Para BlackRock, América Latina tem ‘o que é preciso’ para se beneficiar da IA

Em entrevista à Bloomberg Línea, o diretor e estrategista para a América Latina da maior gestora do mundo, Benjamin Souza, aponta oportunidades de investimento na região por meio de sua relevância na cadeia de suprimentos de novas tecnologias

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Bloomberg Línea — Em meio ao avanço global da inteligência artificial (IA), a BlackRock acredita que a América Latina não está à margem dessa revolução tecnológica. Pelo contrário.

Para Benjamin Souza, managing director e estrategista para LatAm, a região desempenha um papel fundamental na cadeia de valor da nova economia digital, apesar de não ser o epicentro da inovação em software ou semicondutores.

“Temos exatamente o que é necessário. Temos alguns minerais raros, aço, alumínio, cobre, todas essas peças necessárias para a refrigeração, para a produção de eletricidade, para a transmissão”, disse Souza em uma entrevista à Bloomberg Línea durante recente visita à Colômbia.

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Além de seu papel como fornecedora de matérias-primas essenciais para essa nova infraestrutura, o estrategista destacou que a América Latina está bem posicionada na reconfiguração das cadeias de suprimentos globais, especialmente em face da dissociação comercial dos Estados Unidos com a China e do aumento do nearshoring (movimento de proximidade de cadeias de produção com mercados consumidores).

“O mundo está tentando separar essas cadeias de dependência da China e, por isso, está à procura de novos fornecedores de algumas peças. Acredito que, sim, em geral, você verá algumas coisas interessantes na região“, explicou.

Rali e trade eleitoral

Além do impulso que a IA proporcionou a mercados como o dos EUA, outra notícia de 2025 tem sido os retornos proporcionados pelos países latino-americanos.

A bolsa da Colômbia, por exemplo, teve valorização de 40% em dólares. Souza ofereceu duas explicações principais: fluxos de capital e valuations.

“Parte dos retornos sempre será explicada pelos fluxos. E parte dos retornos será explicada pelos fundamentos. E o que temos diante de nós é todo esse ruído sobre as políticas do novo governo dos EUA“, explicou.

As tarifas impostas pela Casa Branca a outros blocos econômicos e países, especialmente à Ásia e à Europa, redirecionaram o interesse para mercados menos penalizados, como a América Latina.

“A América Latina foi a grande vencedora disso. O México teve 0% de reciprocidade e os outros países latino-americanos tiveram 10%“, ressaltou Souza.

Esse diferencial tarifário melhorou a competitividade regional em relação a blocos como a Europa ou a Ásia, que enfrentam tarifas de 15% a 39%.

LatAm ainda está barata

Em sua avaliação, “a América Latina não parece tão ruim” nessas comparações. Nesse contexto, os baixos múltiplos de avaliação também chamaram a atenção de investidores. “Agora está menos barato, mas ainda está barato”, disse Souza.

Além dos fluxos para a região, o diretor de investimentos da BlackRock se disse cético quanto às interpretações de que há espaço para um trade eleitoral em países como o Chile ou a Colômbia.

Para Souza, além da expectativa de um resultado nas próximas eleições, o aumento dos preços dos ativos em tais mercados é explicado mais pelo fato de os investidores globais estarem se voltando para mercados com ativos baratos.

Esse processo ocorre em meio a uma reavaliação geral de oportunidades fora dos Estados Unidos após as mudanças tarifárias do novo governo.

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Colômbia e México: altas taxas

Em meio ao desempenho regional positivo, Souza disse identificar um freio comum para duas das principais economias da região: as altas taxas de juros.

O executivo explicou que o custo do dinheiro não só representa um ônus fiscal para os governos da Colômbia e do México mas também gera um forte desestímulo à tomada de riscos no setor privado. “Quando você tem uma taxa alta, qual é o incentivo para assumir riscos?”, disse ele.

Em sua análise, essa situação sugere que os bancos centrais de ambos os países deveriam considerar uma maior flexibilização. “Talvez cada país deva reduzir essas taxas, porque isso ajuda a economia de várias maneiras”, disse.

Argentina: expectativas cautelosas

Com relação ao caso argentino, Souza disse reconhecer os esforços do governo de Javier Milei para romper com o modelo peronista e corrigir desequilíbrios históricos. “A Argentina é um lugar interessante com um problema político”, disse ele.

As reformas fiscais e os cortes de gastos geraram otimismo, mas a chave estará em sua execução.

“Estamos apenas tentando entender os resultados disso”, explicou o executivo, que observou que o desafio é reintegrar a Argentina aos mercados globais após anos de inadimplência e controles de capital.

Em sua avaliação, a disciplina fiscal demonstrada pelo governo Milei é uma exceção positiva no contexto global. “Em todo lugar que você olha, há um problema fiscal, exceto na Argentina. Portanto, é um sinal de que é preciso, pelo menos, dar uma olhada”, disse.