Bloomberg Línea — Há cinco anos, a Votorantim Cimentos decidiu “colocar de pé” uma nova operação voltada para o transporte de sua própria carga, para endereçar algumas “dores” e também com a visão de ganho de eficiência.
Deu tão certo que a nova empresa, a Motz, hoje se tornou um negócio que teve um faturamento líquido de R$ 1,5 bilhão no último ano, depois de crescer 30%.
Para este ano, os planos preveem expansão de 20%, na esteira da diversificação dos setores atendidos, que já vão muito além do cimento - hoje o agronegócio tem peso crescente -, e da aceleração do ganho de escala.
“A Motz nasceu com a ideia de ir para mercado e se tornar uma fonte de receitas adicionais para a Votorantim Cimentos, como se fosse uma startup do ponto de vista de investimento em tecnologia e de tomada rápida de decisões”, disse André Pimenta, CEO da Motz, em entrevista à Bloomberg Línea.
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Nos últimos dois anos, por exemplo, a empresa investiu praticamente R$ 50 milhões em tecnologia, em frentes como o desenvolvimento de produto e a melhoria de sistemas.
Os recursos são da própria empresa, que gera caixa com a operação desde o primeiro ano e não precisa de investidores externos, disse o CEO - o capital da Motz segue 100% com a Votorantim Cimentos.
Segundo o executivo, a visão foi transferir o transporte de cimento por meio do relacionamento com motoristas autônomos, que não fazia parte do core business, para um modelo em que uma empresa assumisse essa tarefa e pudesse adotar práticas que levassem a ganhos de produtividade.
A Motz chegou ao fim de 2024 com mais de 300 empresas como clientes e 90.000 motoristas cadastrados em sua plataforma digital, que faz uso de tecnologia para fazer o “match” mais assertivo entre demanda de transporte de carga de uma companhia e o motorista autônomo e otimizar a sua jornada de viagens.
A jornada para os motoristas se dá por meio de aplicativo, em que ele tanto escolhe o transporte da carga que decide aceitar como depois avisa sobre a entrega realizada, com validação digital e subsequente pagamento pelo serviço.
Para este ano, a previsão é ampliar a base de motoristas cadastrados em 30%, o que é fundamental dado que a empresa busca equilibrar oferta e demanda.
No ano passado, a Motz realizou cerca de 740 mil viagens, com o transporte de mais de 20 milhões de toneladas de carga. Esses números já a colocam como uma das maiores transportadoras do país.

“Buscamos garantir que o motorista tenha sempre um frete tanto na viagem de ida para o transporte de uma carga como na viagem de volta”, disse o CEO, citando que a empresa usa geolocalização e IA para oferecer o serviço.
Como parte da estratégia para fidelizar os motoristas, a Motz trabalha em parcerias com postos de combustíveis, restaurantes e lojas automotivas, como de pneus, para oferecer descontos, além de melhores condições em empréstimos - por meio do BV, o banco do Grupo Votorantim - e em seguros pessoais e de acidentes.
O objetivo seria o equivalente a buscar ampliar o share of wallet do motorista autônomo, ou seja, fazer com que ele preste cada vez mais serviços para empresas que são clientes da Motz, que avalia também índices de retenção.
Do lado dos clientes que pagam pelo transporte de carga, Pimenta disse que a Motz busca endereçar não só as demandas como também aprofundar esse relacionamento com melhores condições de valores e pagamento.
Diversificação e avanço pelo agro
No primeiro um ano e meio de operação, a Motz atendeu a demanda apenas da Votorantim Cimentos, período em que estruturou a operação do ponto de vista de sistemas, processos e pessoas, segundo Pimenta.
E, entre 2022 e 2023, com base em estudos de mercado, passou a avaliar e começou a executar o plano de atender outros clientes e setores, dentro de uma estratégia de diversificação prevista desde o princípio.
“Hoje atendemos praticamente todas as ‘cimenteiras’ do mercado, ou seja, inclusive concorrentes, além de outros segmentos da indústria pesada e de construção civil, como siderurgia, mineração e subprodutos do cimento”, disse.
Um setor que passou a ser atendido em um segundo momento foi o do agronegócio, que inclui o transporte de grãos como soja e milho e insumos como fertilizantes. Mais recentemente, a Motz começou a transportar laranja, algodão e açúcar.
O agro respondeu por quase 25% das receitas líquidas em 2024 e, neste ano, até o momento, essa contribuição já subiu para cerca de 40%.
“O agronegócio possui uma conexão importante com o DNA da Motz. Primeiro, pelos tipos de caminhão utilizados; segundo, por causa da relação com a malha logística entre os dois setores; o agro é muito exportador, enquanto a construção civil faz muita importação de insumos para as fábricas”, disse Pimenta.
O executivo tem experiência de 20 anos em logística, incluindo posições de liderança em supply chain e trabalho em empresas como a Ambev.
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Atualmente, a Motz transporta mais de quarenta produtos diferentes.
Novos setores dentro do agronegócio estão potencialmente no radar, como o de papel e celulose ou de insumos para certas indústrias, ainda sem uma decisão tomada, afirmou o executivo.
“A nossa visão é que não adianta pulverizar a demanda sem que a Motz tenha um conhecimento aprofundado do funcionamento do setor. Para entrar no agronegócio, por exemplo, nós montamos um time com profissionais do mercado.”
O entendimento do setor de logística e a escuta dos clientes e dos motoristas levaram a um modelo que Pimenta chama de “phygital”, expressão em inglês sobre combinar características do mundo digital com a experiência física.
Isso se traduz em cerca de 150 pontos de expedição espalhados pelo país, com 400 profissionais, entre próprios e parceiros, que trabalham na operação.
Pimenta disse que o plano é que a Motz continue a operar como uma empresa dentro da Votorantim Cimentos, sem planos por ora para que haja um spinoff ou uma listagem em bolsa.
Segundo ele, a Motz vai continuar a buscar combinar a visão de longo prazo que faz parte da cultura da Votorantim Cimentos com práticas de maior agilidade na tomada de decisões, de realizar muitos testes e de dispor de flexibilidade para atender pedidos de clientes - características de empresas de tecnologia.
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