Bloomberg Línea — Cold brew, bebida pronta, puro com leite ou em cápsula: o café faz parte da rotina do brasileiro, mas o hábito de consumo tem mudado, especialmente entre a Geração Z, que cada vez mais tem preferido o café gelado ao tradicional quente.
De olho nos novos perfis de consumo, dentro e fora do lar, a Nescafé, da Nestlé, tem reforçado sua aposta em inovação e no aumento da capacidade produtiva.
O objetivo é reduzir a exposição aos preços voláteis da commodity, que chegaram a níveis recordes nos últimos anos, e crescer no Brasil, o maior produtor e exportador global do grão.
A companhia anunciou nesta quinta-feira (22) um investimento de R$ 500 milhões até 2028 para expandir sua produção no Brasil, com foco na fábrica de cápsulas em Montes Claros (MG) e no parque de máquinas da Nestlé Professional, presente em padarias, escritórios, cafeterias e lojas de conveniência em todo o país.
O novo aporte se soma ao R$ 1 bilhão anunciado pela companhia no fim de 2024.
“Queremos dobrar nosso negócio de café no Brasil até 2027, tanto no consumo dentro de casa quanto fora do lar”, afirmou Valéria Pardal, diretora da unidade de cafés da Nestlé, em evento com jornalistas.
Segundo José Argolo, diretor executivo da Nestlé Professional, a expectativa é aproximar a experiência de consumo em casa a algo próximo à de uma cafeteria.
“Com a Dolce Gusto, já oferecemos mais de 40 variedades de bebidas no lar. Também estamos ampliando nossa presença fora de casa, com máquinas que atendem desde postos de gasolina até escritórios”, disse o executivo.
Preços em alta
O movimento da Nestlé acontece em momento de pressão sobre os preços do mercado em geral, no Brasil e no mundo.
O aumento nos preços do café já se reflete até em demanda menor dos brasileiros. Segundo o IBGE, o grão ficou 80% mais caro nos 12 meses até abril.
O encarecimento levou a uma queda de 16% no consumo, de acordo com dados e avaliação da Associação Brasileira da Indústria de Café (Abic).
Fatores como o aumento do consumo de café e o clima, com ondas de calor e geadas nas últimas safras brasileiras, têm impulsionado nos últimos anos o preço do grão.
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Os executivos da Nescafé projetam que o pico de preços já tenha acontecido.
“Estamos em uma jornada inédita de aumento do preço do café no mundo, mas estamos otimistas de que esse ciclo já atingiu seu pico”, afirmou Valéria.
Segundo a executiva, os efeitos da alta dos preços do grão vêm sendo repassados ao consumidor em certa medida, e a estratégia da empresa é buscar mitigar esse impacto com produtos mais acessíveis, como é o caso do café solúvel.
“O consumo de café no Brasil é resiliente. Vimos movimentos semelhantes em 2021 e 2022, quando os custos também dobraram, mas o consumo se recuperou com o tempo. A inovação é essencial nesse processo”, disse ela.
Consumo dentro e fora do lar
Cerca de 8% dos brasileiros possuem máquina de café da Nescafé em casa, e a meta é dobrar esse percentual nos próximos anos. Na Europa, essa penetração é de 35%.
Fora de casa, a empresa domina esse mercado: o país abriga o maior parque de máquinas da marca no mundo, com 26.500 unidades.
Parte das máquinas é importada dos EUA e da Itália, enquanto algumas são fabricadas no país.
Nessa frente, a companhia quer aumentar a capacidade das máquinas e conseguir ter acesso aos dados e aos padrões de consumo a partir do uso de tecnologia, como a telemetria.
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Hoje, as máquinas servem cerca de 700 mil xícaras por dia fora do lar.
O intuito da companhia no futuro, dizem os executivos, é compartilhar os dados sobre padrões de consumo com os varejistas.
Atualmente, 16.000 máquinas já contam com essa tecnologia, e a meta é chegar a 25.000 até o fim do ano.
Outro pilar da estratégia da companhia passa por investimentos com lançamentos de produtos.
Recentemente, a empresa lançou as linhas Nescafé Gold, um chococino de língua de gato em parceria com a Kopenhagen e um chocolate quente com a Kit Kat no portfólio de cápsulas Dolce Gusto. O Brasil é o principal mercado para o Kit Kat no mundo, disse Argolo.
Ao explicar a aposta da empresa na categoria de cafés gelados, Valéria Pardal citou uma pesquisa da Abic que projeta que o consumo de café no país é de cerca de quatro xícaras por dia.
“Estimamos que essa ‘quinta xícara‘, gelada, represente 20% do consumo nos próximos 20 anos”, disse a executiva. A empresa também tem apostado em máquinas de cafés, dentro e fora do lar, capazes de produzir cafés quentes e gelados.
Nos EUA, a empresa percebeu que a Geração Z já consome mais café frio do que quente, segundo Valéria, e a expectativa é que essa tendência chegue ao Brasil nos próximos anos.
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“Temos espaço para crescer, tanto em penetração quanto em variedade e sofisticação”, concluiu a executiva.
No acumulado de 2024, a receita da Nestlé caiu 1,8% e somou US$ 99,98 bilhões. Apesar da queda, o resultado ficou acima da expectativa do mercado. O lucro líquido chegou a 10,89 bilhões de francos suíços e ficou em linha com as projeções.
No balanço financeiro divulgado em fevereiro, a empresa informou que o café foi o principal contribuinte para o crescimento, “com alta de um dígito médio”, impulsionado pelas três principais marcas da categoria: Nescafé, Nespresso e Starbucks.
Os papéis da companhia, negociados na bolsa de valores suíça, a SIX Swiss Exchange, subiram 18,01% desde o início de 2025. Em doze meses, a queda foi de 5,5%.
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