Bancos deveriam olhar mais para projetos ‘multifamily’, diz CEO do GRI Institute

Para Gustavo Favaron, que comanda o grupo empresarial de real estate, o modelo de prédios 100% voltados ao aluguel deve ganhar espaço nos próximos anos no Brasil, enquanto os preços dos imóveis ficam mais inacessíveis para a população

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Bloomberg Línea — Apesar de a taxa básica de juros estar em um dos patamares mais elevados da história recente, em duas décadas, a compra de um imóvel residencial hoje pode ser uma decisão acertada, na visão de Gustavo Favaron, CEO do GRI Institute, grupo empresarial voltado para o setor imobiliário.

“Vai ficar cada vez mais caro morar no Brasil. Compre um imóvel agora se puder”, disse o executivo em entrevista à Bloomberg Línea. “Enquanto isso, o preço do aluguel está subindo muito e vai continuar a aumentar”, acrescentou.

Em sua avaliação, como parte do mesmo fenômeno, a tendência é que o modelo de negócios conhecido como “multifamily”, de prédios 100% voltados para locação e geridos por uma única empresa, deve crescer de forma substancial no país.

Favaron lembrou que, nos últimos anos, houve um movimento de subida de preços dos imóveis, decorrente de fatores como encarecimento dos terrenos, de materiais de construção e da mão de obra.

“A capacidade de compra da população com base na renda não acompanhou a valorização dos imóveis, enquanto o financiamento imobiliário, que é uma ferramenta fundamental para o setor, se deteriorou nos últimos anos.”

Nesse contexto e como consequência, ele apontou que o aluguel segue em expansão no país: os domicílios no país nessa condição passaram de 18,4% em 2016 para 23% em 2024, segundo dados recém-divulgados pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).

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“O [programa federal] Minha Casa Minha Vida foi muito importante, mas não o suficiente. O déficit habitacional não diminuiu, hoje as pessoas estão sendo obrigadas a alugar e não vejo o cenário mudando nos próximos anos.”

De acordo com o executivo, o modelo multifamily não chega a representar 1% do mercado residencial brasileiro. Em contrapartida, em mercados mais maduros, a maior parte das moradias está sob gestão dessa modalidade, em decorrência do tamanho da demanda para aluguel.

Ele citou como exemplo de avanço no segmento a norte-americana Greystar, que possui mais de um milhão de unidades sob gestão globalmente na modalidade.

O Country Manager da companhia no Brasil, Vitor Costa, disse, em entrevista à Bloomberg Línea em maio do ano passado, que tem como meta atingir 10.000 apartamentos em 40 edifícios nos próximos cinco anos no Brasil.

Favaron disse que o segmento de multifamily ainda está “engatinhando” no Brasil, mas isso deve mudar em breve.

“A minha aposta é que nos próximos cinco anos esse será um mercado gigantesco no país. Vai começar a fechar a conta para uma empresa construir um prédio e fazer toda a sua gestão”, afirmou.

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O desafio, entretanto, reside no financiamento desses projetos.

Comparado a um investimento conservador, como o CDB, por exemplo – em um cenário de Selic a 15% ao ano –, bancos em geral acabam não tendo apetite por projetos multifamily, segundo o executivo.

Ele disse que isso acontece mesmo que os riscos desses empreendimentos sejam equivalentes aos de construções tradicionais.

Por outro lado, Favaron afirmou acreditar que fundos e bancos devem olhar cada vez mais para a modalidade para alocação de capital. “Essa situação [da Selic] é temporária e o mercado imobiliário é feito de ciclos. Quando a taxa de juros cair para 9% [ao ano], aqueles que tiverem se antecipado vão sair na frente.”

Mercado em expansão

Atualmente, players relevantes do segmento vêm ampliando a aposta no modelo de negócio, como a Greystar, a gigante global Brookfield e a Vila 11, empresa nacional que conta com investimento da gestora americana Evergreen.

Segundo Favaron, a vacância em multifamily está em cerca de 10% hoje no Brasil. “O tíquete médio tem crescido acima da inflação e do preço das lajes corporativas. Na minha visão, os bancos precisariam estar abertos [à modalidade]”, disse.

Em sua avaliação, o mercado residencial de aluguel está muito aquecido e os desafios referentes a burocracias do inquilinato foram superados, mas, atualmente, fundos de grande porte só conseguem fazer a estruturação do financiamento de projetos multifamily pela relação que possuem com os grandes bancos.

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No geral, em sua avaliação, instituições financeiras não entendem o mecanismo como um empréstimo.

Paralelamente, ele apontou que o funding para projetos tradicionais – como poupança e FGTS - tem ficado cada vez mais limitado diante da desaceleração das captações.

“O crédito para o setor imobiliário está mais escasso. Temos, como mercado, que ir para além do diálogo. Acredito o governo poderia ter linhas de crédito para multifamily, como ocorre em Nova York”, disse.

Diferentemente de um edifício residencial tradicional, que tem como principal métrica para financiamento com os bancos o Valor Geral de Vendas (VGV), empreendimentos multifamily têm como critério central a soma dos aluguéis.

“O risco não é maior do que um prédio que é construído para venda”, disse Favaron.

Em mercados como Estados Unidos e Inglaterra, o segmento é amplamente disseminado e isso acontece também em emergentes como o Chile, que tem um mercado multifamily dez vezes maior do que o Brasil, afirmou.

“O mercado imobiliário é absolutamente simples e previsível. Com o uso da tecnologia, grandes fundos estão apostando nessa tendência porque é lucrativa.”

“Quando olhamos para aluguel, o que acontece em grandes capitais do mundo, inclusive no México, que é parecido com o Brasil, o que vemos é que o preço do aluguel residencial aumentou absurdamente.”

O executivo alertou também para a limitação da oferta de crédito no Brasil, algo que chamou de estrutural. “Lá fora, os players têm dezenas de provedores diferentes. Aqui, a competição se limita a cinco [instituições]”, disse.

A virada de chave globalmente, segundo Favaron, aconteceu quando a dinâmica do mercado residencial “apertou” não só para consumidores mas também para incorporadoras, que passaram a enfrentar desafios de vendas.

“Quem não estava no Minha Casa Minha Vida agora está. A mudança vem eventualmente, na dor ou no amor”, disse.

“A escassez [de moradia] é tamanha que o potencial de demanda de multifamily é de dezenas de milhares de unidades nos próximos anos no Brasil. Estamos falando de um céu azul”, avaliou sobre o que apontou como perspectivas do segmento.

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