Mercado Livre aposta em moda e beleza para engajar clientes de ‘ticket’ mais alto

Segmento chave para o marketplace conta com 38 milhões de visitantes mensais e cresceu 31% em itens vendidos no primeiro trimestre na base anual, em cima de estratégias como a entrada de novos sellers, como a joalheria Pandora

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Bloomberg Línea — Maior marketplace da América Latina e empresa mais valiosa da região, o Mercado Livre tem no Brasil seu principal mercado: a operação brasileira responde por cerca de metade da receita total da companhia. A relação de relevância é recíproca: a empresa argentina é líder no e-commerce brasileiro e estima ter 40% de participação de mercado no país.

Para manter o protagonismo em um ambiente altamente competitivo, especialmente com o avanço de gigantes asiáticas, uma das apostas do Mercado Livre é reforçar a recorrência de compras de clientes em sua base.

Para tanto, o Meli tem reforçado o foco em categorias que geram compras frequentes, como supermercado, saúde e o combo formado por moda e beleza – as três vertentes são que mais crescem dentro da plataforma, respectivamente.

Entre elas, o mercado de moda e beleza tem se consolidado como um segmento chave pelo potencial de engajamento, especialmente para o público feminino, que tem uma jornada de compra diferente dos demais nessas categorias.

“É mais fácil incentivar uma compra por impulso ou testar um produto novo nesses segmentos do que em outras categorias”, afirmou Anna Araripe, diretora de marketplace no Mercado Livre.

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O segmento de moda e beleza do Meli conta com 38 milhões de visitantes mensais e apresentou crescimento de 31% nos itens vendidos no primeiro trimestre de 2025 na comparação anual. A categoria é a que mais cresce na plataforma em número de itens, que já superam a marca de 10 milhões.

“Além disso, a compra de uma máscara de cílios, por exemplo, pode representar uma reposição frequente, que por sua vez pode levar a uma compra adicional na plataforma. Por isso, faz sentido dedicarmos um foco diferenciado a essa frente”, disse a executiva em evento recente.

O Mercado Livre tem atualmente 1.500 lojas oficiais de marcas dentro da plataforma e conta com a frente de moda e beleza também para aumentar o valor médio gasto na plataforma.

O mais recente “reforço” foi a joalheria Pandora, que anunciou na última quinta-feira (10) sua entrada no marketplace do Mercado Livre, se juntando a outras empresas de tíquete médio mais alto, como Lacoste, Ray-Ban e Calvin Klein.

“Esse consumidor já está no Mercado Livre, [comprando] smartphones premium, eletrônicos high end: são mercados em que já estamos consolidados. Agora o que queremos é trazer esse consumidor para outras categorias", disse a diretora à Bloomberg Línea durante o evento de lançamento da parceria com a Pandora.

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O foco no segmento premium de moda e beleza ganhou corpo há cerca de dois anos dentro do Mercado Livre. Entre parcerias com marcas e criadores, a companhia também deve patrocinar pelo segundo ano consecutivo o São Paulo Fashion Week (SPFW), principal evento de moda do país.

Moda e beleza no radar da concorrência

As plataformas de e-commerce não abrem números específicos do segmento de moda e beleza, mas, segundo projeções, o valor médio de gastos no Mercado Livre é mais alto que nos concorrentes.

Analistas do Itaú BBA estimaram, em fevereiro deste ano, que o tíquete médio do Mercado Livre seria de US$ 21, ou três vezes os US$ 7 da Shopee, segunda colocada no mercado brasileiro de e-commerce.

O ranking leva em consideração, principalmente, a receita gerada a cada transação no marketplace (valor bruto de mercadoria transacionada, ou GMV, na sigla em inglês).

As companhias não divulgam GMV específico para a operação brasileira, mas o BBA estima um montante em torno de US$ 25 bilhões em GMV para o Meli vindos do Brasil no ano de 2024 (contra um total consolidado de US$ 51,5 bilhões em 2024).

A Shopee, por sua vez, teria alcançado um GMV de US$ 10 bilhões na operação brasileira no ano passado, um valor duas vezes o da Amazon, terceira colocada no ranking, mas ainda 60% abaixo do Meli.

No entanto, o ritmo de crescimento da varejista de Singapura foi mais acelerado, com avanço de 100% do seu GMV em 2024.

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Os analistas do BBA indicam que ainda não há grande sobreposição entre os produtos vendidos nos dois e-commerces, o que pode mudar à medida que a Shopee também investe em categorias de maior valor agregado e na entrada de marcas na plataforma: Hering, Havaianas e L’Oreal são algumas das já disponíveis.

“Essas parcerias não apenas contribuem para um tíquete médio mais alto mas também desempenham um papel crucial no fortalecimento do posicionamento de mercado da Shopee e na trajetória de crescimento de longo prazo”, escreveram os analistas do banco de investimento em relatório.

Outro alerta vem do recém-lançado TikTok Shop, plataforma integrada de vendas da rede social. Nesse caso, beleza e moda são algumas das principais alavancas de crescimento nos mercados em que essa frente de negócios do player chiês foi lançada, o que pode ser um desafio para o Meli no Brasil.

O lançamento do TikTok Shop aconteceu em maio, e a plataforma já conta com nomes como Natura, Riachuelo, Arezzo, Avon e Boticário.

O time de equity research do Santander avaliou em relatório que o foco inicial na operação brasileira esteve em marcas maiores, mas sem deixar de lado as de nicho, como Simple Organic (beleza), Bold e Guday (vitaminas) e Jami Jami (moda), que têm parcerias com criadores de conteúdo.

Os analistas do Santander lembraram ainda que o Mercado Pago, fintech do Mercado Livre, não está disponível como opção de pagamento no TikTok Shop como foi feito no México.

“Em nossa pesquisa, também não encontramos nenhuma indicação de que o Meli esteja em parceria com o TikTok. Durante a teleconferência de resultados do primeiro trimestre, a administração do Mercado Livre afirmou que ainda é muito cedo para avaliar o impacto competitivo do TikTok Shop no México ou no Brasil, mas que eles estão monitorando a situação de forma ativa e rigorosa.”

Para o BBA, ainda é cedo para determinar se a concorrente terá condições de conquistar uma fatia relevante do mercado brasileiro.

Um dos principais pontos de atenção é entender se a plataforma irá incorporar serviços de logística como já faz no Reino Unido – por enquanto o modelo logístico adotado é o Fourth-Party Logistics (4PL), totalmente terceirizado via parcerias com transportadoras locais como os Correios.

”Ainda assim, a trajetória de crescimento da plataforma em outros países, seu perfil de vendedor [seller] e seu sucesso em categorias de alto valor, como beleza, sugerem que ela merece um monitoramento rigoroso [por parte da concorrência]”, afirmaram os analistas em relatório de março deste ano.

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Batalha de preços

Apesar da busca por tíquetes mais altos, a frente de batalha entre as gigantes em marketplace no Brasil se dá também em preços menores, oferecidos tanto em condições para os clientes finais quanto para os sellers.

A estratégia mais agressiva veio do Mercado Livre, que anunciou em junho frete grátis para compras a partir de R$ 19,00 – 76% a menos que o patamar mínimo anterior, de R$ 79,00.

A política de frete grátis começou em 2017, para compras a partir de R$ 120,00 e, nas estimativas da companhia, contribuiu de forma relevante para o crescimento da participação no mercado brasileiro, de um patamar de 20% para algo em torno de 40%.

O modelo de frete grátis inicialmente gerou perdas (com Ebitda negativo até 2019), mas se provou um catalisador de crescimento, segundo análise do BTG Pactual, com margens que chegam a 16% em 2025 apoiadas em maior monetização.

A expectativa de analistas do banco de investimento é que a estratégia agressiva de frete do Meli seja seguida por pares mais capitalizados.

A Amazon, por sua vez, tem apostado na redução dos custos para os vendedores, com redução das tarifas de comissão e logística do programa de gerenciamento, armazenamento e entrega no modelo Fulfillment by Amazon (FBA).

“O ressurgimento de players internacionais que adotam operações locais, combinado com o investimento renovado da Amazon em incentivos aos vendedores, aponta para uma reaceleração da concorrência baseada em preços”, afirmaram os analistas do BTG em recente relatório.

A estimativa do BTG é que o Mercado Livre largue na frente na disputa devido à sua superioridade logística no Brasil, além da integração a serviços bancários com o Mercado Pago e a força do efeito de rede entre vendedores e consumidores.

Em abril, o Mercado Livre anunciou investimento de R$ 34 milhões para o Brasil em 2025, montante 48% que no ano anterior – e seu maior volume da história.

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