Bloomberg Línea — A Decathlon inaugurou nos últimos dias a sua loja de número 50 no país, no estado de São Paulo. Mais do que um número simbólico para a varejista e fabricante francesa de artigos esportivos que desembarcou no Brasil no começo dos anos 2000, o feito ilustra o ritmo de expansão nos últimos cinco anos.
Em 2015, a Decathlon operava 19 lojas no Brasil. De lá para cá, especialmente a partir de 2019, a companhia acelerou a expansão física ao consolidar seu modelo de negócios e acompanhar o aumento da prática esportiva entre os brasileiros.
“Foi um momento de acerto no formato e de resposta a um novo comportamento do consumidor”, disse Cédric Burel, CEO da Decathlon Brasil, em entrevista à Bloomberg Línea.
A operação local está entre as dez maiores do mundo.
Fundada em 1976, a Decathlon está presente em 79 países e fechou o ano passado com receita líquida de € 16,2 bilhões e lucro líquido de € 787 milhões.
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O executivo francês chegou ao país no início da operação e, desde 2016, está no comando do negócio, período em que testemunhou o mercado de esportes se transformar no país e ganhar um novo ritmo e novas necessidades.
“Corri a meia maratona do Rio por volta de 2003 e o perfil era muito diferente. Eu era um dos mais jovens e, primeiro, tinha muito mais homem. Hoje, a prática esportiva ganhou muito mais participação feminina, o que é muito positivo, as idades estão mais baixas, e as performances, mais altas”, contou.
A companhia tem buscado estabelecer uma “nova cara” no país, a partir de um reposicionamento global iniciado no ano passado. O processo de mudança inclui desde uma nova paleta da cor azul até a disposição dos produtos nas lojas, com um mapa circular pelas categorias esportivas.
A loja recém-inaugurada no bairro da Chácara Klabin, na zona sul da capital paulista, foi a primeira a nascer com esse conceito no país - outras estão passando por reformulações.
As mudanças contemplaram ainda a redução no número de marcas próprias para 13, versus uma quantidade superior a 30 anteriormente.
Na nova configuração, permaneceram nomes conhecidos como a Quechua, famosa pelos produtos de camping e trilha, a Domyos, de roupas e itens de treinos, e a B’Twin, de bicicletas, e ainda apostas como a KipRun, com itens para corrida.
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“O objetivo de contar com só 13 marcas é realmente conseguir trabalhar um pouco mais essa notoriedade em um discurso sobre o que elas entregam”, afirmou Burel.
Enquanto as marcas buscam um “lugar ao sol”, o nome da companhia deve passar a ser trabalhado para refletir melhor uma “garantia de qualidade”.
A conjunção entre esses rearranjos internos e o novo momento da prática esportiva é uma dos pilares da estratégia da Decathlon no país.
A rede busca reforçar ainda o conceito de especialização por modalidade, com lojas projetadas para criar experiências imersivas e focadas em comunidades esportivas locais.
A Decathlon carrega esse DNA de permitir que os clientes possam tocar e brincar com os produtos em exposição em suas unidades.
Mas, cada vez mais, encontra concorrentes dispostos a adotar apelo semelhante no momento da compra, especialmente no mundo da corrida, como a Running Land e a Keep Running, entre outras.
A nova unidade na avenida Ricardo Jafet, em São Paulo, tem foco na corrida de rua e conta com vendedores especialistas no esporte. É também uma forma de conversar com a vizinhança, que tem no Parque da Independência, onde está localizado o Museu do Ipiranga, um espaço para os treinos.
“Dentro da aglomeração de São Paulo, nós teremos algumas unidades que terão lojas especializadas dentro da loja. É como se a Decathlon fosse um shopping do esporte, com lojas mais específicas”, afirmou.
A rede conta com 12 unidades no estado. “A loja do Morumbi, por exemplo, terá mais produtos para a comunidade que tem barco, vela e pratica esporte náutico.”
Esse é um modelo que começa a ser levado para outros estados, por onde a companhia procura avançar. Após ampliar a presença em praças do Sul e do Sudeste, a Decathlon avançou por cidades do Centro-Oeste e, mais recentemente, do Nordeste, incluindo Brasília, Goiânia, Recife, Salvador e Fortaleza.
“Começamos pelas grandes capitais, mas a próxima etapa é chegar às cidades de médio porte e consolidar ainda mais nossa presença nas metrópoles”, afirmou o executivo.
O comércio eletrônico tem ajudado a complementar essa expansão física, especialmente em regiões onde ainda não há lojas.
Segundo Burel, o canal digital representa hoje cerca de 10% da receita no Brasil, com variação entre modalidades — categorias como montanhismo, com pouca oferta no varejo tradicional, têm maior representatividade online.
Globalmente, o digital já responde por cerca de 20% das vendas da Decathlon, número que a operação local pretende alcançar.
“Ainda somos menos conhecidos em algumas regiões do país. O desafio é ganhar confiança e visibilidade. O potencial está aí, o esporte está crescendo em todo o Brasil”, disse.
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Modelos menores e lojas especializadas
Para alcançar novos mercados, a empresa também tem revisado o formato de loja. A estratégia inclui modelos menores, que sejam mais acessíveis e tenham mix de produtos adaptado à realidade local.
“Estamos repensando o modelo para estar um pouco mais perto dos nossos clientes, que veem o deslocamento na grande cidade ficar cada vez mais difícil. O nosso plano de expansão vai continuar com lojas grandes, mas ele vai se complementar com lojas um pouco menores e mais especializadas”, explicou Burel.
O executivo cita como exemplo uma loja no Leblon, no Rio de Janeiro, mantida em um espaço com 800 metros quadrados.
Além da expansão em número de lojas, a Decathlon também persegue uma expansão no volume de produtos fabricados localmente.
Atualmente, 30% da receita é oriunda das linhas desenvolvidas nacionalmente, participação que deve avançar em 10 pontos percentuais nos próximos anos. Os itens principais são relacionados às categorias fitness e beachwear.
“É uma estratégia interessante de nearshoring, que permite também amortecer um pouco a situação cambial, em alguns casos. Em outros casos, faz com que nos adaptemos melhor ao mercado local”, afirmou. “O mercado fitness no Brasil está a anos luz do setor na França.”
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