Bloomberg Línea — Enquanto Wall Street enfrenta quedas e o S&P 500 acumula perdas no ano, uma área menos visível do mercado tem ganhado destaque: as small caps da América Latina.
Essas ações, tradicionalmente vinculadas a empresas locais de consumo e de média capitalização de mercado, tornaram-se um dos segmentos de melhor desempenho, com retornos de dois dígitos.
Até o momento, em 2025, os índices de ações de pequena capitalização na região superaram os índices de referência globais.
Em dólares, de acordo com dados da Bloomberg, o MSCI Emerging Markets Latin America Small Cap Index subiu 24,86%, enquanto o S&P Latin America SmallCap Index subiu 34,66%.
Em contrapartida, os índices de referência da região tiveram retornos um pouco menores: o MSCI Latin America subiu 17,25%, o S&P Latin America 40 subiu 17,90% e o S&P 500 registrou uma queda de -3,93%.
Jennie Li, analista da Bloomberg Intelligence, observa que “o forte desempenho das ações latino-americanas em 2025 está ligado principalmente à dinâmica global geral, impulsionada por uma combinação de rotação contra os EUA (especialmente em tecnologia), um dólar mais fraco e valuations baratos em toda a região”.
Em entrevista à Bloomberg Línea, a analista explica que, historicamente, os índices Latam Large & Mid Cap e Small Cap apresentam uma alta correlação.
“Mas o desempenho superior das small caps este ano pode ser atribuído, em grande parte, à diferença na exposição setorial”, diz Li.
A analista lembra que o setor de energia tem um peso menor, de apenas 4% nas small caps, em comparação com 11% nas empresas do Latam Large & Mid Cap.
Essa ponderação ocorre em um momento em que os preços do petróleo caíram 20% no acumulado do ano, especialmente no mês passado, após as tarifas recíprocas de Donald Trump, o aumento da oferta da Opep e o impacto de uma desaceleração econômica mais lenta sobre a demanda de energia.
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Empresas com fundamentos sólidos
Entre as ações com melhor desempenho nos índices compilados pela MSCI e pela S&P estão empresas do México, Chile, Peru e Brasil: Assaí (ASAI3); PagSeguro (PAGS); StoneCo (STNE); Gentera (GENTERA*), Mall Plaza (MALLPLAZ), Quálitas Controladora (Q*), Cia. Minas Buenaventura (BVN), Regional SAB (RA) e Lojas Renner (LREN3) estão entre um grupo de empresas com ganhos acumulados no ano de mais de 20%.
Esse desempenho foi sustentado por sólidos resultados financeiros, ajustes estratégicos e maior atenção do mercado para emissores nacionais com potencial de alta.

Dentro do universo das small caps, a StoneCo (STNE) subiu 64,69% em 2025, destacando-se por sua expansão operacional e melhor lucratividade. O Barclays prevê que “a empresa está no caminho certo para gerar margens Ebitda de 54% até 2026, apoiada por eficiências estruturais”.
O Assaí (ASAI3) subiu 64,6% até o momento em 2025, impulsionado por uma estratégia focada na lucratividade, geração de fluxo de caixa e redução da dívida. De acordo com o JPMorgan, “o objetivo é reduzir a dívida líquida até 2025 e atingir cerca de 2,6x ND/EBITDA até o final do ano”, à medida que a empresa consolida seu modelo de expansão com até 10 novas lojas.
A PagSeguro (PAGS), por sua vez, avançou 52,88% no ano e, apesar de manter uma recomendação neutra, o JPMorgan reconhece que “é o fornecedor mais conhecido de terminais POS de baixo custo no Brasil”.
Outra empresa que apresentou resultados melhores foi a Gentera, uma empresa mexicana de serviços financeiros, com alta de 42% no acumulado do ano.
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De acordo com Ernesto Gabilondo e Mario Perry, analistas do Bank of America (BAC), os resultados do primeiro trimestre “refletem um ambiente operacional saudável e uma melhoria notável nos fluxos de receita não relacionados a crédito, particularmente em taxas e comissões e no mercado”.
Brian Morton, analista do Barclays, acrescenta que a empresa “está evoluindo em direção ao limite superior de sua faixa de lucros projetada para 2025, com espaço adicional para superar as expectativas graças à melhoria da eficiência e da qualidade dos ativos”.
Ele também reconheceu que a empresa mantém uma abordagem disciplinada em relação às despesas, apesar do crescimento de sua carteira de empréstimos.
No caso da Quálitas, o BofA explicou que “o trimestre foi destacado por uma combinação de custos de sinistros mais baixos e sólidas receitas financeiras”.
Isso permitiu que as margens se expandissem significativamente. Além dos números, o BofA enfatiza que “a empresa continua a apresentar rentabilidade superior em relação a seus comparáveis no setor de seguros regional”.
A Mallplaza, por sua vez, é bem avaliada pelos analistas do JPMorgan, dado o potencial de crescimento da empresa “por meio de expansões e de seu histórico de fusões e aquisições”.
Este ano, a empresa apresentou uma estratégia que combina crescimento orgânico e aquisições, com foco na melhoria de seu mix comercial e na experiência do consumidor no Chile, Peru e Colômbia. Este ano, a empresa está executando projetos de expansão de 225.000 m² nos dois primeiros países.
Li lembra que “o índice de pequena capitalização é mais ponderado em relação às empresas de consumo, que tendem a ser mais sensíveis às taxas de juros”, portanto, em um contexto em que as taxas tendem a cair gradualmente, “isso poderia ajudar a dar algum suporte às ações de pequena capitalização.”
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Valuations atrativos
Este ano, os mercados acionários da América Latina tiveram um desempenho global superior, com ganhos de mais de 20%, medidos em termos de dólares.
A recuperação foi impulsionada por uma combinação de fatores locais, tais como avaliações atraentes ou a preparação para os ciclos eleitorais, e um ambiente externo mais favorável para os mercados emergentes, que impulsionaram as empresas da região.
Uma dessas empresas é a Lojas Renner, a maior varejista de moda do Brasil, com alta de 20% no acumulado do ano. Na semana passada, os analistas da XP Securities atualizaram sua recomendação após um ano com uma visão mais cautelosa.
Em seu relatório, eles indicaram que “a estratégia de preços está agora mais bem alinhada com as expectativas dos consumidores” e que eles veem “riscos positivos na dinâmica da margem e na eficiência operacional”.
A ação também está se beneficiando de um ambiente macroeconômico menos adverso no Brasil e de reformas que podem apoiar o consumo no varejo no segundo semestre do ano.

O MSCI classifica as empresas com baixa capitalização de mercado, mas que ainda representam uma parte significativa do valor total de mercado da região, como small cap, enquanto a S&P usa critérios de tamanho de mercado, flutuação e liquidez.
Isso permite a construção de cestas representativas de empresas menores, mas com atividade relevante em seus mercados.
Um deles é o banco mexicano Regional SAB que, segundo os analistas do JPMorgan, “mostra um fortalecimento progressivo de sua capitalização, com perspectivas de chegar a 14% até meados do ano, o que reforça seu perfil de solidez financeira no setor bancário mexicano de médio porte”.
Além disso, eles projetam um crescimento da carteira de 10 a 15%, impulsionado por cortes nas taxas e maior demanda de crédito.
De modo geral, os índices de empresas de pequena capitalização estão capturando histórias de crescimento local, dinamismo operacional e oportunidades de valor.
Li disse à Bloomberg Línea que, enquanto o cenário macroeconômico permanecer estável, o desempenho positivo poderá continuar.
Os riscos seriam “uma grave crise econômica global, como uma escalada das tensões comerciais, uma recessão global ou um evento que renove o sentimento de aversão ao risco e leve os investidores a buscar ativos mais seguros fora dos mercados emergentes”.
Entretanto, ela ressalva que não chamaria essas ações de “porto seguro”, pois há riscos no investimento em small caps, inclusive riscos de liquidez e sensibilidade às condições econômicas domésticas.
Entretanto, ela reconhece que “no ambiente atual, em que os investidores estão preocupados com a desaceleração do crescimento global devido à incerteza tarifária, as ações de pequena capitalização poderiam mostrar maior resistência devido à sua menor exposição a setores relacionados a commodities”.
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