Bloomberg Línea — A japonesa Yanmar tem apostado no aumento da demanda no Brasil para expandir os negócios no país, apesar das incertezas provocadas pelas tarifas impostas por Donald Trump ao agronegócio brasileiro.
A fabricante de tratores e máquinas agrícolas tem registrado crescimento acelerado de seu braço agrícola no Brasil e enxerga boas oportunidades no horizonte depois do anúncio de um investimento em uma nova fábrica, segundo Gilberto Saito, presidente da Yanmar South America.
No final do mês passado, a Yanmar anunciou a construção de uma fábrica própria de tratores em Indaiatuba, no interior de São Paulo.
“A nova unidade nos permitirá sustentar o crescimento, dar consistência ao negócio e aumentar a produtividade. Não se trata de somar capacidade, mas de substituir a fábrica atual por uma estrutura própria e preparada para o futuro”, disse Saito, que assumiu o comando da operação brasileira em 2020, em entrevista à Bloomberg Línea.
Leia também: Negociações paralisadas: torrefadores dos EUA evitam café do Brasil após tarifas
A atual planta de montagem de tratores da empresa, que é arrendada, foi concebida para produzir 2.500 unidades por ano, mas já opera acima de 5.000. A nova fábrica terá capacidade inicial de 7.000 tratores em um turno, com possibilidade de expansão.
O investimento para a nova planta fabril de 140.000 metros quadrados é de R$ 280 milhões. O início da operação está previsto para 2027.
Perspectiva de crescimento
Desde a chegada da empresa ao país, há 60 anos, a estratégia passou por ajustes diante da força crescente dos negócios agrícolas, que hoje respondem por 65% do resultado da subsidiária brasileira - empresa também fabrica máquinas para a construção civil, além de motores e sistemas de energia.
O impulso veio principalmente depois de 2018, quando a Yanmar retomou a venda direta de tratores no Brasil, após quase duas décadas de parceria com a Agritec.
“Começamos em 2018 com 100 tratores vendidos diretamente e no ano passado já ultrapassamos 5.000”, disse Saito.
Com a maior demanda pelo maquinário da empresa nos últimos anos, também veio a necessidade de aumentar a capacidade produtiva, o que levou à decisão de investimento na nova fábrica.
A Yanmar foi fundada em 1912 na cidade de Osaka, no Japão. Há 30 anos, 90% dos negócios estavam concentrados na Ásia, mas desde então a empresa tem avanço em mercados como Estados Unidos, Europa e Índia, além da América Latina. A tendência para o futuro, conta Saito, é que o Japão concentre cerca de 70% a 60% dos negócios, ante 30% e 40% dos demais países.
O tamanho da participação do Brasil nos negócios da empresa é comparável ao da Turquia, segundo Saito, ou seja, ainda é pequeno comparado ao potencial. A expectativa é mudar esse quadro.
A nova planta é um dos pilares desse plano de crescimento da empresa, explica Saito. Nesse período, a Yanmar pretende expandir o portfólio, avançar na nacionalização de produtos e firmar novas parcerias comerciais e financeiras.
“Queremos gerar valor não só com o produto, mas também com serviços e novos modelos de negócio. Esse é o foco para manter o crescimento no Brasil”, afirmou.
O executivo reconhece que a empresa deve ter um crescimento mais moderado em 2025, abaixo da expansão de 15% registrada em 2024, em razão principalmente das tarifas impostas pelos Estados Unidos ao Brasil.
As incertezas sobre as exportações de produtos agrícolas brasileiros têm freado investimentos, principalmente dos pequenos produtores, segundo Saito. Ainda assim, ele mantém o otimismo para o futuro.
“No curto prazo, esses ruídos seguram investimentos, principalmente do pequeno produtor. Mas acreditamos que a situação será pacificada, porque não é boa para nenhum dos lados”, disse o executivo.
Foco no pequeno agricultor
Diferentemente de concorrentes que priorizam grandes produtores, a Yanmar concentra sua atuação no pequeno produtor e na agricultura familiar.
De acordo com o último Censo agropecuário disponível de 2017, elaborado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), os pequenos produtores representam 77% dos estabelecimentos agropecuários.
Minas Gerais, Espírito Santo, São Paulo e Rio Grande do Sul são os principais mercados da Yanmar. A empresa também tem visto a maior adoção de seus equipamentos no manejo do café em áreas montanhosas. Há planos de expansão para o Nordeste.
“Nosso foco é o pequeno agricultor. Criamos um departamento de inovação para estar mais próximos deles, entender as dores do dia a dia e buscar soluções além do trator”, disse à Bloomberg Línea Wagner Santaniello, gerente de Inovação e Marketing, que chefia a nova área desde maio.
Na empresa, cerca de 80% das vendas de tratores são adquiridos por programas como Pronaf Mais Alimentos, BNDES Finame Rural, entre outros.
“O crédito no Brasil é caro e escasso. O Plano Safra é fundamental, mas temos buscado parcerias com bancos como Bradesco para oferecer alternativas de financiamento mais acessíveis”, disse Saito.
No ano safra 2025/26, o plano Safra destinou R$ 89 bilhões à agricultura familiar, aumento de 3% em relação à safra passada. Desse total, R$ 78,2 bilhões são destinados especificamente ao Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf).
Os juros em patamar elevado no país, atualmente a 15% ao ano, também dificultam a concessão de crédito.
Outros setores
Na construção civil, a empresa tem testado o modelo rent to sell, em que o cliente aluga a máquina e pode descontar parte do valor no momento da compra.
A modalidade foi pela primeira vez testada na unidade americana em 2008 e hoje representa cerca de 20% das vendas de máquinas de construção civil da subsidiária. No Brasil, esse modelo está em fase de adoção e poderá ser adaptado no futuro ao agronegócio, disse Saito.
Além do agronegócio, 25% dos negócios locais da empresa são provenientes da construção civil, e cerca de 10% de motores industriais, e da unidade de lazer e marítimos.
As mini escavadeiras são uma das principais apostas do negócio no país: a empresa vende 700 a 800 unidades por ano, com 30% de participação, mas estima potencial de até 10.000 unidades anuais.
No campo da inovação, a Yanmar acompanha tendências globais como tratores elétricos, protótipos movidos a hidrogênio verde e máquinas autônomas, já em processo de validação no Japão.
No Brasil, porém, a prioridade tem sido adaptar tecnologias à realidade local, diante da falta de infraestrutura de larga escala e também de olho na demanda dos produtores.
“Temos produtos de ponta no exterior, mas aqui a infraestrutura ainda não permite a adoção em larga escala. No Japão, um grande produtor tem 20 hectares; no Brasil, um pequeno pode ter 700 ou 1.000 hectares”, disse Santaniello.
Leia também
Banco John Deere busca ampliar crédito rural após joint venture com Bradesco, diz CEO