Bloomberg — O presidente Luiz Inácio Lula da Silva quer aprofundar os laços comerciais com a Índia, a nação mais populosa do mundo. A questão, enquanto recebe o primeiro-ministro indiano, Narendra Modi, em Brasília nesta terça-feira (8), é como fazer isso.
Apesar de ambas as nações integrarem o grupo Brics e serem aliadas naturais em áreas como a redução da pobreza e produção de biocombustíveis, a Índia ocupa um lugar bem aquém na lista de parceiros comerciais do Brasil. O comércio total é ofuscado pelo mantido com a China, os Estados Unidos, a vizinha Argentina e até a Alemanha.
É um descompasso que Lula reconheceu na semana passada, quando brincou que tinha acabado de saber que Modi, um hindu devoto, não comia carne. O Brasil é o maior exportador de proteína animal do mundo.
“Nossa relação comercial é só de US$ 12 bilhões, é nada”, disse Lula em um evento. “Então, por favor, providencie uma caixa de queijo. Eu quero colocar na mesa para ele jamais reclamar da comida brasileira e quem sabe começar a comprar o queijo brasileiro.”
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Com as tarifas de Donald Trump que afetam o comércio global, Lula passou meses buscando fortalecer as relações comerciais com mercados além dos parceiros tradicionais.
Agora, ele está determinado a destravar uma relação que nunca decolou totalmente devido a uma série de incompatibilidades e ao fato de que o Brasil e a Índia frequentemente competem na venda de produtos similares.
O comércio acelerou nos últimos anos e dobrou desde que os dois países formaram o bloco Brics com China, Rússia e África do Sul, mais de uma década atrás. O comércio cresceu 24% nos primeiros cinco meses de 2025 em relação ao mesmo período do ano passado, de acordo com o governo brasileiro.
No entanto, a Índia, com 1,4 bilhão de habitantes, ainda permanece um mercado em grande parte inexplorado para o Brasil. É um gigante agrícola, cujo comércio com a China mais que quadruplicou desde o lançamento do Brics em 2009, mostram dados oficiais.
O Brasil busca diversificar as exportações para a Índia além do açúcar e do petróleo bruto, que dominam as vendas atuais. No início deste ano, a Embraer — a terceira maior fabricante de aeronaves do mundo — estabeleceu uma subsidiária em Nova Déli, em uma tentativa de ampliar a presença nos setores de defesa e aviação da Índia.
O Brasil também quer expandir um acordo comercial preferencial que a Índia mantém com o Mercosul.
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O país também identificou uma oportunidade no mercado de gergelim, apesar de a Índia ser um dos principais produtores mundiais da semente.
As exportações de gergelim cresceram significativamente desde a abertura do mercado indiano para o Brasil em 2020, em parte porque o país do sul da Ásia o importa durante a entressafra para atender à demanda interna e honrar compromissos de exportação.
O Brasil também está de olho na expansão das exportações de etanol, agora que a Índia eleva o teor do produto misturado à gasolina.
A Índia atualmente impõe restrições à importação de etanol para proteger a indústria de energia limpa, mas acordos bilaterais sobre o produto estão entre os que o governo Lula pretende fechar com Modi nesta semana.
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“Isso abre um espaço interessante para o Brasil nessa pauta de biocombustíveis“, disse Gustavo Ribeiro, chefe de inteligência de mercado da Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos, a ApexBrasil.
“Eles têm uma grande produção de açúcar, mas a depender do ano, de como está a safra, às vezes eles importam açúcar, às vezes importam o próprio etanol porque faltou açúcar no mercado. Então o Brasil acaba sendo uma boa fonte alternativa ou de açúcar ou de etanol.”
O Brasil enfrenta concorrência nessa frente: o governo Modi vem há meses pressionando por um acordo comercial com o governo Trump para evitar tarifas dos Estados Unidos, enquanto Washington também busca acesso ao enorme mercado indiano para o seu próprio etanol.
Após o encontro desta semana no Rio de Janeiro, Lula passará a presidência rotativa do Brics para Modi. A dupla tem usado o bloco para reforçar as ambições de se tornarem membros permanentes do Conselho de Segurança das Nações Unidas. A meta foi reafirmada no Brasil e provavelmente será uma prioridade para a Índia em 2026.
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