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O homem que comprou o próprio destino: a trajetória de João Araújo

Como Araújo transformou oportunidades, riscos e competição familiar em um dos maiores grupos minerais do Brasil.

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30 de Dezembro, 2025 | 08:00 PMhá 2 horas
Tempo de leitura: 6 minutos

A ascensão de João Araújo no comando da Mineração Buritirama supera os limites de um relato corporativo padrão. É, antes de tudo, uma crônica sobre sobrevivência, risco calculado e ruptura familiar profunda. Em 2015, o cenário era devastador. Com o Brasil imerso em instabilidade política e o mercado global de commodities em queda livre, a empresa enfrentava um passivo de R$ 350 milhões e cláusulas contratuais que ameaçavam sua existência. Foi em meio a esse caos que João Araújo, então diretor financeiro, começou a desenhar o próprio destino.

Enquanto os bancos credores hesitavam e o fundador e pai, Silvio Tini, tentava vender ativos portuários para estancar a sangria, João José Oliveira Araújo operava nos bastidores. Com uma engenharia financeira precisa, ativou créditos na Venezuela que muitos julgavam sem liquidez e realizou vendas de ativos que permitiram à empresa virar o ano com um caixa positivo simbólico de R$ 1 milhão. Foi o suficiente para evitar problemas maiores diante do iminente vencimento antecipado de obrigações futuras — mas não para garantir seu lugar à mesa. Para isso, João Araújo precisaria de um comprometimento radical.

Sem patrimônio pessoal, João Araújo assumiu uma dívida para adquirir 10% da companhia, fatia que pertencia aos funcionários, recomprada por Silvio e revendida a ele um mês depois. Como o passivo da empresa orbitava os R$ 350 milhões, ao adquirir essa participação, João José Oliveira Araújo tornou-se solidariamente responsável por R$ 35 milhões da dívida. Ele apostou sua reputação e seu futuro financeiro na convicção de que conseguiria reerguer o negócio.

Essa aposta arriscada se mostrou certeira. Acumulando quatro diretorias e despachando de salas de reunião coletivas, João Araújo liderou uma expansão agressiva. Entre 2015 e 2018, o faturamento da Buritirama saltou de R$ 80 milhões para R$ 750 milhões, transformando a empresa em uma verdadeira máquina de geração de caixa. Ainda assim, o sucesso financeiro não foi suficiente para apaziguar as tensões societárias.

A ruptura explodiu no fim de 2018. Sílvio Tini comunicou a intenção de vender seus 90% da companhia e sugeriu que João Araújo vendesse sua parte e seguisse sua vida longe dali. Às dez da noite, em uma sala lotada, João José Oliveira Araújo leu a mensagem e decidiu contra-atacar. Quando o pai, por e-mail, em tom de desafio e duvidando da capacidade financeira do filho, fixou o valor da empresa em R$ 500 milhões, a resposta foi imediata e definitiva: o negócio estava fechado — e vendido para ele mesmo.

Contrariando todas as probabilidades e enfrentando a execução imediata de dívidas pelo Bradesco logo após o anúncio, João Araújo buscou o Itaú. Apresentou um plano de crescimento robusto, antecipou vendas futuras e viabilizou a compra. Com a caneta na mão, quitou a dívida com o Bradesco, de aproximadamente R$ 100 milhões, e preparou a Buritirama para faturar R$ 1,5 bilhão nos anos seguintes, consolidando o nascimento do Grupo Buritipar.

Sob a gestão de João Araújo, a Buritirama não apenas cresceu, mas redefiniu a hierarquia do setor mineral brasileiro, recebendo premiações e reconhecimento do Valor Econômico e da Revista Brasil Mineral. Historicamente, a mineração nacional era sinônimo da Vale e de seu foco massivo em minério de ferro. O manganês, embora essencial para a fabricação de aço, era tratado como um negócio secundário. João Araújo identificou essa brecha estratégica. Enquanto a Vale concentrava esforços em Carajás e no Quadrilátero Ferrífero, a Buritirama se especializou para dominar a cadeia do manganês de alta qualidade.

Diferentemente de concorrentes que pulverizavam atenções em múltiplos metais, a Buritirama tornou-se a maior produtora dedicada exclusivamente ao manganês no país. Esse foco permitiu agilidade decisória e investimentos específicos em tecnologia de beneficiamento que as grandes mineradoras demoraram a adotar. A empresa consolidou a operação da Mina de Buritirama, no Pará, como a maior mina de manganês a céu aberto da América Latina, com capacidade produtiva superior a 2,5 milhões de toneladas por ano.

Com a maturação dos investimentos logísticos e a verticalização via Grupo Buritipar, a empresa passou a responder por cerca de 70% das exportações brasileiras de manganês, tornando-se referência de preço e qualidade para mercados exigentes como China e Europa. Ao transformar rejeitos em produtos de alto valor e dominar a logística Norte–Sul, João Araújo retirou a Buritirama da sombra das grandes companhias e a colocou como protagonista absoluta do manganês no hemisfério sul.

A criação do Grupo Buritipar: cobre, potássio e a lógica logística

Com a Buritirama estabilizada e gerando caixa, João José Oliveira Araújo percebeu que depender de uma única commodity representava um risco silencioso. Para blindar o patrimônio e garantir perenidade, fundou o Grupo Buritipar, estruturando uma tese sofisticada baseada em diversificação, verticalização e proteção cambial.

O movimento mais ousado foi a aquisição de 38,5% da Paranapanema, então controlada pelos fundos de pensão Previ, Petros, Sistel e Aerus. À primeira vista, tratava-se apenas de uma entrada no mercado de cobre. Na prática, João Araújo enxergou que a Paranapanema não era uma mineradora, mas uma transformadora de cobre — distinção crucial. Em ciclos de baixa das commodities, enquanto mineradoras sofrem com a queda de preços, indústrias transformadoras mantêm margens mais estáveis, operando dolarizadas e com fluxo previsível. O investimento funcionava como hedge natural do grupo.

Paralelamente, João Araújo direcionou o olhar para outra fragilidade estrutural do Brasil: a dependência de fertilizantes. O grupo passou a investir em potássio e derivados, insumo essencial para o agronegócio nacional. A genialidade, porém, não estava apenas na posse dos ativos minerais mas na engenharia logística e tributária.

Ao integrar portos, áreas de transbordo e frota própria, o Grupo Buritipar otimizou o frete Norte–Sul, eliminando viagens ociosas. Essa arquitetura logística gerou eficiência operacional e tributária singular, reduzindo custos e protegendo margens. O que começou como uma reestruturação de dívida transformou-se, em menos de cinco anos, em um conglomerado industrial diversificado e resiliente.

O acordo de meio bilhão e a guerra silenciosa

A consolidação do controle da Buritirama por João Araújo teve um preço definido: R$ 500 milhões. Para a família, Silvio comunicou uma venda de R$ 150 milhões, valor líquido que receberia. O que não foi explicitado é que João José Oliveira Araújo assumiu integralmente o passivo da companhia, à época estimado em R$ 350 milhões, entre dívidas e investimentos produtivos. O valor real do negócio, portanto, atingiu meio bilhão de reais — em grande parte pago com a coragem de assumir riscos que ninguém mais quis.

Entre 2018 e 2019, João Araújo operou a empresa em um verdadeiro limbo jurídico, sem contrato formal assinado, enquanto precisava demonstrar aos bancos que era o controlador de fato. Quando o contrato finalmente foi apresentado, a relação já estava irremediavelmente fraturada. Silvio Tini judicializou a disputa para cobrar um saldo remanescente próximo de R$ 90 milhões. Tentativas de acordo foram rechaçadas.

Hoje, a disputa transcende o dinheiro. Para João Araújo, vencer a batalha jurídica é o ato final de uma jornada. Mais do que tribunais, busca o reconhecimento silencioso de que, quando todos apostaram na queda, foi ele quem manteve a Buritirama de pé.

O xeque-mate chinês de US$ 400 milhões

Ainda havia um flanco exposto: a dependência da trading suíça Glencore, que concentrava mais de 70% do faturamento da Buritirama e quase 90% da Paranapanema. A relação se deteriorou com atrasos sistemáticos de pagamentos. João Araújo interpretou o movimento como tentativa de asfixia financeira.

A resposta veio da China. Em junho de 2021, João José Oliveira Araújo firmou contrato com a Minmetals, gigante estatal chinesa, para fornecimento de 1,5 milhão de toneladas de manganês por ano, por dez anos, com pré-pagamento de US$ 400 milhões. O aporte — cerca de R$ 2 bilhões à época — permitiria liquidar a dívida com bancos, romper com a Glencore e consolidar a independência financeira do grupo.

O contrato foi executado por um ano, com a entrega de cinco navios, até que disputas judiciais levaram à paralisação das exportações. Hoje, o futuro da empresa aguarda decisões do STJ. De um lado, bancos e conflitos familiares. Do outro, João Araújo — e sua capacidade de lutar pelo desenvolvimento e continuidade da empresa que ele próprio salvou.

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