Bloomberg Línea — Uma garrafa do vinho português Quinta do Vale Meão, que recebeu 98 pontos da revista Wine Enthusiast, custa R$ 4.736 no Brasil.
O espanhol Valbuena 5º Año (97 pontos, segundo o crítico Tim Atkin) sai por R$ 3.760,58.
O francês Beaune Clos des Mouches (94 pontos de Atkin) chega ao Brasil por R$ 3.236,16.
Já chileno Clos Apalta 2019 (99 pontos do crítico James Suckling) tem uma etiqueta de R$ 2.257,60.
Se nenhum desses vinhos tem preço acessível para a maioria dos brasileiros, há alternativas para experimentá-los: são os eventos de degustação de vinhos de alta qualidade - e preços elevados - que ganham espaço no mercado nacional e em outros países, em um reflexo do desenvolvimento do mercado.
Uma das degustações premium mais tradicionais do país acontecerá nos próximos dias nas duas maiores capitais do país.
Leia mais: Boa Vista 2.0: nova aposta da JHSF, Fazenda Santa Helena tem casa por até R$ 13 mi
Uma das maiores importadoras do país oferece um tour enófilo por esses e outros 450 dos melhores rótulos do mundo durante um evento em São Paulo e no Rio de Janeiro, por R$ 590. É uma chance um pouco mais acessível de descobrir o sabor que tem um vinho que pode custar quase R$ 5.000, e muitos outros.
“Se a pessoa colocar na ponta do lápis, alguns poucos vinhos que ela tomar no evento já vai dar o valor do ingresso”, defendeu Otávio Lilla, sócio da importadora Mistral, em entrevista à Bloomberg Línea.
Na próxima semana, acontece a 11ª edição do Encontro Mistral, evento bienal que oferece essa degustação - de 4 a 6 de agosto em São Paulo e no dia 7 no Rio de Janeiro.
No evento será possível degustar essas centenas de vinhos premiados de 78 vinícolas de 13 países, muitos deles servidos pessoalmente por proprietários e enólogos de algumas das casas mais prestigiadas do mundo.
Estarão presentes nomes de vinícolas aclamadas globalmente como Vega Sicilia, Château de Beaucastel, Catena Zapata, Biondi Santi e Lapostolle, com vinhos premiados e de alta pontuação internacional.
O Encontro Mistral nasceu em 2003, como uma resposta prática a uma agenda cheia de visitas de produtores internacionais que já vinham ao Brasil para promover seus produtos. Assim como tem acontecido em 2025, as vinícolas estrangeiras enxergavam no país uma oportunidade para aumentar suas exportações.
Leia também: Por que o Brasil entrou no radar de grandes produtores de vinhos do mundo
“Decidimos criar o evento porque naquela época já tinha um número grande de produtores visitando o país. E falamos assim: ‘Se continuarmos nesse ritmo, vamos passar o ano inteiro só recebendo visita de produtor’”, contou Lilla.
Com o Encontro, tornou-se possível reunir a maioria deles em um único local para ter contato com consumidores e com especialistas e sommeliers.
Desde a primeira edição, o evento segue três princípios, segundo Lilla: encantar os produtores convidados com o mercado brasileiro, satisfazer o público pagante com vinhos caros e raros e “não perder dinheiro”, disse. “Mas esse princípio vinha atrás dos outros dois.”
A escolha de limitar a venda a apenas 200 ingressos por dia ao público final é estratégica.
“Poderia vender muito mais, mas mudaria muito o estilo do evento”, afirmou. O resultado é uma atmosfera intimista, que permite ao visitante conversar com os produtores e degustar vinhos com tranquilidade, segundo o empresário.
Apesar do apelo comercial - os ingressos do evento deste ano se esgotaram rapidamente, mas há uma lista de espera - , o evento continua sendo bancado em parte pela Mistral como forma de promoção e de educação do público.
“É um evento em que nós investimos, ou seja, em boa medida ele é subsidiado pela Mistral”, disse Lilla. O retorno vem em forma de relacionamento, imagem de marca e formação de novos consumidores para o segmento premium, disse.
Leia também: Vinho precisa ser caro? ‘Coração do mercado’ no Brasil vai até R$ 50, segundo o GPA
Além de ser uma importante vitrine comercial, o evento da importadora se consolida como uma plataforma de formação de paladar, que oferece aos brasileiros a chance de conhecer - e entender - o que torna um vinho premiado e caro antes mesmo de investir em uma garrafa cujo preço pode passar de R$ 1.000.
O objetivo é promover o diálogo entre produtores e consumidores e consolidar o Brasil como destino relevante no mapa global do vinho de alta gama, explicou.
Esse posicionamento está alinhado ao foco da Mistral, que lidera o mercado brasileiro no nicho de vinhos com valor de origem acima de US$ 4 (que podem chegar ao Brasil por mais de R$ 100).
Leia também: Garrafa de até R$ 10 mil: Por que os melhores vinhos são mais caros
Enquanto gigantes do setor como o Grupo Wine e o GPA (Grupo Pão de Açúcar) concentram-se especialmente - mas não apenas - no volume e no mercado de entrada, com muitos vinhos que custam até R$ 50, a Mistral atua com uma estratégia de curadoria, exclusividade e relacionamento - o que se traduz em preços bem mais elevados.
“Nesse nicho dos vinhos de qualidade, de média para alta, a Mistral é líder absoluta”, disse.
A empresa atende muitos dos principais restaurantes do país, lojas especializadas e clientes finais por e-commerce, além de abastecer supermercados premium.
Degustações premium
O evento da Mistral não é a única oportunidade para enófilos conhecerem vinhos de alta gama e altos preços em São Paulo.
A cidade tem uma agenda de eventos que podem ser chamados de degustações premium, em que é possível experimentar amostras de algumas das garrafas mais cobiçadas do mundo.
Uma dessas ocasiões é a Festa da Bourgogne, organizada pela importadora Anima Vinum, que realizou sua quarta edição neste ano.
Ali, como diz o nome, o foco são os vinhos da região francesa da Borgonha. No evento realizado em março, foram oferecidos mais de uma dúzia de rótulos de grandes vinhos da região para provar por R$ 885.
“A Borgonha é uma região de grande dificuldade, tem uma complexidade muito grande e é difícil de conhecer. Nosso objetivo é, de forma educativa, mostrar em detalhe as cinco regiões da Borgonha e suas características”, disse Alaor Pereira Lino, proprietário da Anima Vinum, em entrevista à Bloomberg Línea.
Cada edição do evento recebe cerca de cem pessoas, que podem ter contato com produtores que viajam para apresentar seus vinhos.
O ambiente tem música, comidas francesas que harmonizam com os vinhos (como foie gras) e um clima de celebração da região.
Outra celebração deste tipo, que tem um perfil mais global e entrou na agenda de São Paulo neste ano, é a Premium Tasting, realizada pela primeira vez no país em abril.
O evento já era realizado em outros países da América do Sul, como Peru, Argentina e Chile, e tem um caráter ainda mais voltado à ideia de formação do paladar dos participantes.
O evento tem um preço de R$ 1.350 por participante, mas trata-se de uma degustação guiada por três especialistas e sommeliers, que comentam e analisam 39 dos vinhos mais premiados da região às cegas.
“Por mais que seja um valor alto, é um evento democrático. Não é voltado para sommeliers e especialistas mas para amantes de vinho que querem aprender mais”, disse Jorge Mesarina, organizador do evento, à Bloomberg Línea.
O evento acontece quase como um espetáculo, um “teatro enogastronômico” em que o público participa ativamente, descreveu Mesarina.
Em uma sala ampla, os consumidores são servidos de pequenos pratos de comida para harmonizar com os vinhos e aprendem mais sobre as características de cada um deles.
Cada participante tem seis taças e recebe material com informações dos vinhos e acompanha uma discussão sobre a percepção sensorial de cada um deles, seguida de falas dos enólogos criadores dos rótulos.
O caráter educativo está presente regularmente em eventos pontuais organizados pela Associação Brasileira de Sommeliers (ABS) e pela Eno Cultura, duas das principais escolas de vinho em São Paulo.
Leia mais: Biomédico criou método para tirar vinho sem abrir a garrafa. Hoje fatura US$ 100 mi
Nelas são oferecidas regularmente masterclasses e palestras com produtores acompanhadas de degustações de alto nível.
A ABS oferecerá em agosto uma dessas palestras com provas de vinho voltada à região espanhola de Ribera del Duero, por exemplo, por R$ 600.
E para quem está começando no mundo dos vinhos ou não tem um orçamento para conseguir participar dessas ocasiões de luxo, há também cada vez mais eventos que oferecem grandes degustações de vinhos de qualidade variada (dos mais simples a alguns bem complexos) e que permitem um passeio por diferentes regiões do Brasil e do mundo a partir da bebida.
São Paulo terá neste fim de semana, em 2 e 3 de agosto, uma nova edição do Vinho na Vila, que vai reunir 35 vinícolas brasileiras para apresentar seus rótulos em degustações também com contato com os produtores.
Sem a pompa e a exclusividade dos vinhos premiados de eventos premium, o Vinho na Vila oferece uma média de 200 rótulos por edição para os participantes experimentarem - e cobra entre R$ 105 e R$ 150 pelo ingresso.
O evento acontece também com frequência em outras cidades, como Rio de Janeiro, Belo Horizonte e Recife.
Leia também
Vinho natural vai ao mercado: tendência movimenta bilhões e ganha força no Brasil