Casas Bahia consegue alívio de credores com renegociação de parte da dívida

Varejista evita pedido de antecipação do vencimento de CRI acima de R$ 30 milhões ao concordar com aumento de spread e pagamento de prêmio; ações recuaram 8%

Grupo tem no portfólio marcas como PontoFrio, Extra.com, Bartira, banQi, ASAP Log, i9XP e Distrito, além da própria Casas Bahia
03 de Outubro, 2023 | 01:05 PM

Bloomberg Línea — O Grupo Casas Bahia (BHIA3), uma das maiores varejistas de eletrodomésticos do Brasil, conseguiu nesta terça-feira (3) um alívio no curto prazo de credores em uma renegociação de dívida.

A varejista anteriormente conhecida como Via ofereceu aumento de spread de remuneração e pagamento de um prêmio sobre o valor nominal unitário da dívida na renegociação dos termos da 20ª emissão de CRI (Certificado de Recebível Imobiliário), no valor superior a R$ 30 milhões.

Isso significa que a companhia terá maiores despesas financeiras, mas ganha tempo para encaminhar seu plano de reestruturação, em um contexto de menor apetite do consumidor por bens duráveis devido aos juros elevados.

Em relatório publicado ontem (2), a corretora Genial descreveu o sentimento de parte do mercado de análise de empresas de varejo com o título “3 de outubro pode ser letal” e a avaliação de que seria “um importante teste para cardíaco” diante da série de reestruturações do grupo, que trocou de CEO há seis meses, quando Renato Franklin, ex-CEO da Movida, substituiu Roberto Fulcherberguer.

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No fim da manhã, a companhia confirmou, em fato relevante, a renegociação do pagamento da emissão dos CRIs (e consequentemente as debêntures lastreadas à dívida). A renegociação das três séries da emissão prevê remuneração acrescida de spread complementar de 0,55% e um prêmio flat equivalente a 0,25%, multiplicado pelo duration (prazo médio ponderado remanescente).

O maior custo financeiro assumido na renegociação pode dificultar a execução da estratégia de curto prazo da varejista, segundo os analistas Iago Souza, Vinicius Esteves e Nina Mirazon, que assinaram o relatório da Genial sobre os cenários possíveis para a saúde financeira do grupo.

Caso o pedido de antecipação do CRI fosse aprovado pelos credores, o pior cenário apontado por analistas, isso poderia acionar a cláusula de antecipação de outras debêntures, o qual totalizaria um montante estimado em quase R$ 3,2 bilhões que poderiam ser antecipados.

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“A falta de acordo entre os credores e a companhia seria letal para a Casas Bahia, culminando em um efeito dominó que poderia levar a companhia a realizar o pedido de Recuperação Judicial”, escreveram os analistas no relatório da Genial.

Analistas não trabalham com a premissa de que a varejista abra novas lojas até 2005 e esperam o fechamento de 100 unidades ao longo dos próximos 12 meses. A corretora sustentou a recomendação para “manter”para a ação da Casas Bahia, que acumulava, até ontem, uma desvalorização de 74% em 2023. No fechamento desta terça, a ação caiu 7,94%, negociada a R$ 0,58.

A queda se acelerou após o recente rebaixamento dos ratings das emissões de CRI e debêntures pela agência de classificação de risco S&P, que colocou as notas em perspectiva negativa.

Essa revisão de rating veio após a empresa consolidar uma alavancagem financeira acima do previsto anteriormente, em 10,5x, acima do patamar de 4,5x previsto para 2023.

“O plano de transformação da Casas Bahia é coerente, afinal, é necessário corrigir o fluxo de caixa da companhia. Contudo ventos contrários, como o aumento de spread de dívidas da companhia, podem dificultar a execução de estratégia no curto prazo”, avaliou a corretora em relatório.

Para a Genial, a possibilidade de uma nova oferta de ações pelo grupo não deveria ser descartada, após a última captação de R$ 622 milhões em follow on que ficou abaixo do esperado (R$ 981 milhões).

A elevada alavancagem da varejista é um dos principais pontos de atenção de analistas.

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Em janeiro do ano passado, a possibilidade de uma recuperação judicial chegou a ser tema de análises de mercado, com um relatório da XP comentando o risco decorrente de uma provisão trabalhista de R$ 1,2 bilhão, apontada no balanço do terceiro trimestre de 2022.

Os analistas da Genial citaram, no relatório de ontem, que a maior concentração dos CRIs em bancos parceiros tornava a renegociação da dívida aprovada hoje como o cenário de fato mais provável. “Ninguém estaria interessado no cross-aceleration que a antecipação poderia culminar. A renegociação da dívida é o caminho mais benéfico para ambas as partes”, observaram.

Em janeiro, a recuperação judicial) de outro grande grupo varejista do Brasil, a Americanas (AMER3), provocou abalos no mercado de crédito privado após a revelação da suspeita de uma fraude contábil da ordem de R$ 20 bilhões, que atingiu muitos detentores de debêntures da companhia.

O persistente nível de elevado endividamento das famílias e o menor apetite de crédito para alavancar o consumo devem, segundo os analistas da Genial, limitar a recuperação do setor e das receitas da Casas Bahia, para as quais eles projetam uma melhora gradual apenas a partir de 2025.

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A Casas Bahia não respondeu imediatamente a um pedido de comentários da Bloomberg Línea.

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Sérgio Ripardo

Jornalista brasileiro com mais de 25 anos de experiência, com passagem por sites de alcance nacional como Folha e R7, cobrindo indicadores econômicos, mercado financeiro e companhias abertas.