença para a companhia e para não “desperdiçar” tempo, energia e recursos no que não compensa. “De novo, trata-se de consistência e de um exercício diário para não perder o foco”, disse Sartim.

O processo de reestruturação mencionado, por sua vez, foi executado ao longo de dois anos, desde que Nelson Tanure assumiu o controle da empresa - então Alliar - em abril de 2022, superando o interesse da Rede D’Or (RDOR3).

Na fase pós-turnaround iniciada há pouco mais de um ano, a retomada do crescimento sustentado continua como um dos focos da Alliança, com uma agenda tanto orgânica como inorgânica e que contempla diversificação dos negócios e das fontes de receitas, que vão além das operadoras de saúde.

“Acreditamos que o pior momento para o mercado de saúde já passou com a perspectiva de manutenção e depois queda dos juros. No momento em que o mercado melhorar um pouco mais, nós estaremos preparados para capturar esse aumento da demanda”, disse Sartim.

Parte desse movimento inorgânico já tem sido executado. Em fevereiro, a Alliança anunciou a aquisição da Cura Medicina Diagnóstica, que tem laboratórios na Grande São Paulo, por R$ 30 milhões. O pagamento será realizado de forma diferida ao longo de 36 meses, de modo a não pressionar o caixa.

A projeção é que essa incorporação resulte em um acréscimo da ordem de R$ 80 milhões para as receitas brutas anuais da Alliança.

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No período de pouco mais de um ano - 14 meses - até a mudança anunciada no fim de abril, Isabella acumulou os cargos de CEO e vice-presidente do conselho, enquanto Sartim liderou as frentes médica e de operações.

Naquele momento, a chegada de Isabella como CEO, em substituição a Pedro Thompson, representava também uma mensagem do acionista controlador - seu pai - e da família de compromisso com a empresa, então sob pressão financeira.

A executiva volta a se dedicar integralmente ao conselho, agora como presidente, com atribuições mais estratégicas, mas sem distanciamento.

“A busca de eficiência e da disciplina financeira é algo que fica na cultura da empresa, ao mesmo tempo em que perseguimos o crescimento”, disse a executiva.

Os frutos dessa nova orientação estratégica se refletem nos resultados financeiros trimestrais - ainda mais quando comparados ao momento pré-turnaround.

Sartim destacou a evolução dos indicadores nos últimos dois anos: as receitas voltaram a subir, a margem Ebitda passou de um dígito para quase 24% em 2024, enquanto as despesas de venda, gerais e administrativas (SG&A) caíram.

A alavancagem medida pela dívida líquida sobre o Ebitda ajustado no conceito dos últimos doze meses (LTM) caiu para 2,1x no fim de março, versus 3,8x um ano antes e 4,6x no mesmo período de 2023.

“Fomos muito diligentes nesse período, sem que houvesse algo de extraordinário para ajudar. Tudo o que prometemos nós conseguimos entregar. E voltar a olhar o mercado para aquisições é muito representativo”, disse Sartim.

Segundo ele, a empresa buscou construir e reforçar alicerces, o que se traduziu na capacidade de geração de caixa e na citada redução da alavancagem, seja via operação ou com eventual aporte do controlador.

Os números mais recentes, do primeiro trimestre, deram novo respaldo à mensagem de consistência, de acordo com os executivos.

As receitas brutas ajustadas subiram 6,6% na base anual, para R$ 321,4 milhões; o Ebitda ajustado cresceu 47%, de R$ 46,9 milhões para R$ 68,9 milhões; e a margem Ebitda ajustada passou de 16,8% para 23,1%.

Na métrica dos últimos doze meses, as receitas brutas ajustadas chegaram a um patamar recorde para a companhia de R$ 1,320 bilhão.

Novas avenidas de crescimento

A estratégia incluiu a abertura e o reforço de novas avenidas de crescimento, como a de negócios B2B, para parceiros, por exemplo, como hospitais que encomendam a realização de exames para a Alliança. E isso abre o potencial de cross-sell de outros serviços diante da proximidade e do relacionamento que se estabelece.

O movimento se traduz em reforço para o fluxo de caixa - que foi no passado um ponto de preocupação -, dado que o pagamento acontece em prazo menor (em geral 45 dias) do que o habitual de operadoras de saúde (90 dias).

A vertical de negócios B2B chegou à marca de R$ 50 milhões em receitas brutas no conceito dos últimos doze meses no primeiro trimestre e hoje já está próxima de se tornar uma das cinco ou seis principais fontes para a Alliança.

Nessa frente de parcerias comerciais, a Alliança ampliou o credenciamento junto a uma das maiores operadoras de saúde do país, o que representou a inclusão de 280 mil beneficiários à marca CDB na Grande São Paulo.

No ano passado, o acréscimo para a base atendida de saúde suplementar foi de cerca de 1 milhão de beneficiários, contando acordos com outras companhias, que são reflexo de uma reaproximação com as operadoras de saúde.

“Voltamos a dialogar mais e priorizamos parcerias que possamos potencialmente atender por completo e fazer a diferença, com flexibilidade da nossa parte para endereçar as necessidades dos clientes”, disse a executiva.

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Um exemplo, segundo contaram, é o atendimento direto e presencial de beneficiários no próprio cliente, uma demanda que nem sempre é atendida por empresas de medicina diagnóstica e análises clínicas.

“As operadoras, em geral, estão com pressão sobre a margem. Se ficamos só na discussão de preço e no transacional, entramos em uma guerra pelo que é commodity. Buscamos entender o que é a dor e como atender para agregar valor. E isso transforma a parceria em algo que seja relacional”, disse o CEO.

O atendimento ao cliente particular, por sua vez, também cresceu e hoje já representa uma das principais fontes de recursos para a Alliança, o que igualmente se traduz em melhoria para o fluxo de caixa.

Diante dessa agenda e de oportunidades como os ganhos com o uso de IA, mencionados no início, a perspectiva é positiva, segundo Sartim e Isabella.

“Não podemos dar guidance, mas ainda vemos como extrair valor da operação”, disse o CEO da Alliança, para em seguida completar: “Pode ser uma história menos emocionante, mas no longo prazo faz sentido para a companhia.”

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