Marcos Molina: o self-made man por trás da nova gigante mundial de alimentos

Empresário paulista neto e filho de açougueiros, emancipado aos 16 anos para abrir seu primeiro negócio, ergueu em um período de 25 anos um grupo com receitas anuais acima de R$ 150 bilhões

Marcos Molina, fundador da Marfrig e principal acionista da nova MBRF, empresa resultante da fusão entre Marfrig e BRF
16 de Maio, 2025 | 04:19 PM

Bloomberg Línea — O empresário que arquitetou a fusão entre BRF e Marfrig, para dar origem à MBRF Global Foods, anunciada na noite de quinta-feira (15), pode ser considerado um autêntico self-made man brasileiro e, por que não, global: Marcos Molina.

Conhecido pela simplicidade no dia-a-dia, low profile - raramente concede entrevistas - e com um estilo de gestão “direto ao ponto”, Molina, hoje com 55 anos, se notabilizou pelo modelo de crescimento orgânico e, principalmente, inorgânico agressivo, com a compra de dezenas de ativos.

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É considerado um dos empresários mais influentes do país, com trânsito nas esferas do poder - foi apontado nos últimos anos como uma das 500 Pessoas Mais Influentes da América Latina pela Bloomberg Línea.

Nesta semana, dois dias antes do anúncio da incorporação da BRF, esteve em Nova York na Brazil Week e participou de eventos com CEOs de outras empresas brasileiras, investidores estrangeiros e com autoridades como o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas.

Molina é reconhecido no mercado agropecuário e entre seus pares pela visão estratégica demonstrada em diferentes momentos de sua trajetória (veja mais abaixo) e pela capacidade de execução.

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Em certos momentos, foi tão agressivo que os resultados financeiros ficaram sob pressão das dívidas e isso exigiu a venda de ativos estratégicos, como foi o caso da Seara em meados de 2013, negociado por R$ 5,85 bilhões em valores da época para a sua concorrente JBS (JBSS3).

Esse movimento de compra e posterior revenda se deu também com a britânica Moy Park e com a americana Keystone Foods.

Filho e neto de açougueiros, Marcos Molina começou a trabalhar ainda aos 12 anos em Mogi-Guaçu, no interior de São Paulo, sua cidade natal.

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Aos 16, pediu ao pai que fosse emancipado e abriu seu primeiro negócio: uma distribuidora de miúdos de boi.

Com 30 anos, em 2000, ele adquiriu o frigorífico Bataguassu, no Mato Grosso do Sul, quase na divisa com o estado de São Paulo. Dali em diante, deu início a uma trajetória de expansão agressiva, principalmente por meio de aquisições.

Entre 2005 e 2008, por exemplo, foram 35 aquisições no Brasil e em países vizinhos, como o Tacuarembó e o La Caballada, além da Inaler, todos no Uruguai; o Frigorífico Patagônia e a Quinto Cuarto, no Chile; e a Breeders and Packers, a Mirab e a marca de hambúrgueres Paty, na Argentina.

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Essa onda de aquisições acelerou o crescimento da Marfrig, que se credenciou para executar uma bem-sucedida abertura de capital na bolsa de valores brasileira, hoje B3, em junho de 2007, em que captou R$ 887 milhões.

Cerimônia de celebração dos 15 anos do IPO da Marfrig na bolsa brasileira, a B3, em dezembro de 2022 (Foto: B3/Divulgação)

No fim dos anos 2000, a Marfrig contou com investimento do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), dentro da política dos “campeões nacionais”, de apoio do governo de Luiz Inácio Lula da Silva a empresas que, em sua avaliação, tinham condições de explorar o mercado global.

Com o tempo, a Marfrig se tornou a segunda maior produtora de carne bovina do mundo, atrás apenas da JBS, e a líder mundial em hambúrgueres. Hoje a empresa está presente em mais de cem mercados, com receitas líquidas de R$ 144 bilhões em 2024 (já consolidava a BRF nos resultados).

Na “nova Marfrig” - a MBRF -, ele criou um império da carne que nasce com valor de mercado superior a R$ 50 bilhões e presença em cerca de 120 países.

Nesta sexta-feira, as ações da Marfrig subiam perto de 20% com a reação de investidores ao anúncio do negócio. A alta foi de 21,35% no fechamento.

O salto com a incorporação da BRF coroa um movimento iniciado em 2021, que mostrou que o empresário manteve seu ímpeto nos negócios mesmo já à frente de uma das maiores empresas de carnes do mundo: ele passou a adquirir participações acionárias na então concorrente, uma gigante em aves, mas que enfrentava dificuldades operacionais e financeiras que derrubaram o valor da ação.

Ao montar posição relevante e, depois, assumir o controle, Molina foi protagonista na elaboração do plano de turnaround da BRF, controladora das octogenárias marcas Sadia e Perdigão: conduziu um processo de reestruturação que fez a companhia recuperar valor de mercado e voltar a distribuir dividendos aos acionistas.

O início, no entanto, foi desafiador.

Em 2022, por exemplo, já com Molina no cap table, a BRF enfrentava um período conturbado. No primeiro trimestre daquele ano, o prejuízo foi de R$ 1,5 bilhão. No ano inteiro, as perdas chegaram a R$ 3,2 bilhões.

Em paralelo com o turnaround, Molina fez movimentos estratégicos, como ajudar a trazer para a BRF o fundo saudita Salic, que se tornou o segundo maior acionista da companhia, em um movimento visto no mercado como fundamental para viabilizar a então futura fusão com a Marfrig diante do apoio ao negócio.

O fundo será o segundo maior acionista da nova MBRF, com pouco mais de 10% do capital. A Previ, fundo de pensão dos funcionários do Banco do Brasil, também aderiu.

Há menos de um mês, Molina esteve em Jeddah, a segunda maior cidade da Arábia Saudita, para anunciar o início da construção de uma unidade de processamento de alimentos pela BRF Arabia Holding Company - uma joint venture entre a BRF e a Halal Products Development Company (HPDC), subsidiária do PIF, fundo soberano saudita. O projeto envolve investimentos de US$ 160 milhões.

“O investimento representa mais um avanço consistente em nossa estratégia de presença global e fortalece nossa atuação em um mercado altamente estratégico para a companhia, além de consolidar a parceria com o reino da Arábia Saudita em sua agenda de segurança alimentar”, disse Molina na ocasião.

O evento contou com a presença do seu filho Marquinhos Molina, que é o CEO da BRF Arábia, além de Igor Marti, vice-presidente de Mercado Halal da BRF.

Marcos Molina, controlador e presidente dos conselhos de administração de Marfrig e BRF, com lideranças sauditas em evento em Jeddah, na Arábia Saudita em 21 de abril de 2025: anúncio de investimento em nova fábrica de alimentos processados (Foto: Divulgação)

Com o processo de reestruturação comandado por Molina e pelo nomeado CEO Miguel Gularte, a BRF, empresa com origem em Santa Catarina - das famílias Fontana, pelo lado da Sadia, e Brandalise e Ponzoni, pela Perdigão -, mudou de patamar ao longo dos anos, recuperando parte da confiança de investidores.

No mercado, as ações da BRF subiram mais de 200% nos últimos 24 meses.

Os números mais recentes refletem essa evolução a partir da gestão. O lucro no primeiro trimestre de 2025 cresceu mais de 100% e chegou a R$ 1,12 bilhão.

A perspectiva sinaliza um futuro ainda mais auspicioso: com a fusão entre BRF e Marfrig, as empresas já nascem com um faturamento combinado da ordem de R$ 152 bilhões segundo os dados do primeiro trimestre no conceito dos últimos doze meses, com a perspectiva de que esse montante cresça ainda mais.

As companhias poderão ter ganhos significativos com sinergias operacionais e fiscais, disse Molina em teleconferência com analistas nesta sexta (16).

“A partir de agora, a fusão é uma etapa necessária que vai nos permitir capturar uma nova onda de relevantes sinergias”, afirmou o empresário.

As sinergias estimadas com a fusão somam R$ 805 milhões por ano em três frentes: receitas e custos, despesas operacionais e ganhos fiscais. Para o primeiro ano, os ganhos com sinergias podem oscilar entre R$ 400 milhões e R$ 500 milhões.

A confiança na capacidade de executar o plano arquitetado e de entregar as sinergias prometidas, expressada pelo empresário na call, encontra respaldo de certa forma com outros momentos de sua trajetória, como declarou à Bloomberg News há dois anos, em uma rara entrevista.

“Vejo muito mais oportunidades na BRF do que em qualquer outra empresa que compramos no passado [...] Temos a convicção de que vamos conseguir. É apenas uma questão de quando”, disse Molina na ocasião em referência ao sucesso do turnaround, uma pré-condição para a então potencial fusão.

- Com informações da Bloomberg News.

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Naiara Albuquerque

Formada em jornalismo pela Fáculdade Cásper Líbero, tem mestrado em Ciências da Comunicação pela Unisinos, e acumula passagens por veículos como Valor Econômico, Capricho, Nexo Jornal e Exame. Na Bloomberg Línea Brasil, é editora-assistente especializada na cobertura de agronegócios.

Marcelo Sakate

Marcelo Sakate é editor-chefe da Bloomberg Línea no Brasil. Anteriormente, foi editor da EXAME e do CNN Brasil Business, repórter sênior da Veja e chefe de reportagem de economia da Folha de S. Paulo.