O impacto das tarifas de Trump ao Brasil por setores e empresas, na visão do mercado

Nas últimas 48 horas, economistas e analistas passaram a montar cenários e impactos das taxas comerciais de 50% anunciadas às exportações do país aos EUA; veja a seguir um resumo dos efeitos projetados por bancos e gestoras

Navios que transportam carga para o Porto de Santos: impacto projetado em exportações (Foto: Patricia Monteiro/Bloomberg)
11 de Julho, 2025 | 07:55 PM
Últimas cotações

Bloomberg Línea — A semana que chega ao fim registrou a maior queda do Ibovespa desde dezembro de 2022: 3,59%. O dólar subiu 2,28% no período.

Esse desempenho foi reflexo da decisão do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, de programar tarifas de 50% sobre todos os produtos exportados do Brasil para os Estados Unidos a partir de 1º de agosto, em decisão anunciada no fim da tarde de quarta-feira (9).

PUBLICIDADE

Desde então, estrategistas, economistas e analistas se dedicam a montar cenários para a disputa política, econômica e comercial e a estimar os impactos prováveis em variáveis que vão de juros e câmbio aos preços de ativos.

Cálculos preliminares avaliam que o impacto das tarifas pode ser mais controlado do que fez supor a surpresa inicial – ao menos no cenário macroeconômico.

Leia mais: Jato brasileiro de US$ 60 milhões pode ser a vítima mais valiosa das tarifas de Trump

PUBLICIDADE

Isso porque a participação dos EUA no mix de exportações brasileiras é grande - cerca de 12% -, mas essa pauta está concentrada em commodities, que poderiam ser redirecionadas a outros mercados dada a demanda global por produtos como alimentos agrícolas.

Não significa que riscos não estejam na mesa, por outro lado: existe a possibilidade de escalada do conflito, com impacto ainda maior à economia brasileira.

Em meio ao imbróglio, os mais vulneráveis são as empresas exportadoras: a Embraer (EMBR3) tem sido apontada como uma mais afetadas, dado o volume de receitas que é obtido com vendas para companhias aéreas americanas.

PUBLICIDADE

Como reflexo desse entendimento por uma parte do mercado, as ações recuaram 8,44% nos dois pregões depois do anúncio de Trump. Mas ainda acumulam valorização da ordem de 30% e 85% neste ano e em 12 meses, respectivamente.

Veja abaixo as perspectivas de analistas para a economia brasileira e entenda quais setores e empresas podem ser mais afetados por tarifas de 50%.

Impacto macro ‘limitado’

Os Estados Unidos são o segundo maior parceiro comercial do Brasil e são o destino de 12% das exportações brasileiras – com impacto de 1,7% do Produto Interno Bruto (PIB). Trata-se de número que, apesar de relevante, é considerado “relativamente baixo” na análise do BTG Pactual.

PUBLICIDADE

“No geral, o impacto econômico direto das tarifas anunciadas sobre o Brasil é provavelmente limitado, embora alguns setores e produtos possam ser desproporcionalmente mais afetados”, escreveram os analistas, liderados por Carlos Sequeira, em relatório nesta semana após o anúncio.

Outras avaliações apresentam avaliações semelhantes.

O impacto macroeconômico das tarifas deve ser “marginal e gerenciável”, segundo Gabriel Barros, economista-chefe da ARX, gestora com R$ 42 bilhões sob gestão.

“Embora não seja desprezível, essa parcela não é substancial o suficiente para desencadear choques macroeconômicos significativos”, afirmou em relatório.

O economista avalia que um dos fatores que limita os efeitos das tarifas americanas é o perfil de exportações do Brasil para os Estados Unidos.

Ainda que os EUA sejam o segundo principal destino dos produtos brasileiros, as exportações estão concentradas em commodities e com menor parcela de itens de maior valor agregado (uma exceção é a Embraer).

“Portanto, o impacto direto dessas tarifas tende a ser limitado pela forte demanda global por commodities e pela capacidade de [o país] redirecionar parcialmente esses produtos para outros mercados”.

A expectativa da ARX é que o PIB caia menos de 0,2% diante das medidas. O Goldman Sachs, por outro lado, estima um impacto maior, de 0,3 a 0,4 ponto percentual no PIB.

Leia também: Nova tarifa de Trump ao Brasil pode tirar até 0,4 ponto do PIB, diz Goldman Sachs

Segundo Alberto Ramos, diretor de pesquisa macroeconômica para a América Latina do Goldman Sachs, a carta enviada ao Brasil “é a mais singular entre as que foram recentemente remetidas a diversos países” com ameaças tarifárias.

O motivo é a inversão de foco do documento, que aborda aspectos políticos em vez de uma caracterização da dinâmica comercial entre os países.

Logo nas primeiras linhas de sua carta aberta ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, divulgada na noite de quarta-feira (9), Trump criticou o julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro por tentativa de golpe de Estado.

A grande preocupação de analistas é que a economia sofra um golpe mais duro diante de uma possível retaliação do governo brasileiro.

O risco seria elevar a “temperatura” da disputa, prejudicando a tendência de queda da inflação e dos juros futuros.

Para Ramos, uma retaliação do governo Lula poderia gerar “um impacto negativo ainda maior na atividade econômica brasileira e na inflação”.

“Não está claro se, como e quando o Brasil retaliaria. A inclinação política pode ser nesse sentido, mas prevemos que os exportadores locais pressionarão o governo a reduzir a tensão”, avaliou o economista em relatório.

Embraer, Suzano e WEG na mira

As exportadoras, por sua vez, são as grandes prejudicadas no curto prazo. A mais citada como fonte de preocupação é a Embraer (EMBR3), que tem uma das maiores fatias de receita atreladas aos Estados Unidos. O número varia de 46% na estimativa do Itaú BBA a 23,8% nos cálculos da XP.

Os analistas do BBA estimam impactos negativos nos resultados de curto prazo e nos múltiplos da empresa, mas apontam uma luz no fim do túnel: a aeronave E175-E1. Os EUA ainda não tem um substituto claro para o modelo de jato da Embraer utilizado para as rotas domésticas.

O UBS BB, por sua vez, estima US$ 70 milhões em custos para a Embraer devido às novas tarifas, com impacto de 13% na receita de 2026 para cada 10% de alta nas taxas.

A Suzano (SUZB3) é descrita pelo BTG Pactual como a companhia mais exposta à nova tarifa de 50%, se de fato implementada em agosto.

A empresa de celulose não abre os números de sua exposição aos EUA, mas a estimativa do banco é que cerca de 19% de sua receita venha da América do Norte, com a maior parte do montante ligada aos EUA.

“O principal desafio agora será se a empresa conseguirá redirecionar esse volume para outras regiões, especialmente considerando que a demanda global por celulose — principalmente na China — permanece reduzida", escreveram os analistas.

“Do lado positivo, os preços atuais da celulose em torno de US$ 500/tonelada parecem próximos de um piso, o que deve limitar novas quedas.”

A WEG (WEGE3) também está entre as empresas com maior possibilidade de sofrer com as novas tarifas de Trump, mas apenas em parte: a produção da companhia é dividida entre Brasil, México e EUA, e a estimativa é que uma fatia limitada de 30% do que é vendido nos Estados Unidos venha do Brasil.

O Itaú BBA estima que a participação brasileira das vendas, a única exposta às novas tarifas, deve representar 7% da receita. E também enxergou alternativas para a empresa buscar proteção contra o impacto tarifário.

“Acreditamos que pode haver efeitos mitigadores, já que a WEG poderia realocar a produção do Brasil para outros centros de produção (por exemplo, México), reduzindo a exposição às tarifas mais altas”, disseram analistas do BBA.

Tupy (TUPY3) e Mahle Metal Leve (LEVE3) também estão entre as citadas como potencialmente prejudicadas no novo cenário.

Minerva e Jalles preocupam no agro

O agronegócio merece um capítulo à parte pela relevância das cadeias agrícolas que tem maior ligação aos Estados Unidos, como é o caso dos exportadores de carne bovina, café, suco de laranja, etanol, açúcar e produtos florestais.

Entre as companhias listadas, a maior preocupação está com a Minerva (BEEF3), que tem aproximadamente 15% de sua receita bruta associada ao mercado dos EUA, segundo cálculos da equipe de research da XP.

Os analistas acreditam que a companhia pode redirecionar volumes para outros mercados, mas “isso provavelmente ocorrerá em detrimento das margens”, dado que os EUA são um mercado com margens mais altas.

“A Minerva embarcou cerca de R$ 800 milhões em estoques para os EUA no 1T25, que podem se beneficiar de preços mais altos após a tarifa, mas provavelmente não o suficiente para compensar integralmente a possível queda de volume”.

Outra empresa que preocupa é a Jalles (JALL3), uma vez que a maior parte de suas exportações de açúcar orgânico – cerca de 11% da receita projetada para 2024/25, segundo a XP – é direcionada aos EUA.

A notícia é marginalmente positiva para a JBS (JBSS3) na visão dos analistas, dado que a empresa poderia se beneficiar de preços mais fortes em suas operações de carne bovina nos EUA e na Austrália.

Leia também: Eurasia vê diálogo difícil do Brasil com Trump por cobrança política ‘inegociável’

E as demais commodities?

A expectativa do BTG Pactual é que o setor de minério de ferro e aço seja pouco impactado na prática dado que já está sob a tarifa de 50% aplicada para a importação do aço, anunciada anteriormente.

Uma das companhias potencialmente afetadas seria a CSN (CSNA3), que têm 5% de seus envios de aço direcionados aos Estados Unidos.

A Vale (VALE3), gigante da mineração mundial, teria praticamente zero exposição aos EUA, com apenas 1% das receitas com aço atreladas aos EUA. As ações da empresa subiram 3,63% nos dois pregões depois do anúncio de Trump.

Em outro setor extrativista, as vendas de petróleo e produtos derivados representaram 18,8% de todas as exportações do Brasil para os EUA, segundo cálculos de analistas do BTG Pactual.

Ainda assim, os analistas projetam impactos limitados para o setor, devido à habilidade do setor de diversificar o fluxo de exportação.

No caso da Petrobras (PETR4), a estimativa é que as medidas de Trump tenham impacto neutro, dado que a estatal tem apenas 4% da exportação de petróleo direcionada aos Estados Unidos. A ação preferencial (PETR4) subiu 1% no acumulado de duas sessões desde o anúncio.

“Entretanto, caso haja reciprocidade tarifária do lado brasileiro, esperamos um impacto ligeiramente negativo na Petrobras, pois isso poderia aumentar os custos de importação para as refinarias nacionais, e um impacto neutro para os independentes, já que atualmente eles não importam petróleo e produtos combustíveis”, afirmaram os analistas em relatório.

Leia também

Agro sob risco: tarifa de 50% dos EUA ameaça exportações e eleva custos no Brasil

Beatriz Quesada

Jornalista especializada na cobertura econômica. Formada pela USP, escreve sobre mercados, negócios e setor imobiliário. Tem passagens por Exame, Capital Aberto e BandNews FM.