Bloomberg Línea — A Saab Brasil anunciou em setembro que inaugurou sua segunda linha de produção de fuselagens traseiras do caça Gripen em São Bernardo do Campo, na Grande São Paulo, dobrando a capacidade para até 16 unidades por ano.
O investimento adicional, que vai além das obrigações contratuais de compensação do contrato com a Força Aérea Brasileira (FAB), consolida a planta brasileira como fornecedora global da fabricante sueca, atendendo mercados local e internacional.
Em entrevista à Bloomberg Línea, Peter Dölling, presidente da Saab Brasil, afirma que o país agora integra o seleto grupo de nações capazes de fabricar caças supersônicos.
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“A inauguração da segunda linha de produção da fuselagem traseira, uma das estruturas mais complexas do Gripen, consolida a posição do Brasil como hub estratégico para aviação de defesa”, afirmou o executivo.
Em uma década desde a assinatura do contrato de R$ 39,3 bilhões com a FAB para aquisição de 36 caças Gripen em 2014, o programa treinou 350 profissionais brasileiros em desenvolvimento de caças, testes de voo, produção e manutenção, segundo a Saab.
A operação atual emprega aproximadamente 110 pessoas na produção de aeroestruturas em São Bernardo do Campo, enquanto o ecossistema Gripen na Embraer, em Gavião Peixoto, interior paulista, abriga a primeira e única linha de produção do Gripen E (caça de geração 4.5) fora da Suécia.
A fábrica brasileira utiliza as mesmas ferramentas e tecnologias da matriz em Linköping, Suécia, segundo a empresa. O processo digital eliminou documentação em papel no chão de fábrica, e todas as atualizações são implementadas em tempo real.
A unidade produz cone de cauda, freios aerodinâmicos, fuselagem dianteira e traseira que equipam aeronaves montadas em ambos os países.
São Bernardo do Campo também opera um centro de excelência em sensores e radares, com laboratório dedicado à manutenção de sistemas de guerra eletrônica e radar AESA do Gripen.
A capacidade foi expandida para incluir manutenção de radares meteorológicos civis em todo o Brasil. A empresa brasileira AEL Sistemas desenvolve e produz três displays avançados de cabine para o programa.
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Dölling indica que a Saab Brasil pode evoluir de parceiro de manufatura para codesenvolvimento de futuras tecnologias de defesa.
A estratégia de longo prazo prevê parcerias com empresas brasileiras em aplicações militares e civis, incluindo veículos aéreos tripulados e não tripulados para combate, vigilância, inteligência e mapeamento.
Confira entrevista com o presidente da Saab Brasil, editada para fins de clareza.
Quais componentes do Gripen são fabricados no Brasil hoje?
Na Saab Brasil já fabricamos grandes aeroestruturas do Gripen, incluindo cone de cauda, freios aerodinâmicos, fuselagem dianteira e traseira. Esses componentes são fornecidos tanto para a Suécia quanto para o Brasil, tornando este local o fornecedor global da Saab. A inauguração da segunda linha de produção da fuselagem traseira, uma das estruturas mais complexas do Gripen, consolida a posição do Brasil como hub estratégico para aviação de defesa.
Quantos empregos especializados a segunda linha de produção criou em São Bernardo do Campo?
Aproximadamente 110 pessoas estão envolvidas na linha de produção de aeroestruturas na Saab Brasil. Destas, cerca de 50 são da área de produção (operadores, supervisores, gerentes) e as demais são da equipe de apoio (engenharia de manufatura, suprimentos, logística, qualidade, fiscal, entre outras áreas). É importante destacar que a fabricação de uma aeronave supersônica é fundamentalmente diferente da produção seriada automotiva - é um processo mais meticuloso e manual, impulsionado pela extrema precisão exigida na indústria aeroespacial.
Quantas aeronaves Gripen foram entregues à FAB?
Até agora, dez aeronaves Gripen foram entregues à Força Aérea Brasileira. A inauguração da segunda linha de produção não faz parte das obrigações de compensação, mas um investimento adicional que demonstra a maturidade da fábrica brasileira e sua integração na cadeia de suprimentos global da Saab.
Por que isso é considerado a maior transferência de tecnologia de defesa do Brasil?
Em 2025, o Programa Gripen celebra uma década da maior transferência de tecnologia já realizada pela Saab no Brasil, treinando 350 profissionais brasileiros em desenvolvimento de caças, testes de voo, produção e manutenção. Este marco colocou o país entre um grupo seleto de nações capazes de fabricar aeronaves de caça supersônicas.
Com capacidade duplicada para até 16 fuselagens traseiras por ano, há discussão sobre pedidos adicionais?
O aumento da capacidade de produção e a discussão de pedidos adicionais são dois assuntos separados. Nossa capacidade expandida fortalece o papel da Saab Brasil dentro do sistema de produção global da Saab. Qualquer questão sobre aeronaves adicionais é para a FAB responder.
Como o Gripen brasileiro se compara com caças de países vizinhos?
O Gripen representa uma nova geração de poder aéreo na América Latina. Combina sensores avançados, sistemas assistidos por inteligência artificial e capacidades superiores de guerra eletrônica. Ao contrário de aeronaves mais antigas na região, o Gripen oferece maior versatilidade, processamento de dados mais rápido e custos operacionais mais baixos, com arquitetura adaptável para atualizações contínuas.
O Brasil pode competir por contratos internacionais do Gripen de forma independente?
Não. Somos parte da cadeia de suprimentos da Saab globalmente, e todos os contratos passam pela Suécia. A fábrica da Saab Brasil produz aeroestruturas que equipam aeronaves montadas tanto na Suécia quanto no Brasil, garantindo um papel duradouro para a indústria brasileira no programa.
O Brasil pode se tornar um hub de exportação regional?
Sim. Nosso objetivo é consolidar a Saab Brasil como o hub regional para o Gripen na América do Sul, aproveitando o conhecimento e a força de trabalho altamente qualificada desenvolvidos para expandir em novas oportunidades em defesa e no setor civil.
O Brasil evoluirá para parceiro de codesenvolvimento de futuras tecnologias de defesa?
Queremos ir além do Gripen, e já temos as bases estabelecidas. O local de São Bernardo do Campo é reconhecido como centro regional de excelência, com laboratório dedicado ao radar AESA e sistemas de guerra eletrônica do Gripen, além de outras tecnologias avançadas. Vemos claro potencial para evoluir da fabricação para o codesenvolvimento de futuras tecnologias de defesa em parceria com empresas brasileiras.
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