Bloomberg Línea — Poucas regiões no mundo têm um nome tão fortemente associado a vinhos de qualidade quanto Bordeaux, na França.
Mas, por mais que conhecida e valorizada que seja, um pequeno produtor local decidiu ignorar a “apelação” (designação de origem) da região e trabalha para ser visto como algo diferente, com uma marca própria.
“Não somos Bordeaux, somos Le Puy”, disse Harold Langlais, sócio e co-proprietário da vinícola e membro do comitê de enólogos do Château Le Puy durante um almoço recente em São Paulo.
Em visita ao Brasil, Langlais promoveu seus vinhos branco, tintos e rosés, prometeu voltar a exportar um rótulo icônico que está indisponível no país e falou sobre aumentar o número de garrafas exportadas para o mercado da América do Sul.
Leia também: Por que o mercado de vinhos no Brasil pode estar prestes a dar um salto histórico
A diferença central do seu vinho, segundo o produtor, está no método usado para preparar a bebida.
Apesar de estar dentro de Bordeaux, entre as famosas subregiões de Saint-Émilion e Pomerol, e de produzir a bebida desde 1610, Le Puy foi uma das primeiras vinícolas a promover uma produção mais natural da bebida.
A propriedade se destaca pelo compromisso em evitar o uso de produtos químicos sintéticos há mais de quatro séculos, adota uma filosofia de mínima intervenção na bebida, utiliza práticas sustentáveis e incentiva a biodiversidade.
Para Langlais, isso resulta em bebidas mais vivas e interessantes, que se destacam enquanto a famosa região enfrenta uma crise por causa da queda na produção, afetada pelas mudanças climáticas, e da redução na demanda global.
“As pessoas não bebem mais Bordeaux. A região está em crise, e as pessoas acham seus vinhos entediantes”, disse Langlais. “Le Puy é diferente. É como um alimento. É alegria”, disse. Segundo ele, o nome da região no rótulo se torna desnecessário.
“Não precisamos ser vistos como Bordeaux e podemos ser apenas um simples vinho de mesa”, explicou.
Esta posição evoca um movimento ocorrido nos anos 1960 e 1970 na Itália, quando produtores da Toscana rejeitaram as normas das denominações locais, adotaram novas uvas e técnicas e criaram os vinhos que ficaram conhecidos como “Super Toscanos”. Por esse parâmetro, Le Puy seria como um “Super Bordeaux”.

A vinícola é pequena e produz cerca de 200 mil garrafas por ano, segundo Langlais. E o volume tem caído a cada ano também em razão das mudanças climáticas, que têm desafiado a produção na região.
O Château Le Puy exporta seus vinhos para 70 países atualmente, especialmente para o Japão, por causa da associação com o mangá Gotas de Deus, que cita o rótulo. A vinícola vende relativamente pouco para o Brasil.
Segundo Langlais, são enviadas apenas 2.000 a 3.000 garrafas para o país a cada ano. “Mas quem sabe agora não aumentamos para 5.000”, disse.
Para crescer no país, ele disse que a vinícola vai voltar a mandar para o país o rótulo Barthélemy, um dos vinhos mais especiais da marca, que custa 150 euros na França e que deve chegar ao Brasil por um valor em torno de R$ 4.500 com os impostos, segundo a importadora World Wine, que traz os rótulos de Le Puy para o país.
Atualmente, a importadora vende o vinho rosé Château Le Puy Rose Marie por preços a partir de R$ 740, dependendo da safra, e tem também o Château Le Puy Magnum (garrafa de 1,5 litro), por R$ 1.390.
Leia também: Do vinho de entrada ao luxo: como a Concha y Toro se tornou líder em vendas no Brasil
Apesar da aposta em crescimento no mercado sul-americano, o produtor disse que a vinícola enxerga a exportação mais como uma missão do que como uma estratégia comercial.
“Queremos que todos sejam expostos a nossos vinhos. Temos um mercado forte na França e não precisaríamos vender para fora, mas acreditamos que é importante espalhar nosso estilo de vinificação para o mundo”, disse.
Em tempos de guerra comercial e de ameaças de aumento das tarifas sobre bebidas alcoólicas - em particular as francesas - pelo governo de Donald Trump, o produtor diz não se preocupar com a tensão geopolítica.
“A história vai esquecer Trump e ele não vai fazer diferença. Pensamos no longo prazo, e a nossa preocupação real é outra, pois o que vai afetar o futuro é o aquecimento global. Vamos precisar aprender a viver em um mundo instável, complexo e problemático”, afirmou o produtor.
Leia também
Vinho precisa ser caro? ‘Coração do mercado’ no Brasil vai até R$ 50, segundo o GPA